terça-feira, 25 de dezembro de 2018

SÚMULA VINCULANTE 35

A homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial. 

Crime de fuga e direito à não autoincriminação

A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTN) (1) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 907 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido que declarou a inconstitucionalidade do referido tipo penal e, consequentemente, absolveu o réu. 
Denunciado pelo Ministério Público estadual, o réu foi condenado como incurso nas sanções do crime previsto no art. 305 do CTB. Ao julgar a apelação, o juízo de segundo grau a proveu para declarar a inconstitucionalidade do crime de fuga, com consequente absolvição do réu. Baseou-se, para isso, no art. 386, III, do Código de Processo Penal (CPP) (2), por entender que ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo. 
O Ministério Público estadual, ora recorrente, sustentou que o crime de fuga não ofende os direitos à não autoincriminação e ao silêncio, uma vez que o objetivo dessas garantias não abarca a simples exigência de permanência no local do acidente do agente que o tenha provocado. Não há obrigação legal de prestar declarações ou assumir culpa, mas apenas de evitar o uso de subterfúgios à ação do poder de polícia administrativo, viabilizando a identificação dos envolvidos em acidente de trânsito, inclusive para o fim de evitar futuras punições ou responsabilizações judiciais injustas. Para o Colegiado, é admissível a flexibilização do princípio da vedação à autoincriminação proporcionada pela opção do legislador de criminalizar a conduta de fugir do local do acidente. De fato, tal procedimento não afeta o núcleo irredutível daquela garantia enquanto direito fundamental, qual seja, jamais obrigar o investigado ou réu a agir ativamente na produção de prova contra si próprio. O tipo penal do art. 305 do CTB apenas obriga a permanência do agente no local para garantir a identificação dos envolvidos no sinistro e o devido registro da ocorrência pela autoridade competente. O bem jurídico tutelado é a administração da justiça, prejudicada pela fuga do agente do local do evento, uma vez que tal atitude impede sua identificação e a consequente apuração do ilícito, para fins de se promover a responsabilização cível ou penal de quem, eventualmente, provocar um acidente de trânsito, dolosa ou culposamente. Essa diligência administrativa, aliás, transforma-se em meio de defesa do próprio acusado. A exigência de permanência no local do acidente e de identificação perante a autoridade de trânsito não obriga o condutor a assumir eventual responsabilidade cível ou penal pelo sinistro nem, tampouco, enseja que contra ele se aplique qualquer penalidade caso não o faça. O condutor, após sua identificação pela autoridade de trânsito, pode optar, quando indagado, por permanecer em silêncio e não prestar nenhum esclarecimento acerca das circunstâncias do acidente. Insta reconhecer que eventual declaração de inconstitucionalidade da conduta tipificada no art. 305 do CTB (1), em nome da observância absoluta e irrestrita do princípio da vedação à autoincriminação (nemo tenetur se detegere), caracterizaria evidente afronta ao princípio constitucional da proporcionalidade quanto à vedação de proteção deficiente. Esse princípio pode ser relativizado pelo legislador justamente por possuir natureza de direito fundamental, que, no contexto da teoria geral dos direitos fundamentais, implica a valoração do princípio da proporcionalidade e seus desdobramentos como critério balizador do juízo de ponderação, inclusive no que condiz com os postulados da proibição de excesso e de vedação à proteção insuficiente. A fragilização da tutela penal do Estado, mediante a visualização de óbices à responsabilização penal da conduta de fugir do local do acidente, deixa a descoberto o bem jurídico de tutela da administração da justiça que o Estado deveria salvaguardar por meio da norma penal, bem como, indiretamente, os direitos fundamentais que se busca proteger com a promoção de maior segurança no trânsito, sobretudo o direito à vida. Além disso, descriminalizar o crime de fuga significaria efetivamente negar a vontade do Parlamento. Essa conduta é criminalizada porque a Constituição promete, em nome do povo, uma sociedade justa e solidária, o que não poderia ser garantido caso afastada a juridicidade de uma conduta de quem abandona o local do acidente para fugir à responsabilidade penal e civil. Acrescente-se a isso a existência de norma de direito internacional vigente na ordem jurídica interna que abona essa opção feita pelo legislador. O Decreto 86.714/1981, que internalizou no Brasil a 11 Convenção de Trânsito de Viena, prevê o comportamento do condutor e demais envolvidos em caso de acidente (art. 31). Esse normativo dispõe que, “sem prejuízo do disposto nas legislações nacionais sobre a obrigação de prestar auxílio aos feridos, todo condutor ou qualquer outro usuário da via, implicado em um acidente de trânsito, deverá: (...) c) se exigido por outras pessoas implicadas no acidente, comunicar-lhe sua identidade” (Item 1, c). No mais, “se houver resultado ferida ou morta alguma pessoa no acidente, advertir à polícia e permanecer ou voltar ao local do acidente até a chegada desta, a menos que tenha sido autorizado por esta para abandonar o local ou que deva prestar auxílio aos feridos ou ser ele próprio socorrido” (Item 1, d). Em precedente análogo à situação dos autos, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento no sentido de que o princípio constitucional da vedação à autoincriminação não pode ser interpretado de maneira absoluta. Essa relativização alcança aquele sujeito que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intuito de ocultar maus antecedentes, o que torna típica a conduta prevista no art. 307 do Código Penal (3), sem qualquer traço de ofensa ao disposto no art. 5º, LXIII, da CF (4) (RE 640139 – Tema 478 da repercussão geral). A persecução penal admite a relativização dos direitos na hipótese de justificável tensão entre o dever do poder público de promover uma repressão eficaz às condutas puníveis e as esferas de liberdade ou intimidade daquele que se encontre na posição de suspeito ou acusado. Nesse âmbito, o direito à não autoincriminação se insere no mesmo conjunto de direitos subjetivos e garantias do cidadão brasileiro, de que são exemplos os direitos à intimidade, à privacidade e à honra. Essa relativização é admissível, embora mediante a observância dos parâmetros constitucionais pertinentes à harmonização de princípios eventualmente colidentes. Diante desse quadro, trata-se de garantia que não pode ser interpretada como o direito do suspeito, acusado ou réu a não participar da produção de medidas probatórias. A referida flexibilização possibilita que se efetivem, em maior medida, outros princípios fundamentais com os quais aquele colide no plano concreto, sem que isso acarrete qualquer violação à dignidade da pessoa humana. O Tribunal asseverou, também, ser corolário da garantia contra a não autoincriminação a preservação do direito do investigado ou réu de não ser compelido a, deliberadamente, produzir manifestação oral que verse sobre o mérito da acusação. Esse direito, no entanto, sofre ponderável flexibilização diante do quadro alarmante dos delitos de circulação. O direito do investigado de não realizar condutas ativas que importem na introdução de informações ao processo também comporta níveis de flexibilização, muito embora a regra geral seja a da sua vedação. A jurisprudência do Supremo, historicamente, adotava uma postura restrita quanto à admissibilidade das intervenções corporais. Contudo, na linha do que se visualiza no cenário internacional, esta Corte, gradativamente, iniciou uma caminhada em sentido oposto. Um precedente exemplificativo desse processo é a Rcl 2.040/DF, na qual se decidiu que a autoridade jurisdicional poderia autorizar a realização de exame de DNA em material colhido de gestante mesmo sem sua autorização, tendo em vista o objetivo de investigar possível crime de estupro. O direito comparado à luz da legislação e da jurisprudência dos principais países da Europa Continental admite a intervenção corporal coercitiva, desde que autorizada judicialmente, restrita à cooperação passiva do sujeito investigado ou acusado e sem ofensa à dignidade humana. Ademais, a Corte enfatizou a diferença entre a situação dos autos e a de quem pratica um homicídio doloso no trânsito. Nos crimes dolosos, o dolo na prática do crime e o iter criminis são, desde o início, os atos preparatórios, executórios, a consumação e obviamente a evasão. Há um dolo para prática do crime, de modo que o agente não pode ser responsabilizado caso fuja do local do delito. Por sua vez, o art. 305 do CTB não acusa, impõe ou aponta que o condutor do veículo seja um criminoso. Ao contrário, o que se pretende é preservar o local do acidente para proteger a administração da justiça, razão pela qual se impõe que os condutores lá permaneçam. O que se pune é o afastamento do local de acidente. Por fim, o ministro Ricardo Lewandowski ponderou que o abandono do local do acidente pode ser legitimado em caso de eventual risco de agressões que o condutor possa vir a sofrer por parte dos circunstantes, ou até mesmo numa situação de lesão corporal sofrida pelo próprio motorista no sinistro. Nos casos concretos em que houver perigo de vida do causador do evento caso permaneça no local do acidente, o juiz poderá aferir a exclusão da antijuridicidade da conduta, tal como a legítima defesa ou o estado de necessidade. Para o ministro Alexandre de Moraes, essas situações representam condutas atípicas, uma etapa anterior à excludente de ilicitude, porque o tipo penal exige que o condutor do veículo se afaste do local 12 do crime “para fugir à responsabilidade penal ou civil”. Havendo necessidade de o agente evadir-se pelas circunstâncias apresentadas, não ocorre dolo específico do tipo. Ficaram vencidos os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli, que desproveram o recurso extraordinário. Para eles, o tipo penal do art. 305 do CTB viola o princípio da não autoincriminação. A CF assegura que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado” (4). Segundo ressaltado, tal disposição vem sendo interpretada pelo STF em sentido amplo, abrangendo qualquer investigado ou acusado, e não apenas o preso. A cláusula contra a autoincriminação não se restringe ao direito de permanecer em silêncio, mas preserva o suspeito, investigado, denunciado ou o réu da obrigação de colaborar ativa ou passivamente com as autoridades, sob pena de infringência à cláusula do devido processo legal. Mesmo que o condutor permaneça em silêncio, pode vir a produzir prova contra si. A comprovação da conduta criminosa pressupõe a configuração de autoria e de materialidade, e a permanência do imputado no local do crime inquestionavelmente contribui para a comprovação da autoria, assentando seu envolvimento com o fato em análise potencialmente criminoso. Em sentido semelhante, o Tribunal consignou que a condução coercitiva do imputado para prestar informações, ainda que possa permanecer em silêncio, viola o direito à não autoincriminação (ADPF 395). Em idêntica lógica, o fato de o condutor do veículo poder permanecer posteriormente em silêncio não afasta a violação ao direito à não autoincriminação, quando obrigado a permanecer no local do acidente. Há também desproporcionalidade por excesso ao se considerar a disparidade de tratamento em relação a outros delitos mais graves, como estupro ou homicídio. Nesses casos, o legislador não criminalizou a conduta do acusado que venha a evadir-se do local. Nesse sentido, criminalizar alguém que simplesmente deixa o local do acidente não se mostra harmônico com o princípio constitucional da proporcionalidade. (1) CTB/1997: “Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída: (...)” (2) CPP/1941: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (...) III – não constituir o fato infração penal. ” (3) CP/1940: “Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: (...). ” (4) CF/1988: “Art. 5º (...) LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado. ” RE 971.959/RS, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 14.11.2018. (RE-971959)

Sementes de maconha e tipicidade

A Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus para restabelecer decisão do Juízo de primeiro grau que, em razão da ausência de justa causa, rejeitou a denúncia e determinou o trancamento de ação penal proposta contra réu acusado de importar, pela internet, 26 sementes de maconha. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve o entendimento do Tribunal Regional Federal (TRF) que reformou a decisão do juízo a quo e determinou o recebimento da denúncia para que o paciente respondesse pelo crime de tráfico internacional de drogas (Lei 11.343/2006, art. 33, § 1º, I (1), c/c o art. 40, I). A Turma entendeu que a matéria-prima ou insumo deve ter condições e qualidades químicas que permitam, mediante transformação ou adição, por exemplo, a produção da droga ilícita. Não é esse o caso das sementes da planta cannabis sativa, as quais não possuem a substância psicoativa THC. Vencido o ministro Dias Toffoli, que indeferiu a ordem. 

Crimes contra o patrimônio

Furto famélico e princípio da insignificância A Segunda Turma deu provimento a agravo regimental para conceder a ordem de “habeas corpus” a fim de absolver paciente da acusação de furto qualificado [CP, art. 155, § 4º, IV (1)] em face da aplicação do princípio da insignificância. Para o colegiado, como regra, a habitualidade delitiva específica é um parâmetro que afasta a análise do valor do bem jurídico tutelado para fins de aplicação do princípio da bagatela. Excepcionalmente, no entanto, as peculiaridades do caso concreto podem justificar a exclusão dessa restrição, com base na ideia da proporcionalidade em sentido concreto. Essa é justamente a situação dos autos, de furto de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem reais. O valor dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência. Enfim, é caso de mínima ofensividade, ausência de periculosidade social, reduzido grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica. Mesmo que conste em desfavor do paciente outra ação penal instaurada por igual conduta, ainda em trâmite, a hipótese é de típico crime famélico. A excepcionalidade também se justifica por se tratar de hipossuficiente. Não é razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estado-polícia e do Estado-juiz movimente-se no sentido de atribuir relevância a estas situações. (1) CP: “Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.” HC 141440 AgR/MG, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 14.8.2018. (Informativo 911, Segunda Turma)

Condução coercitiva

Condução coercitiva para interrogatório e recepção pela Constituição Federal de 1988 
O Plenário, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em arguições de descumprimento de preceito fundamental para declarar a não recepção da expressão "para o interrogatório" constante do art. 260 (1) do CPP, e a incompatibilidade com a Constituição Federal da condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de ilicitude das provas obtidas, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado (Informativo 905). O Tribunal destacou que a decisão não desconstitui interrogatórios realizados até a data desse julgamento, ainda que os interrogados tenham sido coercitivamente conduzidos para o referido ato processual. Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator). De início, o relator esclareceu que a hipótese de condução coercitiva objeto das arguições restringe-se, tão somente, àquela destinada à condução de investigados e réus à presença da autoridade policial ou judicial para serem interrogados. Assim, não foi analisada a condução de outras pessoas como testemunhas, ou mesmo de investigados ou réus para atos diversos do interrogatório, como o reconhecimento. Fixado o objeto da controvérsia, afirmou que a condução coercitiva no curso da ação penal tornou-se obsoleta. Isso porque, a partir da Constituição Federal de 1988, foi consagrado o direito do réu de deixar de responder às perguntas, sem ser prejudicado (direito ao silêncio). A condução coercitiva para o interrogatório foi substituída pelo simples prosseguimento da marcha processual, à revelia do acusado [CPP, art. 367 (2)]. Entretanto, o art. 260 do CPP — conjugado ao poder do juiz de decretar medidas cautelares pessoais — vem sendo utilizado para fundamentar a condução coercitiva de investigados para interrogatório, especialmente durante a investigação policial, no bojo 36 de engenhosa construção que passou a fazer parte do procedimento padrão das investigações policiais dos últimos anos. Nessa medida, as conduções coercitivas tornaram-se um novo capítulo na espetacularização da investigação, inseridas em um contexto de violação a direitos fundamentais por meio da exposição de pessoas que gozam da presunção de inocência como se culpados fossem. Quanto à presunção de não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), seu aspecto relevante ao caso é a vedação de tratar pessoas não condenadas como culpadas. A condução coercitiva consiste em capturar o investigado ou acusado e levá-lo, sob custódia policial, à presença da autoridade, para ser submetido a interrogatório. A restrição temporária da liberdade mediante condução sob custódia por forças policiais em vias públicas não é tratamento que possa normalmente ser aplicado a pessoas inocentes. Assim, o conduzido é claramente tratado como culpado. Por outro lado, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), prevista entre os princípios fundamentais do estado democrático de direito, orienta seus efeitos a todo o sistema normativo, constituindo, inclusive, princípio de aplicação subsidiária às garantias constitucionais atinentes aos processos judiciais. No contexto da condução coercitiva para interrogatório, faz-se evidente que o investigado ou réu é conduzido, eminentemente, para demonstrar sua submissão à força. Não há finalidade instrutória clara, na medida em que o arguido não é obrigado a declarar, ou mesmo a se fazer presente ao interrogatório. Desse modo, a condução coercitiva desrespeita a dignidade da pessoa humana. Igualmente, a liberdade de locomoção é vulnerada pela condução coercitiva para interrogatório. A Constituição Federal consagra o direito à liberdade de locomoção, de forma genérica, ao enunciá-lo no “caput” do art. 5º. Tal direito pode ser restringido apenas se observado o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e obedecido o regramento estrito sobre a prisão (CF, art. 5º, LXI, LXV, LXVI, LXVII). A Constituição também enfatiza a liberdade de locomoção ao consagrar a ação especial de “habeas corpus” como remédio contra restrições e ameaças ilegais (CF, art. 5º, LXVIII). A condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. O investigado ou réu é capturado e levado sob custódia ao local da inquirição. Portanto, há uma clara interferência na liberdade de locomoção, ainda que por um período determinado e limitado no tempo. Ademais, a expressão “para o interrogatório”, constante do art. 260 do CPP, tampouco foi recepcionada pela Constituição Federal, na medida em que representa restrição desproporcional da liberdade, visto que busca finalidade não adequada ao sistema processual em vigor. Por fim, em relação à manutenção dos interrogatórios realizados até a data desse julgamento, mesmo que o interrogado tenha sido coercitivamente conduzido para o ato, o relator consignou ser necessário reconhecer a inadequação do tratamento dado ao imputado, não do interrogatório em si. Argumentos internos ao processo, como a violação ao direito ao silêncio, devem ser refutados. Assim, não há necessidade de debater qualquer relação da decisão tomada pelo STF com os casos pretéritos, inexistindo espaço para a modulação dos seus efeitos. O ministro Celso de Mello acrescentou que a impossibilidade constitucional de constranger-se o indiciado ou o réu a comparecer, mediante condução coercitiva, perante a autoridade policial ou a autoridade judiciária, para fins de interrogatório, 37 resulta não só do sistema de proteção das liberdades fundamentais, mas, também, da própria natureza jurídica de que se reveste o ato de interrogatório. Referido ato processual é qualificável como meio de defesa do acusado, especialmente em face do novo tratamento normativo que lhe conferiu a Lei 10.792/2003. Essa particular qualificação do interrogatório como meio de defesa permite que nele se reconheça a condição de instrumento viabilizador do exercício das prerrogativas constitucionais do contraditório e da plenitude de defesa. De todo modo, a ausência de colaboração do indiciado ou réu com as autoridades públicas e o exercício da prerrogativa constitucional contra a autoincriminação não podem erigir-se em fatores subordinantes da decretação de prisão cautelar ou da adoção de medidas que restrinjam ou afetem a esfera de liberdade jurídica do réu. Por fim, afirmou que não haveria como concluir que a condução coercitiva do indiciado ou do réu para interrogatório, independentemente de prévia e regular intimação, justificar-se-ia em face do poder geral de cautela do magistrado penal. Isso porque, diante do postulado constitucional da legalidade estrita em matéria processual penal, inexiste, no processo penal, o poder geral de cautela dos juízes. Vencidos, parcialmente, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente). O ministro Alexandre de Moraes julgou parcialmente procedente o pedido formulado nas arguições para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 260 do CPP, unicamente para excluir a possibilidade de decretação direta da condução coercitiva sem a prévia intimação com base no poder geral de cautela do juiz. Considerou, assim, legitima a utilização do instituto da condução coercitiva para interrogatório, porém, desde que o investigado não tenha atendido, injustificadamente, prévia intimação, permitida a participação do defensor do investigado e resguardados os direitos ao silêncio e a não-autoincriminação. O ministro Edson Fachin julgou parcialmente procedente o pedido para atribuir interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 260 do CPP no sentido de ressalvar a possibilidade de decretação judicial e fundamentada da condução coercitiva em substituição a medidas cautelares típicas mais graves, como a prisão preventiva ou a prisão temporária, desde que integralmente presentes os requisitos legais e constitucionais dessas medidas. Ademais, declarou a inconstitucionalidade da interpretação ampliativa do dispositivo impugnado, impondo-se a prévia intimação e o não comparecimento injustificado do intimado para a realização da condução coercitiva. Os ministros Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente) acompanharam o ministro Edson Fachin. (1) CPP: “Art. 260. Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença. ” (2) CPP: “Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo. ” ADPF 395/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 13 e 14.6.2018. (ADPF-395) ADPF 444/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 13 e 14.6.2018. (ADPF-444)

Roubo e extorsão e a continuidade delitiva

Por não constituírem delitos da mesma espécie, não é possível reconhecer a continuidade delitiva na prática dos crimes de roubo e extorsão. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, denegou a ordem de “habeas corpus”. A defesa alegou ser cabível a continuidade delitiva, pois o roubo e a extorsão teriam sido praticados contra a mesma pessoa, no mesmo lugar e em contexto semelhante. Sustentou, ainda, que os crimes são da mesma espécie, pois tangenciam o mesmo bem jurídico e revelam elementos e sanções similares. O Colegiado considerou evidente a divisão de desígnios das condutas, uma vez que o paciente já havia consumado o roubo quando passou a exigir algo que apenas a vítima podia fornecer, de modo a caracterizar a consumação do crime de extorsão. Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem. Entendeu que estava caracterizada a continuidade delitiva. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 24.4.2018. (HC – 114667) (Informativo 899) 

Furto e configuração de crime impossível

A existência de sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a tipificação do crime de furto. Com base nesse entendimento, a Primeira Turma não conheceu de habeas corpus no qual se discutia a configuração de crime impossível em relação a furto cometido dentro de estabelecimento que possui sistema de segurança. Vencido o Ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem, por considerar configurado o crime impossível. HC 111278/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Roberto Barroso, julgamento em 10.4.2018. (HC – 111278) (Informativo 897)

Descaminho e princípio da insignificância

Aplica-se o princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de R$ 20.000,00 — valor estipulado pelo art. 20, Lei 10.522/2002 (1), atualizado pelas portarias 75 e 130/2012, do Ministério da Fazenda. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu ordem de habeas corpus para declarar a atipicidade da conduta prevista no art. 334, do Código Penal (CP) (2) e trancar a ação penal. No caso, o paciente introduziu mercadorias estrangeiras no território nacional, sem o recolhimento dos tributos devidos, calculados em R$ 19.750,41. (1) Lei 10.522/2002: “Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) ”. (2) CP: “Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos”. HC 155347/PR, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 17.4.2018. (HC – 155347) (Informativo 898)

REsp 1.643.051-MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 28/02/2018, DJe 08/03/2018 (Tema 983).

Violência doméstica e familiar contra a mulher. Danos morais. Indenização mínima. Art. 397, IV, do CPP. Pedido necessário. Produção de prova específica dispensável. Dano in re ipsa

Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória.
Cinge-se a controvérsia a definir a necessidade ou não de indicação de um montante mínimo pelo postulante, bem como a necessidade ou não da produção de prova, durante a instrução criminal, para a fixação, em sentença condenatória, da indenização por danos morais sofridos pela vítima de violência doméstica. Em relação à primeira questão, cumpre salientar que ambas as Turmas desta Corte Superior já firmaram o entendimento de que a imposição, na sentença condenatória, de indenização, a título de danos morais, para a vítima de violência doméstica, requer a dedução de um pedido específico, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. Entretanto, a Quinta Turma possui julgados no sentido de ser necessária a indicação do valor pretendido para a reparação do dano sofrido. Já a Sexta Turma considera que o juízo deve apenas arbitrar um valor mínimo, mediante a prudente ponderação das circunstâncias do caso concreto. Nesse sentido, a fim de uniformizar o entendimento, conclui-se que o pedido expresso por parte do Ministério Público ou da ofendida, na exordial acusatória, é, de fato, suficiente, ainda que desprovido de indicação do seu quantum, de sorte a permitir ao juízo sentenciante fixar o valor mínimo a título de reparação pelos danos morais, sem prejuízo, evidentemente, de que a pessoa interessada promova, no juízo cível, pedido complementar, onde, então, será necessário produzir prova para a demonstração do valor dos danos sofridos. Já em relação à segunda questão, é importante destacar que no âmbito da reparação dos danos morais, a Lei Maria da Penha, complementada pela reforma do Código de Processo Penal através da Lei n. 11.719/2008, passou a permitir que o juízo único - o criminal - possa decidir sobre um montante que, relacionado à dor, ao sofrimento, à humilhação da vítima, de difícil mensuração, deriva da própria prática criminosa experimentada. Assim, não há razoabilidade na exigência de instrução probatória acerca do dano psíquico, do grau de humilhação, da diminuição da autoestima, etc, se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo ao valor da mulher como pessoa e à sua própria dignidade. O que se há de exigir como prova, mediante o respeito às regras do devido processo penal - notadamente as que derivam dos princípios do contraditório e da ampla defesa -, é a própria imputação criminosa - sob a regra, decorrente da presunção de inocência, de que o onus probandi é integralmente do órgão de acusação -, porque, uma vez demonstrada a agressão à mulher, os danos psíquicos dela resultantes são evidentes e nem têm mesmo como ser demonstrados. Diante desse quadro, a simples relevância de haver pedido expresso na denúncia, a fim de garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa, é bastante para que o Juiz sentenciante, a partir dos elementos de prova que o levaram à condenação, fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos morais causados pela infração perpetrada, não sendo exigível produção de prova específica para aferição da profundidade e/ou extensão do dano. O merecimento à indenização é ínsito à própria condição de vítima de violência doméstica e familiar. O dano, pois, é in re ipsa. (Informativo n. 621.)  

REsp 1.688.878-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por maioria, julgado em 28/02/2018, DJe 04/04/2018 (Tema 157).

Princípio da insignificância. Crimes tributários federais e de descaminho. Débito não excedente a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Portarias n. 75 e 130/MF. Parâmetro de 20.000,00 (vinte mil reais). Orientação consolidada no STF. Revisão do tema n. 157.

Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo da Controvérsia n. 1.112.748/TO, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos - regulado pelo art. 543- C do Código de Processo Civil de 1973 -, firmou o entendimento de que incide o princípio da insignificância aos crimes federais contra a ordem tributária e de descaminho, quando o débito tributário não ultrapassar o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002 (Rel. Min. Felix Fischer, DJe 13/10/2009, Tema - 157). O julgado, na ocasião, representou um alinhamento da jurisprudência desta Corte com a do Supremo Tribunal Federal, pois, até então, ao contrário do Pretório Excelso, a orientação que predominava nesta Corte era no sentido da impossibilidade da aplicação do princípio da insignificância aos crimes tributários com base no parâmetro fixado no art. 20 da Lei n. 10.522/2002. Com o advento das Portarias n. 75 e 130/MF, ocorreu um novo distanciamento entre a jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, pois, enquanto o Pretório Excelso aderiu ao novo parâmetro fixado por ato normativo infralegal, qual seja, de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), esta Corte não o fez. Dessarte, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, nos termos dos arts. 927, § 4º, do Código de Processo Civil, e 256-S do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, revisa-se a tese fixada no REsp Representativo da Controvérsia n. 1.112.748/TO - Tema 157 (Rel. Min. Felix Fischer, DJe 13/10/2009), a fim de adequá-la ao entendimento externado pela Suprema Corte. (Informativo n. 622.) 

SÚMULA N. 575 STJ

Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art.310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo. Terceira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016 (Informativo n. 585).  

REsp 1.627.028-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, julgado em 21/2/2017, DJe 3/3/2017.

Estatuto do desarmamento. Delito tipificado no art. 16, parágrafo único, III da Lei n. 10.826/2003. Porte de artefato explosivo. Granada de gás lacrimogêneo/pimenta. Inadequação típica.

Consta que foi oferecida denúncia pela prática do crime previsto no art. 16, parágrafo único, III, da Lei n. 10.826/2003, em razão da apreensão de duas granadas com "gás lacrimogêneo" e "gás de pimenta". De fato, a conduta típica consiste em possuir, deter, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Dessa forma, para que determinada conduta seja enquadrada neste tipo penal, deve-se estabelecer o que é explosivo. Pode-se entender que um explosivo é, em sentido amplo, um material extremamente instável, que pode se decompor rapidamente, formando produtos estáveis. Esse processo é denominado de explosão e é acompanhado por uma intensa liberação de energia, que pode ser feita sob diversas formas e gera uma considerável destruição decorrente da liberação dessa energia. No entanto, não será considerado explosivo o artefato que, embora ativado por explosivo, não projete e nem disperse fragmentos perigosos como metal, vidro ou plástico quebradiço, não possuindo, portanto, considerável potencial de destruição. No caso, embora a perícia indique eficácia e potencial lesivo, constata-se que no artefato, mesmo que ativado por explosivo, a explosão decorrente da sua decomposição não é capaz de gerar destruição resultante da liberação de energia, apenas o incômodo gerado pelo gás toxico. A norma em comento, por sua vez, busca tutelar a incolumidade pública não de forma absoluta, mas apenas no que se refere ao uso de artefatos explosivos ou incendiários. Assim, para a adequação típica do delito em questão, exige-se que o objeto material do delito, qual seja, o artefato explosivo, seja capaz de gerar alguma destruição, não podendo ser tipificado neste crime a posse de granada de gás lacrimogêneo/pimenta, embora não fique impedido o enquadramento desta conduta em outra figura típica. (Informativo n. 599) 

REsp 1.680.114-GO, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 10/10/2017, DJe 16/10/2017

Estatuto da criança e do adolescente. Art. 244-B. Corrupção de menores. Participação de dois adolescentes na empreitada criminosa. Prática de dois delitos de corrupção de menores. Concurso formal.
De início, cumpre salientar que o caput do art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe que está sujeito a pena de 1 a 4 anos de reclusão, aquele que "corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la". Segundo a doutrina, o bem jurídico tutelado pelo art. 244-B do ECA é a formação moral da criança e do adolescente no que se refere à necessidade de eles não ingressarem ou permanecerem no mundo da criminalidade. Ora, se o bem jurídico tutelado pelo crime de corrupção de menores é a sua formação moral, caso duas crianças/adolescentes tiverem seu amadurecimento moral violado, em razão de estímulos a praticar o crime ou a permanecer na seara criminosa, dois foram os bens jurídicos violados. Da mesma forma, dois são os sujeitos passivos atingidos, uma vez que a doutrina é unânime em reconhecer que o sujeito passivo do crime de corrupção de menores é a criança ou o adolescente submetido à corrupção. O entendimento perfilhado também se coaduna com os princípios da prioridade absoluta e do melhor interesse da criança e do adolescente, vez que trata cada uma delas como sujeitos de direitos. Ademais, seria desarrazoado atribuir a prática de crime único ao réu que corrompeu dois adolescentes, assim como ao que corrompeu apenas um. (Informativo n. 613) 

REsp 1.452.935-PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, por unanimidade, julgado em 14/3/2017, DJe 17/3/2017

Pena de perda do cargo público. Restrição ao cargo exercido no momento do delito. Art. 92 do CP.
Cinge-se a controvérsia a saber se a perda de perdimento prevista no art. 92, I, do CP se restringe à atividade pública exercida no momento do delito. O STJ entende que o reconhecimento de que o réu praticou ato incompatível com o cargo por ele ocupado é fundamento suficiente para a decretação do efeito extrapenal de perda do cargo público (AgRg no REsp 1.613.927-RS, DJe 30/9/2016). Em regra, a pena de perdimento deve ser restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento do delito. Trilhando esse entendimento, doutrina defende que “A perda deve restringir-se somente àquele cargo, função ou atividade no exercício do qual praticou o abuso, porque a interdição pressupõe que a ação criminosa tenha sido realizada com abuso de poder ou violação de dever que lhe é inerente”. Assim, a perda do cargo público, por violação de dever inerente a ele, necessita ser por crime cometido no exercício desse cargo, valendo-se o envolvido da função para a prática do delito. Porém, salienta-se que se o magistrado de origem considerar, motivadamente, que o novo cargo guarda correlação com as atribuições do anterior, ou seja, naquele em que foram praticados os crimes, mostra-se devida a perda da nova função, uma vez que tal ato visa anular a possibilidade de reiteração de ilícitos da mesma natureza, o que não ocorreu no caso. (Informativo n. 599) 

HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, por maioria, julgado em 24/5/2017, DJe 30/6/2017

Manutenção da tipificação do crime de desacato no ordenamento jurídico. Direitos humanos. Pacto de São José da Costa Rica (PSJCR). Direito à liberdade de expressão que não se revela absoluto. Controle de convencionalidade. Inexistência de decisão proferida pela corte (IDH). Ausência de força vinculante. Preenchimento das condições antevistas no art. 13.2 do PSJCR. Incolumidade do crime de desacato pelo ordenamento jurídico pátrio, nos termos em que disposto no art. 331 do Código Penal.

A questão posta gira em torno de eventual afastamento, em controle de convencionalidade, do crime de desacato (art. 331 do CP) do ordenamento jurídico brasileiro em razão de recomendação expedida pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), para fins de incidência, ou não, do princípio da consunção na hipótese examinada. Inicialmente, importa destacar, quanto à faceta estruturante do Sistema Interamericano, que são competentes para conhecer das matérias concernentes na Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH): a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (IDH). De acordo com o art. 41 da referida Convenção (Pacto de São José da Costa Rica) – da qual o Brasil é signatário – a CIDH possui a função primordial de promover a observância e a defesa dos direitos humanos. Porém, da leitura do dispositivo, é possível deduzir que os verbos relacionados às suas funções não ostentam caráter decisório, mas tão somente instrutório ou cooperativo. Prima facie, depreende-se que a referida comissão não possui função jurisdicional. A Corte Interamericana de Direitos Humanos, por sua vez, é uma instituição judiciária autônoma cujo objetivo é a aplicação e a interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, possuindo função jurisdicional e consultiva, de acordo com o art. 2º do seu respectivo Estatuto. Já o art. 68 da aludida norma supralegal prevê que os Estados Partes na Convenção se comprometem a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes, o que denota de forma patente seu caráter vinculante. Acentue-se que as deliberações internacionais de direitos humanos decorrentes dos processos de responsabilidade internacional do Estado podem resultar em: recomendação; decisões quase judiciais e decisão judicial. A primeira revela-se ausente de qualquer caráter vinculante, ostentando mero caráter "moral", podendo resultar dos mais diversos órgãos internacionais. Os demais institutos, porém, situam-se no âmbito do controle, propriamente dito, da observância dos direitos humanos. Desta feita, a despeito do que fora aduzido no inteiro teor do voto proferido no REsp 1.640.084/SP – no sentido de que o crime de desacato é incompatível com o art. 13 do Pacto de São José da Costa Rica, por afrontar mecanismos de proteção à liberdade de pensamento e de expressão – certo é que as recomendações não possuem força vinculante, mas, na ótica doutrinária, tão somente "poder de embaraço" ou "mobilização da vergonha". Outrossim, cabe ressaltar, não houve nenhuma deliberação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (IDH) sobre eventual violação do direito à liberdade de expressão por parte do Brasil, mas tão somente pronunciamentos emanados pela CIDH. Ainda que assim não fosse, a Corte Interamericana de Direitos já se posicionou acerca da liberdade de expressão, rechaçando tratar-se de direito absoluto. Nessa toada, tem-se que o crime de desacato não pode, sob qualquer viés, seja pela ausência de força vinculante às recomendações expedidas pela CIDH, seja pelo viés interpretativo, ter sua tipificação penal afastada. (Informativo n. 607)

RHC 83.501-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, por unanimidade, julgado em 06/03/2018, DJe 05/04/2018

A existência de denúncias anônimas somada à fuga do acusado, por si sós, não configuram fundadas razões a autorizar o ingresso policial no domicílio do acusado sem o seu consentimento ou determinação judicial.

Na hipótese, verifica-se ofensa ao direito fundamental da inviolabilidade do domicílio, determinado no art. 5°, inc. XI, da Constituição da República, pois, não há referência à prévia investigação policial para verificar a possível veracidade das informações recebidas, não se tratando de averiguação de informações concretas e robustas acerca da traficância naquele local. Ainda que o tráfico ilícito de drogas seja um tipo penal com vários verbos nucleares, e de caráter permanente em alguns destes verbos, como por exemplo "ter em depósito", não se pode ignorar o inciso XI do artigo 5º da Constituição Federal e esta garantia constitucional não pode ser banalizada, em face de tentativas policiais aleatórias de encontrar algum ilícito em residências. Conforme entendimento da Suprema Corte e da Sexta Turma deste STJ, a entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária, e não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida, pois os agentes estatais devem demonstrar que havia elemento mínimo a caracterizar fundadas razões (justa causa). (Informativo n. 623.)  

HC 437.535-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Rel. Acd. Min. Rogerio Schietti Cruz, por maioria, julgado em 26/06/2018, DJe 02/08/2018.

Contravenção penal. Vias de fato. Violência doméstica. Prisão preventiva. Não cabimento.

Inicialmente cumpre destacar que a prática de vias de fato é hipótese de contravenção penal (art. 21 do DecretoLei n. 3.688/1941), e não crime, o que contraria o disposto no art. 313, II, do Código de Processo Penal. Deste modo, em se tratando de aplicação da cautela extrema, não há campo para interpretação diversa da literal, uma vez que não há previsão legal que autorize a prisão preventiva contra autor de uma contravenção, mesmo na hipótese específica de transgressão das cautelas de urgência já aplicadas. (Informativo n. 632.)  

REsp 1.738.264-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, por maioria, julgado em 23/08/2018, DJe 14/09/2018

Tortura-castigo. Art. 1º, II, da Lei n. 9.455/1997. Crime próprio. Agente que ostente posição de garante. Necessidade.
A controvérsia está circunscrita ao âmbito de abrangência da expressão guarda, poder ou autoridade, prevista na figura típica do art. 1º, II, da Lei n. 9.455/1997 (tortura-castigo). De início, cumpre esclarecer que o conceito de tortura, tomado a partir dos instrumentos de direito internacional, tem um viés estatal, implicando que o crime só poderia ser praticado por agente estatal (funcionário público) ou por um particular no exercício de função pública, consubstanciando, assim, crime próprio. A despeito disso, o legislador pátrio, ao tratar do tema na Lei n. 9.455/1997, foi além da concepção estabelecida nos instrumentos internacionais, na medida em que, ao menos no art. 1º, I, ampliou o conceito de tortura para além da violência perpetrada por servidor público ou por particular que lhe faça as vezes, dando ao tipo o tratamento de crime comum. A adoção de uma concepção mais ampla do tipo supracitado, tal como estabelecida na Lei n. 9.455/1997, encontra guarida na Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, que ao tratar do conceito de tortura estabeleceu -, em seu art. 1º, II -, que: o presente artigo não será interpretado de maneira a restringir qualquer instrumento internacional ou legislação nacional que contenha ou possa conter dispositivos de alcance mais amplo. Ressalta-se, porém, que a possibilidade de tipificar a conduta na forma do art. 1º, II, da referida lei (tortura-castigo), ao contrário da tortura elencada no inciso I, não pode ser perpetrada por qualquer pessoa, pois a circunstância de que a violência ocorra contra vítima submetida à guarda, poder ou autoridade, afasta a hipótese de crime comum, firmando a conclusão de que o crime é próprio. Nítido, pois, que, no referido preceito, há um vínculo preexistente, de natureza pública, entre o agente ativo e o agente passivo do crime. Logo, o delito até pode ser perpetrado por um particular, mas ele deve ocupar posição de garante (obrigação de cuidado, proteção ou vigilância), seja em virtude da lei ou de outra relação jurídica. (Informativo n. 633.) 

REsp 1.519.860-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, por unanimidade, julgado em 17/05/2018, DJe 25/05/2018

Roubo. Emprego de arma branca. Majorante revogada. Abolitio Criminis. Lei n. 13.654/2018. Novatio legis in mellius.

Preliminarmente cumpre salientar que, sobreveio à decisão impugnada a promulgação da Lei n. 13.654, de 23 de abril de 2018, que modificou o Código Penal nos dispositivos referentes aos crimes de furto e roubo. Essa alteração legislativa suprimiu a previsão contida no inciso I do § 2º, do art. 157, que apresentava hipótese de causa especial de aumento de pena relativa ao emprego de arma. Esta Corte possuía entendimento jurisprudencial consolidado reconhecendo que a previsão contida no dispositivo revogado abrangia não apenas armas de fogo, mas qualquer "artefato que tem por objetivo causar dano, permanente ou não, a seres vivos e coisas", nos termos do art. 3º, inciso IX, do Decreto n. 3.665/2000. No entanto, a atual previsão contida no art. 157, § 2º-A, inciso I, do Código Penal, limita a possibilidade de aumento de pena à hipótese de a violência ser cometida mediante emprego de arma de fogo, assim considerado o instrumento que "(...) arremessa projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente confinado em uma câmara que, normalmente, está solidária a um cano que tem a função de propiciar continuidade à combustão dopropelente, além de direção e estabilidade ao projétil", de acordo com o Decreto citado. Portanto, não se está diante de continuidade normativa, mas de abolitio criminis da majorante, na hipótese de o delito ser praticado com emprego de artefato diverso de arma de fogo. Na hipótese, o réu realizou a subtração fazendo uso de arma branca (faca). Diante desse fato, deve-se aplicar a lei nova, mais benéfica ao acusado, em consonância com o art. 5º, XL, da Constituição Federal, afastando-se o aumento de 1/3 aplicado na terceira fase do cálculo da pena (Informativo n. 626.)

HC 453.437-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, por unanimidade, julgado em 04/10/2018, DJe 15/10/2018

Inicialmente cumpre salientar que consoante o posicionamento firmado pela Suprema Corte, na questão de ordem no RE 430.105/RJ, sabe-se que a conduta de porte de substância entorpecente para consumo próprio,prevista no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, foi apenas despenalizada mas não descriminalizada, em outras palavras, não houve abolitio criminis. Contudo, ainda que a conduta tipificada no art. 28 da Lei n. 11.343/2006 tenha sido despenalizada e não descriminalizada, essa conduta é punida apenas com "advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo". Além disso, não existe a possibilidade de converter essas penas em privativas de liberdade em caso de descumprimento. Cabe ressaltar que as condenações anteriores por contravenções penais não são aptas a gerar reincidência, tendo em vista o que dispõe o art. 63 do Código Penal, que apenas se refere a crimes anteriores. E, se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, mostrase desproporcional o delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade. Ademais, a Sexta Turma deste Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n. 1.672.654/SP, da relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/8/2018, proferiu julgado nesse mesmo sentido. (Informativo n. 636.)  

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

SEM PROVA DO PREJUÍZO, A FALTA DE DEFESA TÉCNICA ENSEJA NULIDADE DA AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA CONCESSIVA DE SURSIS?

RESPOSTA: NÃO


"Não há nulidade na realização de audiência admonitória sem participação da Defesa. O agravante foi cientificado das consequências de eventual reincidência e do descumprimento das cláusulas impostas, tendo aceitado livremente essas condições em substituição à pena privativa de liberdade. Caso manifeste interesse, a suspensão condicional da pena pode ser modificada ou revogada a qualquer tempo, não havendo prejuízo ao réu."
(Acórdão 1105243, unânime, Relator: GEORGE LOPES, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 21/6/2018)

Acórdão 1105024, unânime, Relator: JAIR SOARES, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 21/6/2018;
Acórdão 1097958, maioria, Relator: ROMÃO C. OLIVEIRA, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 10/5/2018;
Acórdão 1095942, unânime, Relatora: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 10/5/2018.

JULGADOS EM DESTAQUE


  • TJDFT

Audiência admonitória – esclarecimentos sobre o sursis 
"1. A audiência admonitória de sursis penal consiste em ato voltado à ciência do sentenciado sobre as condições da suspensão condicional da pena estipulada na sentença condenatória e advertência acerca do seu não cumprimento, ocasião em que lhe é dada a oportunidade de recusá-las, o que acarretará a execução da pena privativa de liberdade.
2. Não se mostra imprescindível a presença da defesa técnica na audiência admonitória de sursis porquanto os esclarecimentos acerca das condições da suspensão da pena, que possibilitará ao sentenciado a avaliação de conveniência de seu cumprimento, são prestados pelo magistrado que preside o ato.
3. Não há que se falar em nulidade do ato em razão da ausência da defesa se não há demonstração de prejuízo ao sentenciado." 
(Acórdão 1097382, unânime, Relator: JESUINO RISSATO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 17/5/2018)

Audiência admonitória como ato jurisdicional 
"1. Prevalecendo o caráter jurisdicional do processo de execução penal, há que se reconhecer a necessidade de participação da defesa técnica na audiência admonitória, oportunidade em que o reeducando pode recusar a suspensão condicional da pena e decidir pelo cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto.
2. Malgrado seja necessária a presença da defesa no ato judicial apontado, o princípio geral norteador das nulidades em Processo Penal - pas de nullité sans grief - nos termos do art. 563 do CPP, desautoriza o reconhecimento de nulidade, seja ela absoluta ou relativa, se não demonstrado prejuízo concreto. Precedentes."
(Acórdão 1106807, unânime, Relator: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 28/6/2018)

OBSERVAÇÕES


  • STJ

Audiência admonitória como ato administrativo 
"A ausência do defensor do Paciente na audiência admonitória não configura nulidade, uma vez que tal ato não constitui atividade jurisdicional, mas sim administrativa, de competência do Juízo da Execução." RHC 24842/SC

O COMPARECIMENTO DO APENADO À AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA É COMPUTADO COMO CUMPRIMENTO DE PENA?

RESPOSTA: SIM


“A participação em grupo de Acolhimento e Orientação da seção psicossocial da VEPEMA constitui efetivo início de cumprimento, conforme diretrizes contidas nos autos e afirmadas ao reeducando no momento da audiência admonitória, a qual tem nome intuitivo - 'Audiência Inicial de Cumprimento de Pena Restritiva de Direitos (Alternativa)'. Assim, na data da referida audiência tem-se por interrompida a prescrição da pretensão executória nos termos do inciso V do artigo 117 do Código Penal.
Não se reconhece a prescrição da pretensão executória se entre os marcos interruptivos - início e continuação de cumprimento de pena - não transcorreu o prazo prescricional com base na pena em concreto.”

(Acórdão 1048720, unânime, Relatora: MARIA IVATÔNIA, 2ª Turma  Criminal, data de julgamento: 21/9/2017)

Acórdão 1058954, maioria, Relatora Designada: SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 26/10/2017;
Acórdão 1018988, maioria, Relatora Designada: ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, Câmara Criminal, data de julgamento: 15/5/2017.

OBSERVAÇÕES


  • STJ
Audiência admonitória – interrupção da prescrição – início do efetivo cumprimento das penas restritivas de direitos
“Consoante a jurisprudência do STJ, a audiência admonitória não configura início do cumprimento da pena, não servindo, portanto, para interromper o prazo da prescrição executória, contudo, efetuado o pagamento da multa, tem-se por iniciada a execução.
Não evidenciado o transcurso do lapso de 4 anos entre o trânsito em julgado da condenação para o Ministério Público e o início da execução, pelo pagamento da multa, não há falar em prescrição da pretensão executória.” AgRg no RHC 70.260/RS

“O Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que se faz necessário o efetivo comparecimento do condenado ao local destinado para o exercício das atividades estabelecidas a fim de se firmar o início do cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade.” AgRg no REsp 1.533.647/MG

"A audiência admonitória realizada para informar ao condenado a modalidade da pena restritiva de direitos imposta não é marco interruptivo da prescrição, pois não se equipara ao início do cumprimento da pena, nos termos do art. 117, inciso V, do Código Penal." EDcl no RHC 15447/SC

  • Entendimento divergente no TJDFT
“(...) não se mostra razoável, tomar-se por causa de interrupção, o comparecimento do apenado à audiência designada para dar início ao cumprimento de suas penas restritivas de direito, haja vista tratar-se de medida de natureza tipicamente administrativa.
(...)
Por tais razões, forçoso concluir que, uma vez que não foram adotadas em tempo hábil as providências adequadas à inércia do réu em relação às medidas restritivas de direito (art. 51, inc. I e II, e art. 181, § 1º, "d", da LEP), não se pode ter por causa de interrupção do lapso temporal prescricional qualquer ato administrativo referente a tanto (comparecimento a 'audiência inicial de cumprimento de pena alternativa', retirada ou recebimento de ofício de encaminhamento etc.).” (excerto extraído do inteiro teor do  Acórdão 1018988)

  • Doutrina
"A audiência admonitória tem previsão legal no art. 160, da LEP, cuja redação assim dispõe:
Transitada em julgado a sentença condenatória, o Juiz a lerá ao condenado, em audiência, advertindo-o das consequências de nova infração penal e do descumprimento das condições impostas.
(...) 
Admonitória possui o significado de ser passível de admoestação, de reprimenda. Diante disso, conclui-se que se trata de uma audiência com a finalidade de advertência para o condenado, ou seja, o Estado estará deixando de executar a pena imposta, desde que o cidadão cumpra determinadas condições, e que ao final do tempo estipulado, restará extinta sua punibilidade."
(ROZA, Anderson Figueira da. Execução penal: para que serve a audiência admonitória?, Canal Ciências Criminais. Disponível em: <https://canalcienciascriminais.com.br/audiencia-admonitoria/>. Acesso em:22/1/2018)

ULTRAPASSADO O LAPSO TEMPORAL DE 5 ANOS DA EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE, A CONDENAÇÃO ANTERIOR TRANSITADA EM JULGADO PODE CARACTERIZAR MAUS ANTECEDENTES NOS TERMOS DO ARTIGO 59 DO CP?

RESPOSTA: SIM


“O decurso de lapso temporal superior a 5 (cinco) anos entre o cumprimento ou a extinção da pena por condenação anterior e a infração posterior, embora afaste a reincidência, não impede o reconhecimento dos maus antecedentes. Precedentes do STJ.”
(Acórdão 1074865, maioria, Relator: JESUINO RISSATO, Câmara Criminal, Câmara Criminal, data de julgamento: 5/2/2018)

Acórdão 1084706,  unânime, Relatora: NILSONI DE FREITAS CUSTODIO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 22/3/2018; 
Acórdão 1083616, maioria, Relatora: SANDRA DE SANTIS, Câmara Criminaldata de julgamento: 5/3/2018;
Acórdão 1081586, maioria, Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 1º/3/2018; 
Acórdão 1074287,  unânime, Relatora: SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 8/2/2018;
Acórdão 1065937, unânime, Relator: DEMETRIUS GOMES CAVALCANTI, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 7/12/2017.

JULGADO EM DESTAQUE


Período depurador posterior a cinco anos – descaracterização como maus antecedentes
"'Quando o paciente não pode ser considerado reincidente, diante do transcurso de lapso temporal superior a cinco anos, conforme previsto no art. 64, I, do Código Penal, a existência de condenações anteriores não caracteriza maus antecedentes' (HC 119200, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 11/02/2014)."
(Acórdão 1080755, maioria, Relator: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 1º/3/2018)

OBSERVAÇÕES


  • STJ
Condenações criminais com mais de 5 anos – maus antecedentes configurado
“Embora o Supremo Tribunal Federal ainda não haja decidido o mérito do RE n. 593.818 RG/SC – que, em repercussão geral já reconhecida (DJe 3/4/2009), decidirá se existe ou não um prazo limite para se sopesar uma condenação anterior como maus antecedentes, certo é que, por ora, este Superior Tribunal possui o entendimento consolidado de que, decorrido o prazo de cinco anos entre a data do cumprimento ou a extinção da pena e a infração posterior, a condenação anterior, embora não possa prevalecer para fins de reincidência, pode ser sopesada a título de maus antecedentes. Precedentes.” HC 430959/DF

“Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, as condenações criminais alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, contudo, não impedem a configuração de maus antecedentes.” HC 423685/SP

  • STF
Repercussão geral
Tema 150/STF  repercussão geral reconhecida.
"Consideração de condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos como maus antecedentes para efeito de fixação da pena-base." RE 593818 RG/SC

Condenações criminais com mais de 5 anos – impossibilidade de serem valoradas como maus antecedentes
“Nos termos da jurisprudência desta Segunda Turma, condenações pretéritas não podem ser valoradas como maus antecedentes quando o paciente, nos termos do art. 64, I, do Código Penal, não puder mais ser considerado reincidente. Precedentes. II - Parâmetro temporal que decorre da aplicação do art. 5°, XLVI e XLVII, b, da Constituição Federal de 1988. III – Ordem concedida para determinar ao Juízo da origem que afaste o aumento da pena decorrente de condenação pretérita alcançada pelo período depurador de 5 anos.” HC 142371/SC

PODE A TEORIA DA COCULPABILIDADE SER UTILIZADA PARA O RECONHECIMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE GENÉRICA INOMINADA DO ART. 66 DO CP?

RESPOSTA: NÃO


"A Teoria da Coculpabilidade do Estado e da sociedade é instituto sem embasamento legal, que tem por escopo excluir a tipicidade da conduta ou atenuar a responsabilidade do agente delituoso, supostamente levado a essa condição por omissão do Estado. Não havendo comprovação nos autos de que o Estado negou ao representado suas necessidades básicas, não se aplica a Teoria da Coculpabilidade, e tampouco se deve invocá-la a fim de justificar a prática de delitos."
(Acórdão 1124436, unânime, Relator: SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 13/9/2018)

Acórdão 1124460, unânime, Relator: JOÃO BATISTA TEIXEIRA, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 13/9/2018;
Acórdão 1114251, unânime, Relatora: MARIA IVATÔNIA, 2ª TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 2/8/2018;
Acórdão 1058700, unânime, Relator: CARLOS PIRES SOARES NETO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 19/10/2017;
Acórdão 920945, Unânime, Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 2ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 11/02/2016.

OBSERVAÇÃO


  • STJ
Teoria da coculpabilidade – incidência como justificativa para prática de delitos – inviabiliade
"O Superior Tribunal de Justiça não tem admitido a aplicação da teoria da co-culpabilidade do Estado como justificativa para a prática de delitos. Ademais, conforme ressaltou a Corte estadual, sequer restou demonstrado ter sido o paciente prejudicado por suas condições sociais." HC 187132/MG

Aplicação da atenuante genérica da coculpabilidade – demonstração efetiva da omissão estatal no Habeas corpus – inadequação da via
"1. A atenuante genérica prevista no art. 66 do Código Penal pode se valer da teoria da coculpabilidade como embasamento, pois trata-se de previsão genérica, que permite ao magistrado considerar qualquer fato relevante - anterior ou posterior à prática da conduta delitiva - mesmo que não expressamente previsto em lei, para reduzir a sanção imposta ao réu. 2. No caso destes autos não há elementos pré-constituídos que permitam afirmar que a conduta criminosa decorreu, ao menos em parte, de negligência estatal, de modo que a aplicação do benefício pleiteado depende de aprofundado exame dos fatos e provas coligidos ao longo da instrução para que se modifique o entendimento da Corte de origem acerca da inaplicabilidade da atenuante. Tal providência, porém, não se coaduna com os estreitos limites do habeas corpus." HC 411243/PE

É NECESSÁRIA A PROVA DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO MENOR PARA A CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES?

BSERVAÇÕES PRÉVIAS: Súmula 500 do STJ. RESPOSTA: NÃO "O crime de corrupção de menores, por ser delito formal e de perigo a...