sexta-feira, 30 de novembro de 2018

CONDUÇÃO DE AUTOMÓVEL NA CONTRAMÃO, COM MORTE DE PASSAGEIRO — AUSÊNCIA DE CULPA

Não é razoável exigir do motorista que está na iminência de ser abordado por arruaceiros em local ermo e perigoso o sacrifício de sua segurança e a obediência cega às regras de trânsito. O Ministério Público recorreu contra a sentença que absolveu a ré da acusação de homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 da Lei 9.503/97). Consta dos autos que a vítima estava de carona no carro da acusada, quando esta realizou uma manobra irregular com a intenção de trafegar pequeno trecho na contramão, para escapar de um grupo de pessoas drogadas que fazia algazarra em local conhecido como “Cracolândia”, momento em que o veículo foi atingido por outro que transitava acima da velocidade. Para o Relator, não é razoável exigir da ré, aterrorizada pela possibilidade de confronto com o grupo de viciados num horário inegavelmente perigoso, após a meia-noite, que sacrificasse a sua própria segurança, a fim de obedecer fielmente às regras de trânsito. O Desembargador ressaltou que o veículo abalroador trafegava em alta velocidade, que a acusada ainda transitava na sua mão de direção quando foi atingida e que, mesmo que ela não intencionasse alcançar a contramão e permanecesse na direção correta, ainda assim, a colisão inevitavelmente aconteceria. Desta feita, por entender que não houve demonstração inequívoca de que a conduta da ré causou a morte da vítima, a Turma manteve a sentença absolutória.
Acórdão n. 1008188, 20150110190758APR, Relator Des. GEORGE LOPES, 1ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 30/3/2017, Publicado no DJe: 6/4/2017.

HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO – VÍTIMA QUE CONDUZIA BICICLETA NA CONTRAMÃO

A conduta da vítima, ao conduzir sua bicicleta na contramão de acostamento, rompeu o princípio da confiança e deu causa ao acidente fatal. A defesa, em apelação, pediu a absolvição do acusado, condenado a 2 anos e 6 meses de reclusão por homicídio culposo na direção de veículo (art. 302, da Lei 9.503/97). Conforme consta dos autos, o réu, ao trafegar com sua motoneta no acostamento, colidiu frontalmente com um ciclista, que veio a falecer em razão das lesões sofridas. Para o Relator, apesar de o réu ter cometido infração de trânsito, uma vez que não poderia transitar no acostamento – espaço destinado apenas a emergências –, a vítima cometeu infração de trânsito muito mais grave, haja vista que é absolutamente proibido trafegar na contramão. O Julgador ressaltou que, consoante o princípio da confiança, todos devem confiar que o comportamento das outras pessoas ocorrerá de forma responsável, segundo as regras da experiência. Desse modo, concluiu que a conduta da vítima deu causa ao acidente, na medida em que, ao descumprir norma de proibição absoluta, violou o princípio da confiança e impossibilitou qualquer reação do acusado capaz de evitar o acidente. A Turma, com apoio nesses fundamentos, deu provimento ao recurso para absolver o réu.
Acórdão n. 1009175, 20121110050960APR, Relator Des. ROMÃO C. OLIVEIRA, 1ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 6/4/2017, Publicado no DJe: 20/4/2017.

EXCESSO DE LIGAÇÕES TELEFÔNICAS – DANO MORAL

O recebimento de incessantes chamadas telefônicas configura mero aborrecimento e não enseja dano moral indenizável. O Banco interpôs recurso contra a sentença que o condenou ao pagamento de indenização por danos morais, em virtude de abuso de ligações telefônicas para o autor, com ofertas de empréstimo. O Relator entendeu que o apelado não comprovou o abuso, tampouco demonstrou de que forma as ligações teriam ocasionado prejuízo à sua honorabilidade, privacidade ou tranquilidade, direitos atinentes à personalidade. Para o Julgador, permitir que qualquer evento que traga desgosto seja capaz de atrair a reparação de cunho moral é banalizar o instituto e fomentar a indústria da indenização moral. Ademais, ressaltou que existem inúmeras alternativas tecnológicas disponíveis para que seja evitado esse tipo de aborrecimento, como, por exemplo, o bloqueio de chamadas. Com base nesses fundamentos, a Turma deu provimento ao recurso, para afastar a indenização por danos morais.
Acórdão n. 1012804, 20160610120148ACJ, Relator Juiz JOÃO FISCHER, 2ª Turma Recursal, Data de Julgamento: 26/4/2017, Publicado no DJe: 28/4/2017.

PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA OFENSIVA EM REDE SOCIAL – OFENSA AOS ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE

O exercício da liberdade de manifestação do pensamento deve ocorrer de forma responsável, não se admitindo excessos que violem o direito de personalidade. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que determinou que os réus se abstenham de citar, publicar, encaminhar, por qualquer meio ou processo, sobretudo em redes sociais da internet, o nome do agravado, vinculando o tratamento por ele prescrito ao estado de saúde atual do segundo réu. Nas razões do recurso, o primeiro réu alegou que não pode ser impedido, de forma genérica e indefinida, do exercício pleno da liberdade de expressão e manifestação do pensamento sob pena de se configurar censura. Segundo o Relator, o agravante reproduziu, em rede social, matéria publicada contrária ao agravado e ofensiva a ele, de autoria do segundo réu, cantor famoso, na qual vincula o tratamento prescrito pelo agravado, médico especialista em nutrologia e metabologia, ao atual estado de saúde do artista. Os Desembargadores enfatizaram que o exercício do direito à liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, inc. IV, da CF) não é absoluto, podendo sofrer restrições em virtude de sua compatibilidade com o conjunto dos demais preceitos constitucionais, tais como a proibição do anonimato e o direito à honra e à intimidade da pessoa humana. Assim, o Colegiado, tendo em vista a grande repercussão social das publicações nas redes sociais em razão da notoriedade da suposta vítima e o potencial risco de inviabilizar o exercício da atividade médica do agravado, entendeu que a decisão deve ser mantida até que seja comprovada a responsabilidade civil e criminal, de modo a evitar maiores prejuízos aos direitos de personalidade.
Acórdão n. 1008119, 20160020445789AGI, Relator Des. JOSÉ DIVINO, 6ª Turma Cível, Data de Julgamento: 29/3/2017, Publicado no DJe: 11/4/2017.

BALA PERDIDA – DANOS MORAIS

Observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a indenização por danos morais deve ser suficiente para restituir o bem-estar da vítima, sem configurar enriquecimento sem causa. O autor, quando transitava em rua pública, foi atingido por disparo resultante de troca de tiros entre a polícia militar e supostos criminosos. Em Primeira Instância, o DF foi condenado ao pagamento de R$ 25.000,00 a título de danos morais. Insatisfeito com o valor, o autor interpôs recurso para o Tribunal. Os Desembargadores observaram que as consequências sofridas pelo apelado foram muito graves, uma vez que, em razão das lesões sofridas, ele dependerá permanentemente de equipamento externo para controlar parte relevante da função digestiva. Para os Julgadores, essa debilidade atinge a dignidade da pessoa humana, na medida em que, além de gerar sérios transtornos psicológicos, configura situação extremamente vexatória, ocasiona maior dificuldade para a inserção da pessoa no mercado de trabalho e dificulta, de forma geral, os relacionamentos pessoais. Em vista das peculiaridades do caso, o Colegiado concluiu pela necessidade da adequação do valor, motivo pelo qual deu provimento ao recurso, para fixar a indenização em R$ 100.000,00.
Acórdão n. 1012956, 20150110449700APC, Relatora Desª. SANDRA REVES, 2ª Turma Cível, Data de Julgamento: 19/4/2017, Publicado no DJe: 3/5/2017.

CRIANÇA TRANCADA SOZINHA EM CARRO — CRIME DE EXPOR A VIDA OU A SAÚDE DE OUTREM A PERIGO

Deixar filho de pouca idade sozinho e trancado em veículo configura o crime de expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente. A defesa interpôs recurso contra a sentença que condenou a ré a 4 meses de detenção pelo cometimento do delito previsto no art. 132 do CP. Conforme consta dos autos, policiais encontraram uma criança de dois anos aos prantos, deixada em um carro trancado e com os vidros fechados, com iminente possibilidade de asfixia. De acordo com as testemunhas, o veículo já estava estacionado no local há mais de 30 minutos, e os policiais somente conseguiram encontrar a mãe meia hora depois. Para os Julgadores, a conduta da ré de deixar o seu filho dormindo no carro trancado, durante tempo significativo, para, com o seu namorado, mostrar o Lago Paranoá a familiares, efetivamente expôs a vida e a saúde da criança a perigo direto e imediato. Desse modo, a Turma decidiu manter a condenação.
Acórdão n. 101713720160110623255APJ, Relator Juiz PEDRO DE ARAÚJO YUNG-TAY NETO, 3ª Turma Recursal, Data de Julgamento: 9/5/2017, Publicado no DJe: 18/5/2017.

ESTELIONATO SENTIMENTAL — DANOS MORAIS

Brigas e mensagens que demonstrem animosidades decorrentes de término de namoro não justificam indenização por dano moral. Em ação judicial, o autor pediu compensação por danos materiais e morais sob a alegação de ter sido vítima de estelionato sentimental. Relatou ter conhecido a ré num site de encontros virtuais e iniciado um relacionamento à distância, quando esta, por meio de ardilosas artimanhas, o teria ludibriado, para obter um empréstimo de R$ 4.000,00 e para ganhar um celular e viagens aos Estados Unidos, local onde reside o autor. Alegou, ainda, danos morais em razão do tratamento humilhante que teria recebido dela durante o namoro. Por sua vez, a ré, em reconvenção, também pleiteou danos morais. O Juiz de Primeiro Grau julgou improcedente o pedido de ressarcimento dos danos materiais ao fundamento de falta de provas da realização do empréstimo e de os presentes dados pelo autor configurarem mera liberalidade. Em relação aos danos morais, condenou ambos ao pagamento da indenização de R$ 10.000,00, reciprocamente, em virtude das ofensas trocadas por ocasião do rompimento amoroso. No Tribunal, os Desembargadores deram parcial provimento aos recursos das partes, para afastar a condenação. Para o Colegiado, brigas e mensagens telefônicas que demonstrem animosidades decorrentes de término de namoro, por si sós, não ensejam dano moral indenizável, na medida em que não atingem os direitos da personalidade.
Acórdão n. 101609520160710003003APC, Relator Des. HECTOR VALVERDE, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 10/5/2017, Publicado no DJe: 22/5/2017.

MORTE DE VÍTIMA EM AÇÃO POLICIAL — RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

A responsabilidade civil do Estado deve ser afastada, quando a vítima, ao ser abordada, foge e efetua disparos contra os policiais. Trata-se de recurso interposto pelos filhos da vítima que morreu durante ação policial, com vistas à condenação do Distrito Federal ao pagamento de pensão alimentícia e de indenização por danos morais. Inicialmente, o Relator destacou que a responsabilidade civil decorrente do risco administrativo não é genérica e indiscriminada, razão pela qual se deve verificar se houve a participação total ou parcial do lesado no dano. No caso dos autos, o Julgador explicou que o policial agiu no estrito cumprimento do dever legal, pois o pai dos apelantes, após a prática delitiva, empreendeu fuga e trocou tiros com os militares. Desse modo, a Turma concluiu que a vítima deu causa ao evento que culminou em sua morte, motivo pelo qual não deve incidir a responsabilidade da Administração.
Acórdão n. 1021057, 20160110117374APC, Relator Des. SILVA LEMOS, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 26/4/2017, Publicado no DJe: 6/6/2017.

IMPEDIMENTO DE EMBARQUE DE PASSAGEIRO COM ARMA DE FOGO EM AERONAVE – DANOS MORAIS

O impedimento do embarque de passageiros armados que conseguiram apresentar autorização da Polícia Federal para porte de arma, quando a aeronave ainda estava em solo, caracteriza falha da prestação de serviço. A Turma confirmou a sentença que condenou empresa aérea ao pagamento de indenização por danos morais, por ter impedido o embarque de passageiros que portavam arma de fogo. Os Julgadores destacaram que, conforme determina a Instrução de Aviação Civil 107-2005 e o Decreto 7.168/2010, o passageiro armado dever ser conduzido por um funcionário da empresa aérea ao setor do Departamento de Polícia Federal ou a outro órgão de segurança pública do aeroporto, a fim de que seja liberado para o voo após o exame da documentação pertinente. No caso dos autos, os Desembargadores observaram que os autores, após muito esperarem pelo gerente da empresa, foram comunicados de que teriam de obter a liberação por conta própria, no posto da Polícia Federal localizado na cidade, e que, apesar de terem conseguido apresentar a autorização solicitada, quando a aeronave ainda estava em solo, não lhes havia sido permitido o embarque. Para os Magistrados, a conduta da ré demonstra que o serviço prestado foi faltoso e desrespeitoso com os consumidores, uma vez que a negligência dela em resolver o problema culminou na perda da viagem programada pelos autores e em diversos transtornos relacionados à hospedagem, à alimentação e à aquisição de novas passagens.
Acórdão n. 1030078, 20150111243557APC, Relator Des. SILVA LEMOS, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 28/6/2017, Publicado no DJe: 17/7/2017.

INFORMAÇÕES EM BANCO DE DADOS CRIMINAIS – IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO

As informações relativas aos processos criminais em que extinta a punibilidade do réu devem ser mantidas nos registros criminais da Polícia de forma inacessível à população em geral. Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou improcedente a ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, na qual o autor pretendia a retirada de seus dados do sistema de registros da Polícia Civil e o recebimento de indenização. Em suas razões de apelo, o autor sustentou que houve a extinção da punibilidade nos processos penais em que aparece como acusado e que a permanência de seu nome no banco de dados da Secretaria de Segurança Pública do DF gera constrangimento e humilhação. Para o Relator, a sentença a quo deve ser mantida haja vista que, conforme dispõem os arts. 748 do CPP e 202 da LEP, as condenações anteriores devem ficar inacessíveis às pessoas em geral, mas não aos agentes públicos encarregados da investigação e repressão criminal. Desta feita, em virtude da necessidade de manutenção das informações criminais para futuras consultas pelos agentes públicos autorizados e para os fins previstos na lei, a Turma negou provimento ao recurso.
Acórdão n. 1032476, 20160110783983APC, Relator Des. MARIO-ZAM BELMIRO, 8ª Turma Cível, Data de Julgamento: 13/7/2017, Publicado no DJe: 24/7/2017.

HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE AUTOMÓVEL – COMPENSAÇÃO DE CULPAS

No crime de homicídio culposo na direção de automóvel, ainda que a vítima tenha contribuído para a ocorrência do acidente, a responsabilidade penal do agente não é afastada, pois não há compensação de culpas no Direito Penal. Motorista condenado pelo crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, da Lei 9.503/97) apelou contra a decisão do Juízo a quo, alegando que a não utilização de equipamentos de segurança por parte do ciclista e a travessia súbita deste foram as causas determinantes do atropelamento. Para a Relatora, as provas técnica e testemunhal colacionadas aos autos demostraram que a ingestão de bebida alcoólica durante toda a madrugada e o esgotamento físico do réu contribuíram para diminuir sua capacidade de reação, ao conduzir o automóvel. Assim, a Magistrada destacou que, apesar de reconhecida a culpabilidade concorrente do ciclista em razão da ausência do equipamento de segurança, o acusado, ao dirigir sob os efeitos de bebida alcoólica, agiu com imprudência e faltou com o dever objetivo de cuidado. Dessa forma, a Turma negou provimento ao apelo, por entender que a culpa concorrente da vítima não afasta a responsabilidade do apelante, uma vez que, no direito penal, não existe a compensação de culpas.
Acórdão n. 1038901, 20150110352740APR, Relatora Desª. SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 10/8/2017, Publicado no DJe: 17/8/2017.

CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA DE SERVIDOR PÚBLICO EM VIRTUDE DE CONDENAÇÃO PENAL SUPERVENIENTE – ILEGALIDADE

É nulo o ato de cassação da aposentadoria de servidor público em virtude da superveniência de sentença penal condenatória, da qual decorreria a perda de sua função pública. O Distrito Federal interpôs agravo de instrumento contra decisão que deferiu o pedido de tutela provisória para determinar que fosse restabelecido o pagamento dos proventos proporcionais (em virtude de invalidez) ao autor desde sua reforma até a superveniência de decisão judicial em sentido diverso. Alegou que a Portaria PMDF/DIP 18 de 28/2/14, a qual concedeu o benefício previdenciário ao autor, foi anulada em cumprimento da sentença que o condenou pela prática do crime de homicídio tentado, com a consequente perda da função pública. Inicialmente, a Relatora enfatizou que, à época da concessão do benefício, o autor preenchia todos os requisitos necessários para a concessão da aposentadoria. Afirmou que o efeito da condenação relativo à perda de cargo público (art. 92, inciso I, alínea b, do CP) não se aplica ao servidor público inativo, pois este não mais ocupa cargo, tampouco exerce função pública. Verificou que a perda da aposentadoria, no presente caso, representaria interpretação extensiva da norma do art. 92 do CP, o que é vedado sob pena de ofensa ao princípio da reserva legal. Assim, a Turma reconheceu a ilegalidade do ato de cassação da aposentadoria do autor.
Acórdão n. 1045786, 07080501220178070000, Relatora Desª. GISLENE PINHEIRO, 7ª Turma Cível, data de julgamento: 13/9/2017, publicado no PJe: 15/9/2017.

VISUALIZAÇÃO DO CONTEÚDO DE CELULAR DE RÉU PRESO EM FLAGRANTE – DESNECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL

A visualização das mensagens constantes no celular do réu preso em flagrante não afronta a garantia constitucional de sigilo dos dados de comunicações telefônicas. A defesa interpôs recurso contra a sentença que condenou os réus pela prática do crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/2006), sustentando, dentre outras alegações, a nulidade da prova obtida por meio da extração de dados e de conversas registradas no aplicativo de celular WhatsApp, sem prévia autorização judicial. Os Desembargadores ressaltaram que os policiais, por ocasião do cumprimento de mandado de busca e apreensão, apreenderam porções de drogas, balanças de precisão e um celular no qual foram visualizadas mensagens indicativas de tráfico de entorpecentes, trocadas por meio do referido aplicativo. Nesse contexto, os Julgadores concluíram pela inocorrência de violação à Constituição Federal (art. 5º, X e XII) e à Lei 9.296/96 (art. 9º), por não se tratar de interceptação de dados de comunicação sem autorização judicial, mas apenas da verificação de prova preexistente no momento da prisão em flagrante de um dos réus. Com base nesses argumentos, o Colegiado rejeitou a preliminar suscitada.
Acórdão n. 1048938, 20160110353252APR, Relator Des. DEMÉTRIUS GOMES CAVALCANTI, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 21/9/2017, publicado no DJe: 29/9/2017. 

SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS – EFEITO AUTOMÁTICO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA CRIMINAL

A suspensão dos direitos políticos é consequência direta da sentença condenatória criminal transitada em julgado, independentemente da espécie de pena aplicada. Condenado por manter e expor à venda diversas mídias reproduzidas com violação de direito autoral, o réu interpôs recurso, pleiteando a manutenção dos seus direitos políticos, uma vez que a pena privativa de liberdade foi substituída pela pena restritiva de direitos. Os Desembargadores explicaram que na substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, embora o condenado não seja preso, ele é apenado criminalmente. Com efeito, condenado criminalmente, a suspensão dos direitos políticos do réu é efeito secundário e automático conforme o disposto no art. 15, III, da Constituição Federal, independentemente da espécie das sanções penais aplicadas. Os Julgadores destacaram a repercussão geral do tema no RE 601182, no entanto, como o STF ainda não se pronunciou sobre o assunto e não determinou a suspensão nos processos de origem, concluíram pela manutenção da medida.
Acórdão n. 1064712, 20160710093848APR, Relator Des. GEORGE LOPES, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 23/11/2017, publicado no DJe: 5/12/2017.

PORTE DE ARMA BRANCA FORA DE CASA – CONTRAVENÇÃO PENAL

A contravenção penal de porte de arma branca está em vigor e não depende de regulamentação. Em Primeira Instância, o réu foi condenado como incurso nas penas do tipo penal previsto no art. 19 da Lei de Contravenções Penais – “Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta, sem licença da autoridade” –, por ter sido encontrado, em via pública, embriagado, portando uma faca de 32 cm. Ao examinar o recurso interposto pela defesa, os Magistrados explicaram que o referido dispositivo legal continua a viger no que se refere ao porte de arma branca, posto não ter sido revogado pela Lei 9.437/97 (que dispôs sobre registro, posse e comercialização de arma de fogo e munição). Os Julgadores também consignaram que não prospera a alegação de atipicidade da conduta em virtude da ausência de regulamentação sobre as condições exigidas para o porte de arma branca, uma vez que a expressão contida no texto legal “sem licença da autoridade” não se aplica a esse tipo de arma. Com base nesses fundamentos, a Turma Recursal negou provimento ao recurso.
Acórdão n. 1068067, 20170110231084APJ, Relator Juiz EDILSON ENEDINO DAS CHAGAS, 2ª Turma Recursal, data de julgamento: 13/12/2017, publicado no DJe: 18/12/2017.

APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE CELULAR EM AMBIENTE DE TRABALHO – CRIMES DE FURTO E DE INVASÃO DE DISPOSITIVO INFORMÁTICO ALHEIO

Aquele que se apropria de celular do colega de trabalho, altera as senhas do aparelho, os dados armazenados e divulga as fotografias com mensagens como se fosse o dono comete os crimes de furto e de invasão de dispositivo informático. O acusado, analista de sistemas terceirizado de órgão público, levou para casa o celular da colega de trabalho, deixado em cima da mesa durante o expediente, e realizou alterações de senha e de perfil das redes sociais da vítima. Inconformado com a condenação pela prática dos crimes de furto e de invasão de dispositivo informático, interpôs recurso. Em suas razões, sustentou ausência de dolo no primeiro crime e a falta de provas da autoria com relação ao segundo crime. Para os Desembargadores, improcede a alegação de falta do elemento subjetivo do furto, uma vez que o acusado se apoderou do celular, sem realizar qualquer diligência para localizar o proprietário, e só o devolveu quando foi procurado por policiais legislativos que rastrearam o aparelho e constataram que estava na casa dele. Destacaram, ainda, a comprovação do intuito do réu de dispor do celular como se fosse dono, pois, no dia seguinte à subtração do bem, anunciou a sua venda por R$ 1.000,00. Quanto ao crime de invasão de dispositivo informático, os Magistrados ressaltaram que ficou demonstrado pela perícia técnica e por testemunhos que as violações realizadas no aparelho, como a troca das senhas da titular, a alteração dos dados constantes das redes sociais e as várias fotografias divulgadas pelo aplicativo WhatsApp, foram feitas sob o comando do acusado. Desse modo, a Turma concluiu pela manutenção da sentença.
Acórdão n. 1077481, 20160110600413APR, Relator Des. GEORGE LOPES, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 15/2/2018, publicado no DJe: 1º/3/2018.

CONDENAÇÃO POR ESTUPRO DE VULNERÁVEL – NOVAS PROVAS – REVISÃO CRIMINAL

Admite-se o pedido revisional se há novas provas de que a vítima prestou depoimento falso, decisivo para a condenação do réu. Inconformado com a condenação à pena de 8 (oito) anos de reclusão e à perda do cargo público de policial militar, por estupro de vulnerável, o réu ajuizou revisão criminal. Requereu a absolvição, o restabelecimento dos direitos perdidos e a indenização por erro judicial. Alegou que a sentença foi fundamentada em depoimentos falsos e em vídeo confeccionado pela própria vítima em data diversa daquela do crime. Sustentou que, após prolatada a decisão condenatória, o ofendido e seus familiares alteraram a versão inicial e disseram que o fato nunca ocorrera. Admitida a revisional em virtude da inovação nos depoimentos, a nova versão do ofendido foi a de que havia gravado um vídeo em que reclamava de dor, porque tinha apanhado, e não em razão de abusos, e que, quando levado à delegacia, foi ameaçado de ter a genitora presa, caso não apontasse o autor do estupro. A mãe e o irmão da vítima apresentaram relatos semelhantes sobre a inocência do réu e as intimidações dos policiais. Os Julgadores, então, em decorrência das contradições entre os depoimentos apresentados no processo de origem e no de justificação criminal, além das incongruências entre a data da prática do suposto crime e a da gravação do vídeo, concluíram pela inocência do autor. Assim, a Câmara Criminal determinou a absolvição, a reintegração ao cargo público, salvo se tivesse havido a perda em virtude de outro processo criminal, e, quanto à indenização pleiteada, entendeu pela incompetência da Justiça do DF para arbitrá-la, motivo pelo qual o pedido foi considerado parcialmente procedente.
Acórdão n. 1087626, 20170020211662RVC, Relatora Desª ANA MARIA AMARANTE, Câmara Criminal, data de julgamento: 9/4/2018, publicado no DJe: 19/4/2018. Acórdão em segredo de justiça. Cópia de inteiro teor do acórdão somente para as partes e para os advogados cadastrados nos autos.

LESÕES A TRANSEXUAL FEMININA – COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

Transexual feminina, por se autoidentificar como mulher, goza da proteção conferida pela Lei Maria da Penha, mesmo que não tenha realizado a cirurgia de transgenitalização ou alterado o nome civil. A Turma reformou decisão do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que, em inquérito que apura a prática de lesões corporais e ameaças contra transexual feminina, declinou da competência para uma das varas criminais. O Relator consignou que a ofendida havia declarado sentir-se como mulher, ser socialmente conhecida por nome feminino, ter marcado data para a cirurgia de redesignação sexual e ingressado com ação para alterar o registro civil. Apontou a decisão do STJ que permitiu a modificação do registro de transexual, sem a realização de cirurgia de transgenitalização. Afirmou que, recentemente, o STF e o TSE manifestaram-se no mesmo sentido e decidiram, também, pela dispensa de autorização judicial para a mudança de sexo. O Desembargador salientou, ainda, que a “autodefinição de gênero realizada por cada indivíduo deve ser acompanhada e não tolhida pelos institutos jurídicos”. Basta a transgênero feminina se autoidentificar como mulher, para se tornar titular de direitos da Lei Maria da Penha. Acrescentou que a Lei 11.340/06 utiliza o termo “gênero” no sentido construído socialmente, e não naquele pautado pela identificação do sexo ao nascer. Assim, a Turma reconheceu a vulnerabilidade da vítima e, ante a incidência da Lei Maria da Penha ao caso, fixou a competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para julgamento do feito.
Acórdão n. 1089057, 20171610076127RSE, Relator Des. GEORGE LOPES LEITE,  1ª Turma Criminal, data de julgamento: 5/4/2018, publicado no DJe: 20/4/2018.

ROUBO PRATICADO COM ARMA IMPRÓPRIA OU BRANCA – MAJORANTE – LEI NOVA MAIS FAVORÁVEL

O uso de arma imprópria ou branca no roubo, embora não mais configure causa de aumento de pena, pode ser avaliado na primeira fase da dosimetria. Em primeira instância, a ré foi condenada pelo crime de roubo tentado mediante a utilização de uma faca. Na fase recursal, pretendeu a desclassificação para os delitos ou de ameaça ou de constrangimento ilegal, sob o argumento de ter desistido do roubo a pedido de um amigo que estava próximo do evento. O Relator, entretanto, constatou que a apelante não tinha desistido voluntariamente de prosseguir na execução do crime, mas fora surpreendida pela aproximação de terceiro, o que evitou que o roubo se concretizasse; portanto, o crime não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, razão pela qual o Desembargador rejeitou a desclassificação pretendida. Na fase de individualização da pena, os Julgadores destacaram que, com o advento da Lei 13.654, em vigor desde o dia 24/4/2018, não mais subsiste no roubo a causa de aumento pelo emprego de arma imprópria ou branca, como a faca, pois o novo dispositivo legal apenas previu como majorante o uso de arma de fogo. Afirmaram que, embora o crime tenha sido praticado antes de a lei entrar em vigor, aplica-se ao caso a norma mais favorável de modo retroativo. Por fim, os Desembargadores destacaram que “o emprego de arma imprópria, no caso, faca, justifica a valoração negativa das circunstâncias do crime e, em consequência, o aumento da pena-base, observada, contudo a proibição da reformatio in pejus”. Assim, a Turma deu parcial provimento ao recurso, para afastar a causa de aumento, e considerou como circunstância judicial negativa o emprego de arma imprópria.
Acórdão n.1095208, 20170210015989APR, Relator Des. JAIR SOARES, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 10/5/2018, publicado no DJe: 14/5/2018

SUBTRAÇÃO DE ALIMENTO EM SUPERMERCADO – FURTO FAMÉLICO NÃO CONFIGURADO

Apenas o furto de comida para consumo imediato, com o objetivo de saciar a fome, praticado por pessoa sem condições financeiras para adquirir o alimento, pode ser considerado famélico. A Primeira Turma Criminal decidiu afastar a tese de furto famélico, ao julgar recurso interposto por ré que subtraiu duas peças de queijo tipo muçarela, com pouco mais de 4 kg, avaliadas em R$ 218,62, de um supermercado. Os Desembargadores entenderam que o reconhecimento do furto famélico depende dos seguintes requisitos: que a coisa subtraída sirva para saciar a fome de forma imediata; que a subtração seja o único ou o último recurso do agente para conseguir comida; que a pessoa esteja impossibilitada de trabalhar, ou, caso exerça atividade laboral, que seus ganhos não sejam suficientes para comprar os alimentos de que necessita. Além de rejeitar as teses de estado de necessidade e de inexigibilidade de conduta diversa, o Colegiado também afastou a aplicação do princípio da insignificância, por não estarem reunidos, no caso concreto, os seguintes pressupostos: mínima ofensividade da conduta, nenhuma periculosidade social da ação, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada. Ademais, os Julgadores consignaram que a extensa folha de antecedentes penais da requerida contribuiu para a não incidência do princípio da bagatela. A Turma também rejeitou a tese de crime impossível, que se amparava na alegação de que o estabelecimento era vigiado por câmeras. Nesse ponto, os Julgadores ressaltaram que, embora a monitoração eletrônica dificulte a consumação do delito, não o torna impossível, nos termos da Súmula 567 do Superior Tribunal de Justiça.
Acórdão n. 1097684, 20161610081735APR, Relatora Desª ANA MARIA AMARANTE, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 17/5/2018, publicado no DJe: 23/5/2018.

DIFAMAÇÃO VIA WHATSAPP – COMPETÊNCIA DO FORO DE RESIDÊNCIA DO TERCEIRO QUE TOMOU CONHECIMENTO DA OFENSA

Com a incerteza sobre o local da prática de infração de menor potencial ofensivo, aplica-se a regra geral do CPP, que determina a competência pelo lugar em que se consuma a infração. O Juizado Especial Criminal de Taguatinga suscitou conflito negativo de competência, para dirimir controvérsia acerca do juízo competente para processar e julgar delito cometido por meio de mensagem enviada por aplicativo de celular. O termo circunstanciado fora inicialmente distribuído para o Juízo de Ceilândia, que declinou da competência. De acordo com informações dos autos, morador de Taguatinga enviou mensagem com conteúdo difamatório, via aplicativo WhatsApp, para morador de Ceilândia, que, após tomar ciência dela, decidiu cancelar uma palestra que o ofendido/querelante realizaria em sua igreja. No voto, o Relator consignou que o crime de difamação se consuma quando o fato difamatório chega ao conhecimento de terceira pessoa, que não a vítima, razão pela qual é competente o Juízo do local da consumação do evento. Nesse contexto, o Colegiado declarou a competência do Juizado Especial Criminal de Ceilândia, para onde remeteu os autos, pois, naquela Circunscrição, residia o terceiro destinatário da mensagem difamatória.
Acórdão n. 1101861, 20180020017968DVJ, Relator Juiz ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Recursal, data de julgamento: 30/5/2018, publicado no DJe: 11/6/2018.

CIBERPEDOFILIA – ARMAZENAMENTO DE VÍDEO PORNOGRÁFICO EM CELULAR

O armazenamento de vídeo com cenas de sexo explícito ou pornográfico que envolva criança caracteriza o crime de posse de pornografia infantil, incluído no ECA pela Lei 11.829/2008. Em primeira instância, o réu foi condenado por possuir e por armazenar, em seu aparelho celular, vídeo que continha cenas de sexo explícito ou pornográfico com o envolvimento de criança. Apelou da sentença, pleiteando a absolvição, por entender ausente a prova da tipicidade da conduta, uma vez que não houve demonstração do dolo na manutenção das mídias em seu telefone. Alegou que recebera o vídeo de um grupo de WhatsApp e que não sabia que seria crime armazená-lo; assim, guardou-o em seu celular, mas não o repassou. O Relator entendeu que a conduta do réu de armazenar o vídeo em seu aparelho, corroborada pela sua confissão espontânea, é o bastante para caracterizar o crime do art. 241-B da Lei 8.069/90. Acrescentou que os depoimentos dos policiais confirmaram que havia um vídeo com cena de sexo com uma criança à época em que o réu foi levado à delegacia de polícia para verificação de possível posse de entorpecentes. Dessa forma, o Colegiado manteve a condenação.
Acórdão n. 1102109, 20170610007076APR, Relator Des. JESUINO RISSATO, 3ª Turma Criminal, data de julgamento: 7/6/2018, publicado no DJe: 12/6/2018. Processo em segredo de justiça. Cópia de inteiro teor do acórdão somente para as partes e os advogados cadastrados nos autos.

INFORMAÇÃO COMPARTILHADA ENTRE VÍTIMAS – FLAGRANTE ESPERADO – ESTELIONATO NÃO CONSUMADO

A informação repassada de uma vítima à outra, que obsta a consumação da prática de estelionato e resulta na prisão do criminoso, configura hipótese de flagrante esperado.  Em primeira instância, o réu foi condenado pelo crime de estelionato pela venda de celulares falsificados a preços módicos, na região central de Brasília. O acusado, mediante uso de nome fictício, anunciava os aparelhos em site de vendas e os entregava juntamente com notas fiscais também falsificadas. As vítimas posteriormente percebiam que não se tratava de produtos originais. Na apelação, a defesa defendeu a atipicidade da conduta. Alegou tratar a hipótese de crime impossível, porque decorrente de flagrante preparado. Os Desembargadores consignaram que a segunda vítima já havia acertado o encontro com o réu para efetivação do negócio; porém, ao ser alertado pelo colega de que este havia caído no golpe no dia anterior, acionou a polícia. Na hipótese, o fato de a informação compartilhada entre os ofendidos ter viabilizado a prisão do estelionatário não configura flagrante preparado/crime impossível, mas sim flagrante esperado, pois o réu voluntariamente deu início à empreitada criminosa.  Por fim, o Colegiado julgou parcialmente procedente o recurso, somente para reduzir o quantum da reparação por danos, porque parte do valor equivalente ao prejuízo das vítimas já havia sido depositado em Juízo.  
Acórdão n. 1101883, 20180110102740APR, Relator Des. ROMÃO C. OLIVEIRA, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 7/6/2018, publicado no DJe: 2/7/2018.

CONJUNÇÃO CARNAL MEDIANTE FRAUDE – MANIFESTAÇÃO DE VONTADE INFLUENCIADA POR LÍDER RELIGIOSO

Líder espiritual que utiliza artifício fraudulento, hábil a viciar a livre manifestação da vontade da vítima, fazendo-a acreditar que está “amaldiçoada”, para com ela praticar atos sexuais, comete o crime do art. 215 do CP. Em primeira instância, líder religioso foi condenado como incurso no art. 215 do CP pela prática de conjunção carnal com uma fiel, mediante fraude. O réu induziu a vítima a acreditar que ela tinha sido amaldiçoada e necessitava ser ungida com um óleo preparado por ele. No apelo, a defesa arguiu nulidade do feito em razão da ausência de exame de corpo de delito e, no mérito, pleiteou a absolvição do autor. Argumentou que os atos sexuais foram consentidos, pois havia relacionamento amoroso entre o réu e a ofendida. No Tribunal, os Julgadores rejeitaram a preliminar. Consideraram irrelevante a confecção de laudo técnico, pois o exame não revelaria a existência de vestígios de abuso sexual, uma vez que o denunciado não ejaculou na vagina da mulher, e o crime não foi praticado com violência ou grave ameaça, mas mediante fraude. Além disso, a materialidade foi suprida por outras provas, especialmente a testemunhal. No mérito, destacaram que a prova oral demonstrou que o réu se valeu da condição de líder religioso e de artifício fraudulento para “alcançar sexualmente a vítima”. Ao final, a Turma deu parcial provimento ao recurso, somente para reduzir a pena do réu.
Acórdão n. 1106774, 20160410054882APR, Relator Des. JESUINO RISSATO, 3ª TURMA CRIMINAL, data de julgamento: 28/6/2018, publicado no DJe: 5/7/2018. Processo em segredo de justiça. Cópia de inteiro teor do acórdão somente para as partes e para os advogados cadastrados nos autos.

ASSÉDIO SEXUAL CONTRA EMPREGADA – COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


Compete ao Juizado de Violência Doméstica julgar acusado de praticar assédio sexual contra empregada doméstica. Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher suscitou conflito negativo de competência contra Juizado Especial Criminal, por entender que o crime de assédio sexual, supostamente praticado pelo empregador contra empregada doméstica, não seria de sua competência para julgamento. No Tribunal, os Desembargadores destacaram que a conduta do empregador, de constranger a empregada doméstica com o intuito de obter favorecimento sexual, prevalecendo-se da sua condição de superior hierárquico, caracteriza violência doméstica que justifica a competência do Juízo suscitante. O Relator ressaltou que “no crime de assédio sexual, a superioridade hierárquica do agressor sobre a vítima – em razão do exercício de emprego, cargo ou função – é circunstância elementar do tipo penal (CP, art. 216-A). Isso, contudo, não significa que mulheres vítimas desse crime não estejam inseridas no âmbito de proteção da Lei Maria da Penha, sobretudo quando se trata de empregadas domésticas, cujo local de trabalho se confunde com o ambiente doméstico e familiar”.  Assim, a Câmara, por unanimidade, declarou competente para julgamento do feito o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
Acórdão n.1111591, 07101370420188070000, Relator Des. JAIR SOARES, Câmara Criminal, data de julgamento: 23/7/2018, publicado no DJe: 30/7/2018.

DILIGÊNCIAS POLICIAIS REALIZADAS COM BASE EM INFORMAÇÕES INVERÍDICAS – FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO

Quando o agente falsificador utiliza o documento adulterado, o delito de uso de documento falso absorve o de falsidade ideológica. Uma delegada de polícia foi condenada como incursa nos artigos 299, parágrafo único, c/c 304, ambos do Código Penal, por ter solicitado verba à direção geral do órgão em que atuava para realizar diligências em outro Estado da Federação, a pretexto de prender e recambiar um indiciado para o Distrito Federal, quando o real motivo da operação era a busca de menores desaparecidos. As partes apelaram. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios requereu o reconhecimento do concurso de crimes entre a falsificação e o uso de documento falso. A defesa arguiu a preliminar de prescrição como causa extintiva da punibilidade. No mérito, alegou que houve retificação das diligências. Também sustentou que “a solicitação” não poderia ser considerada um documento na forma descrita pela legislação penal. Por fim, aduziu que o crime de uso de documento falso absorveria o tipo do artigo 299 do CP. A Turma rejeitou a preliminar, ao verificar que o prazo necessário para o reconhecimento da prescrição retroativa não transcorrera. No mérito, confirmou a divergência entre os pedidos realizados pela ré e a realidade. Ressaltou que a solicitação encaminhada aos superiores hierárquicos da apelante é considerado “documento”, pois apresenta forma escrita, destina-se a comprovar um fato e foi elaborado por servidor público competente, conforme definição doutrinária. Em relação às alegações do Parquet, os Julgadores entenderam que a prática dos dois delitos pela ré importa em progressividade criminosa, ou seja, primeiro inseriu-se a informação falsa no documento (crime-meio) para depois utilizá-lo em objetivo determinado (crime-fim), de forma que o segundo delito absorveria o primeiro. Ao final, o Colegiado negou provimento ao recurso da acusação e proveu parcialmente o da defesa.
Acórdão 1117785, 20130111921547APR, Relatora Desa. SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 16/8/2018, publicado no DJe: 21/8/2018.

FURTO DE COMBUSTÍVEL – PAGAMENTO DO PREJUÍZO PELO FRENTISTA – INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA


Incabível o princípio da insignificância quando o prejuízo pelo furto em posto de combustível foi suportado pelo frentista e o réu proferiu graves injúrias contra os trabalhadores do estabelecimento. Na primeira instância, o réu foi condenado pelo crime do artigo 155, caput, do Código Penal, por furtar combustível de um posto de gasolina. Em preliminar de apelação, o acusado arguiu a nulidade do processo por cerceamento de defesa, sob a alegação de que não fora ouvida testemunha fundamental para demonstrar seu arrependimento posterior. No mérito, postulou a absolvição, com base no princípio da insignificância. Ao apreciar o recurso, a Turma pontuou que o depoimento da testemunha não seria concludente para o esclarecimento do fato e que o acusado deveria ter requerido a oitiva durante a instrução processual, mas não o fez, por inércia, o que levou à preclusão do direito. Assim, rejeitou a preliminar. No mérito, os Julgadores afastaram a aplicação do princípio da insignificância, em razão do elevado grau de reprovabilidade da conduta, pois o acusado, antes de evadir-se do posto sem pagar pelo combustível, ofendeu a dignidade e o decoro dos trabalhadores do estabelecimento. Ademais, consideraram que o valor do produto furtado, quarenta reais, embora não fosse relevante para o estabelecimento, poderia ser expressivo para o frentista que arcou com o prejuízo. Dessa forma, os Desembargadores concluíram pela tipicidade material da conduta e pela ausência de arrependimento posterior, já que não houve reparação integral do dano. Ao final, a Turma deu parcial provimento ao recurso, somente para reduzir a pena do réu.
Acórdão 1116492, 20111110068519APR, Relator Des. MARIO MACHADO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 9/8/2018, publicado no DJe: 16/8/2018. 

DILIGÊNCIAS POLICIAIS REALIZADAS COM BASE EM INFORMAÇÕES INVERÍDICAS – FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO


Quando o agente falsificador utiliza o documento adulterado, o delito de uso de documento falso absorve o de falsidade ideológica. Uma delegada de polícia foi condenada como incursa nos artigos 299, parágrafo único, c/c 304, ambos do Código Penal, por ter solicitado verba à direção geral do órgão em que atuava para realizar diligências em outro Estado da Federação, a pretexto de prender e recambiar um indiciado para o Distrito Federal, quando o real motivo da operação era a busca de menores desaparecidos. As partes apelaram. O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios requereu o reconhecimento do concurso de crimes entre a falsificação e o uso de documento falso. A defesa arguiu a preliminar de prescrição como causa extintiva da punibilidade. No mérito, alegou que houve retificação das diligências. Também sustentou que “a solicitação” não poderia ser considerada um documento na forma descrita pela legislação penal. Por fim, aduziu que o crime de uso de documento falso absorveria o tipo do artigo 299 do CP. A Turma rejeitou a preliminar, ao verificar que o prazo necessário para o reconhecimento da prescrição retroativa não transcorrera. No mérito, confirmou a divergência entre os pedidos realizados pela ré e a realidade. Ressaltou que a solicitação encaminhada aos superiores hierárquicos da apelante é considerado “documento”, pois apresenta forma escrita, destina-se a comprovar um fato e foi elaborado por servidor público competente, conforme definição doutrinária. Em relação às alegações do Parquet, os Julgadores entenderam que a prática dos dois delitos pela ré importa em progressividade criminosa, ou seja, primeiro inseriu-se a informação falsa no documento (crime-meio) para depois utilizá-lo em objetivo determinado (crime-fim), de forma que o segundo delito absorveria o primeiro. Ao final, o Colegiado negou provimento ao recurso da acusação e proveu parcialmente o da defesa.
Acórdão 1117785, 20130111921547APR, Relatora Desa. SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 16/8/2018, publicado no DJe: 21/8/2018.

TRANSPORTE DE ELEVADA QUANTIDADE DE DROGA – POSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DE TRÁFICO PRIVILEGIADO


O transporte de elevada quantidade de droga entre unidades da federação, por si só, não denota a dedicação do réu a atividades delitivas ou a integração dele a organização criminosa. Réu flagrado ao transportar 2,955 kg de cocaína em uma mala de viagem entre unidades da Federação foi condenado pelo crime constante do artigo 33, caput e § 4º, c/c artigo 40, inciso V, ambos da Lei 11.343/2006, e a sanção corporal foi substituída por duas restritivas de direitos. O parquet apelou, para requerer o afastamento do privilégio previsto no § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas. Argumentou que fora apreendida grande quantidade de cocaína com o réu e que havia a intenção deste de disseminá-la por outros estados. Subsidiariamente, pediu a redução da fração aplicada e o afastamento da benesse que consta do artigo 44 do Código Penal. A Turma confirmou a aplicação do privilégio em virtude da primariedade do acusado e da ausência de indícios de dedicação deste a atividades criminosas. Reconheceu que a quantidade apreendida de entorpecente era elevada, mas destacou o entendimento dos tribunais superiores de que a atuação como “mula” não implica, necessariamente, o envolvimento do acusado na prática delitiva ou a participação dele em organização criminosa. Com isso, os Desembargadores mantiveram o privilégio que reduziu a sanção à metade bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Desta forma, o Colegiado, à unanimidade, negou provimento ao apelo.
Acórdão 1122399, Relator Des. SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 6/9/2018, publicado no DJe: 11/9/2018.

RECEPTAÇÃO DE ARMA DA POLÍCIA FEDERAL – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

RECEPTAÇÃO DE ARMA DA POLÍCIA FEDERAL – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

A receptação de arma de fogo de propriedade da Polícia Federal atrai a competência da Justiça Federal para julgamento do feito. Na origem, o réu foi condenado pelo crime previsto no artigo 180, § 6º, do Código Penal, por ter adquirido, recebido e ocultado, em proveito próprio, uma pistola com inscrição do Departamento da Polícia Federal e do brasão respectivo, ciente de tratar-se de produto de crime. O Ministério Público e a defesa apelaram, pedindo, respectivamente, o aumento da pena e a absolvição do réu. Ao apreciar a demanda, a Relatora suscitou, de ofício, preliminar de incompetência absoluta da justiça comum estadual para julgamento do feito, em razão de a arma pertencer à União. Destacou que, embora o artefato estivesse no mercado negro, continuou a integrar o patrimônio do ente federado, pois tinha a propriedade registrada no Sistema Nacional de Armas e dele constavam as iniciais do Departamento da Polícia Federal. Os Magistrados citaram o artigo 109, inciso IV, da Constituição Federal, que estabelece a competência improrrogável da Justiça Federal para julgar os feitos que envolvam bens pertencentes à União, e mencionaram o Enunciado 150 da Súmula do STJ, o qual determina que só a União poderá se pronunciar quanto à existência de seu interesse jurídico na causa. Assim, a Turma, à unanimidade, manifestou-se pela incompetência absoluta da Justiça do Distrito Federal para julgamento do feito; anulou o processo desde o recebimento da denúncia; e determinou o encaminhamento dos autos a uma das varas criminais federais do DF.
Acórdão 1125672, 20150710247820APR, Relator Desª. MARIA IVATÔNIA, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 20/9/2018, publicado no DJe: 25/9/2018.

ADULTERAÇÃO GROSSEIRA DE PLACA DE VEÍCULO COM FITA ADESIVA – CONDUTA TÍPICA

ADULTERAÇÃO GROSSEIRA DE PLACA DE VEÍCULO COM FITA ADESIVA – CONDUTA TÍPICA

A adulteração de placa identificadora de motocicleta, ainda que grosseira, é conduta típica. Na origem, o réu, flagrado na condução de motocicleta objeto de furto e com a placa de identificação adulterada pelo uso de fita isolante, foi condenado pelos crimes de receptação (artigo 180 do Código Penal), adulteração de sinal identificador de veículo automotor (artigo 311 do CP) e corrupção de menores (artigo 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente). Interposta apelação, a defesa alegou que a contrafação foi grosseira, fato que tornaria o crime impossível por absoluta impropriedade do meio utilizado. O Relator reconheceu a tipicidade da adulteração da placa da moto, embora estivesse facilmente perceptível, haja vista que o bem jurídico tutelado pelo artigo 311 do CP – a fé pública, em especial a propriedade e o registro de veículos – foi atingido. Assim, afastou a alegação de crime impossível, uma vez que a falsificação de placas dificulta o exercício do poder de polícia pelo Estado, de identificar e punir os infratores das regras de trânsito. O Magistrado ponderou não ser crível que o réu desconhecesse a adulteração realizada com o fim de ocultar a origem ilícita do bem apreendido, pois confessara a prática do delito de receptação. Dessa forma, à unanimidade, a Turma deu parcial provimento ao recurso, tão somente para minorar a pena imposta ao condenado.
Acórdão 1127740, 20171510053582APR, Relator Des. CRUZ MACEDO, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 13/9/2018, publicado no DJe: 5/10/2018.

XINGAMENTO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES – INEXISTÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO – NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE DESACATO

XINGAMENTO A FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES – INEXISTÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO – NÃO CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE DESACATO

O ato de xingar policial militar no exercício das funções não caracteriza o crime de desacato, quando ausente o dolo específico de denegrir ou de menosprezar funcionário público ou a Administração. Na hipótese, o réu foi abordado por policiais militares, enquanto conduzia sua motocicleta. Na vistoria, constataram que o lacre da placa estava rompido, o condutor não possuía habilitação e a documentação do veículo estava vencida. O acusado, então, foi informado de que a moto seria retida e conduzida ao depósito do DETRAN. Ao resistir à apreensão do bem, o réu foi rendido pelos policiais com o uso de spray de pimenta e passou a xingar os agentes. Denunciado pelo crime de desacato a funcionário público no exercício da função ou em razão dela (artigo 331 do Código Penal), o condutor foi absolvido por inexistência de dolo específico. Interposta apelação pelo Ministério Público, o Relator asseverou que, em razão das circunstâncias em que foram proferidos os xingamentos contra os militares, não se vislumbrou, na conduta do réu, o animus de denegrir ou de menosprezar o poder estatal, elemento imprescindível para a caracterização do delito. Acrescentou que houve, em verdade, mero desabafo num momento de raiva e nervosismo. Segundo o Magistrado, tipificar tal fato como desacato significaria privilegiar o excesso de sensibilidade do funcionário que lida com o público. Assim, a Turma, à unanimidade, concluiu que o entendimento mais próximo do ideal de justiça seria a absolvição do acusado.
Acórdão 1130151, 20170310063073, Relator Juiz ARNALDO CORRÊA SILVA, 2ª Turma Recursal, data de julgamento: 10/10/2018, publicado no DJe: 16/10/2018. 

terça-feira, 20 de novembro de 2018

MODELO DE QUESTÕES DISCURSIVAS - PENAL SEGUNDA FASE OAB


1.         Em determinada ação fiscal procedida pela Receita Federal, ficou constatado que Lucile não fez constar quaisquer rendimentos nas declarações apresentadas pela sua empresa nos anos de 2009, 2010 e 2011, omitindo operações em documentos e livros exigidos pela lei fiscal.
Iniciado processo administrativo de lançamento, mas antes de seu término, o Ministério Público entendeu por bem oferecer denúncia contra Lucile pela prática do delito descrito no art. 1º, inciso II da Lei n. 8.137/90, combinado com o art. 71 do Código Penal. A inicial acusatória foi recebida e a defesa intimada a apresentar resposta à acusação.
Atento(a) ao caso apresentado, bem como à orientação dominante do STF sobre o tema, responda, fundamentadamente, o que pode ser alegado em favor de Lucile.

O comportamento é materialmente atípico, pois não há crédito tributário antes do lançamento do tributo. Esta é a posição do STF,  no termos da Súmula vinculante 24.

2.         Abel e Felipe observavam diariamente um restaurante com a finalidade de cometer um crime. Sabendo que poderiam obter alguma vantagem sobre os clientes que o frequentavam, Abel e Felipe, sem qualquer combinação prévia, conseguiram, cada um, uniformes semelhantes aos utilizados pelos manobristas de tal restaurante.
No início da tarde, aproveitando a oportunidade em que não havia nenhum funcionário no local, a dupla, vestindo os uniformes de manobristas, permaneceu à espera de suas vítimas, mas agindo de modo separado. Tércio, o primeiro cliente, ao chegar ao restaurante, iludido por Abel, entrega de forma voluntária a chave de seu carro. Abel, ao invés de conduzir o veículo para o estacionamento, evade-se do local. Narcísio, o segundo cliente, chega ao restaurante e não entrega a chave de seu carro, mas Felipe a subtrai sem que ele o  percebesse. Felipe também se evade do local.
Empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso, responda às questões a seguir.

A) Qual a responsabilidade jurídico-penal de Abel ao praticar tal conduta? (responda motivando sua imputação)
Clássico exemplo doutrinário quando se compara a linha tênue entre furto mediante fraude e o estelionato. Assim, adotando a posição da maioria da Doutrina, o caso seria de estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, pois o agente emprega fraude para que a própria vítima o entregue a coisa. 

B) Qual a responsabilidade jurídico-penal de Felipe ao praticar tal conduta? (responda motivando sua imputação)
Felipe praticou o crime de furto, previsto no artigo 155 do Código Penal, pois agiu com “animus furandi” e subtraiu a coisa para si.
(aventa-se a possibilidade de ser furto qualificado pela destreza, pelo fato da vítima não ter notado a subtração. No entanto, por não haver qualquer indicação expressa de que a vítima não notou a subtração em razão de uma especial habilidade do agente e, em sendo prova da OAB, parece-nos mais interessante manter o furto simples)


3.         João e José foram denunciados pela prática da conduta descrita no art. 316 do CP (concussão). Durante a instrução, percebeu-se que os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo que efetivamente teria ocorrido, razão pela qual, ao cabo da instrução criminal e após a respectiva apresentação de memoriais pelas partes, apurou-se que a conduta típica adequada seria aquela descrita no art. 317 do CP (corrupção passiva). O magistrado, então, fez remessa dos autos ao Ministério Público para fins de aditamento da denúncia, com a nova capitulação dos fatos.
Nesse sentido, atento(a) ao caso narrado e considerando apenas as informações contidas no texto, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.

A)       Estamos diante de hipótese de mutatio libelli ou de emendatio libelli? Qual dispositivo legal deve ser aplicado?
É caso de mutatio libelli, prevista no artigo 384 do Código Penal.
B)        Por que o próprio juiz, na sentença, não poderia dar a nova capitulação e, com base nela, condenar os réus?
Primeiro, por previsão expressa no Código de Processo Penal, no mesmo artigo 384, e, também, porque adotando esta posição o Magistrado estaria assumindo a posição de acusador e violando o princípio do contraditório.
(era preciso lembrar aqui o que o réu se defende de fatos e não da capitulação. Portanto, se mudam os fatos, é preciso permitir nova defesa.)

C)        É possível que o Tribunal de Justiça de determinado estado da federação, ao analisar recurso de apelação, proceda à mutatio libelli?
Não, conforme orientação do STF, pela súmula 453.


4.         João foi denunciado pela prática do delito previsto no art. 299 caput e parágrafo único do Código Penal. A inicial acusatória foi recebida em 30/10/2000 e o processo teve seu curso normal. A sentença penal, publicada em 29/07/2005, condenou o réu à pena de 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime semiaberto, mais pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa. Irresignada, somente a defesa interpôs apelação. Todavia, o Egrégio Tribunal de Justiça negou provimento ao apelo, ao argumento de que não haveria que se falar em extinção da punibilidade pela prescrição, haja vista o fato de que o réu era reincidente, circunstância devidamente comprovada mediante certidão cartorária juntada aos autos.
Nesse sentido, considerando apenas os dados narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.

A)       Está extinta a punibilidade do réu pela prescrição? Em caso positivo, indique a espécie; em caso negativo, indique o motivo.
Houve, no caso em tela, prescrição da pretensão punitiva retroativa, pois, em tendo havido transito em julgado para a condenação, o parâmetro adotado deve ser a pena concretamente aplicada, que preserve em 4 anos.
Assim, tendo-se passado 4 anos e 6 meses entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença, o Estado perdeu o direito de punir.  
B)        O disposto no art. 110 caput do CP é aplicável ao caso narrado? 
O tema é sumulado pelo STJ, na súmula 220. Conforme o entendimento do STJ, esta causa de aumento somente se aplica à prescrição da pretensão executória, o que não se verifica neste caso. Inaplicável, portanto, o artigo 110 caput.

QUESTÕES DISCURSIVAS OAB - COM GABARITO E PADRÃO DE RESPOSTA

QUESTÃO 01
Gisele foi denunciada, com recebimento ocorrido em 31/10/2010, pela prática do delito de lesão corporal leve, com a presença da circunstância agravante, de ter o crime sido cometido contra mulher grávida. Isso porque, segundo narrou a inicial acusatória, Gisele, no dia 01/04/2009, então com 19 anos, objetivando provocar lesão corporal leve em Amanda, deu um chute nas costas de Carolina, por confundi-la com aquela, ocasião em que Carolina (que estava grávida) caiu de joelhos no chão, lesionando-se.
A vítima, muito atordoada com o acontecido, ficou por um tempo sem saber o que fazer, mas foi convencida por Amanda (sua amiga e pessoa a quem Gisele realmente queria lesionar) a noticiar o fato na delegacia. Sendo assim, tão logo voltou de um intercâmbio, mais precisamente no dia 18/10/2009, Carolina compareceu à delegacia e noticiou o fato, representando contra Gisele. Por orientação do delegado, Carolina foi instruída a fazer exame de corpo de delito, o que não ocorreu, porque os ferimentos, muito leves, já haviam sarado. O Ministério Público, na denúncia, arrolou Amanda como testemunha.
Em seu depoimento, feito em sede judicial, Amanda disse que não viu Gisele bater em Carolina e nem viu os ferimentos, mas disse que poderia afirmar com convicção que os fatos noticiados realmente ocorreram, pois estava na casa da vítima quando esta chegou chorando muito e narrando a história. Não foi ouvida mais nenhuma testemunha e Gisele, em seu interrogatório, exerceu o direito ao silêncio. Cumpre destacar que a primeira e única audiência ocorreu apenas em 20/03/2012, mas que, anteriormente, três outras audiências foram marcadas; apenas não se realizaram porque, na primeira, o magistrado não pôde comparecer, na segunda o Ministério Público não compareceu e a terceira não se realizou porque, no dia marcado, foi dado ponto facultativo pelo governador do Estado, razão pela qual todas as audiências foram redesignadas. Assim, somente na quarta data agendada é que a audiência efetivamente aconteceu. Também merece destaque o fato de que na referida audiência o parquet não ofereceu proposta de suspensão condicional do processo, pois, conforme documentos comprobatórios juntados aos autos, em 30/03/2009, Gisele, em processo criminal onde se apuravam outros fatos, aceitou o benefício proposto.
Assim, segundo o promotor de justiça, afigurava-se impossível formulação de nova proposta de suspensão condicional do processo, ou de qualquer outro benefício anterior não destacado, e, além disso, tal dado deveria figurar na condenação ora pleiteada para Gisele como outra circunstância agravante, qual seja, reincidência.
Nesse sentido, considere que o magistrado encerrou a audiência e abriu prazo, intimando as partes, para o oferecimento da peça processual cabível.
Como advogado de Gisele, levando em conta tão somente os dados contidos no enunciado, elabore a peça cabível. (Valor: 5,0)
GABARITO COMENTADO
O examinando, observando a estrutura correta, deverá elaborar MEMORIAIS, com fundamento no Art. 403, §3o, do CPP.
A peça deve ser endereçada ao Juiz do Juizado Especial Criminal.
Preliminarmente, deve ser alegada a decadência do direito de representação. Os fatos ocorreram em 01/04/2009 e a representação apenas foi feita em 18/10/2009 (Art. 38, CPP).
Também em caráter preliminar deve ser alegada a nulidade do processo pela inobservância do rito da Lei 9.099/95, anulando-se o recebimento da denúncia, com a conseqüente prescrição da pretensão punitiva. Isso porque os fatos datam de 01/04/2009 e a pena máxima em abstrato prevista para o crime de lesão corporal leve ́ de um ano, que prescreve em quatro anos (Art. 109, inciso V, do CP). Como se trata de acusada menor de 21 anos de idade, o prazo prescricional reduz-se pela metade (Art. 115, do CP), totalizando dois anos. Com a anulação do recebimento da denúncia, este marco interruptivo desaparece e, assim, configura-se a prescrição da pretensão punitiva.
No mérito, deve ser requerida absolvição por falta de prova. A materialidade do delito não restou comprovada, tal como exige o Art. 158, do CPP. O delito de lesão corporal é não transeunte e exige perícia, seja direta ou indireta, o que não foi feito. Note-se que não foi realizado exame pericial direto e nem a perícia indireta pôde ser feita, pois a única testemunha não viu nem os fatos e nem mesmo os ferimentos.
Também no mérito, deve ser alegado que não incidem nenhuma das circunstâncias agravantes aventadas pelo Ministério Público. Levando em conta que Gisele agiu em hipótese de erro sobre a pessoa (Art. 20, § 3o, do CP), devem ser consideradas apenas as características da vítima pretendida (Amanda) e não da vítima real (Carolina), que estava grávida. Além disso, não incide a agravante da reincidência, pois a aceitação da proposta de suspensão condicional do processo não acarreta condenação e muito menos reincidência; Gisele ainda é primária.
Ao final, deve elaborar os seguintes pedidos: a extinção de punibilidade pela decadência do direito de representação; a declaração da nulidade do processo com a conseqüente extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva; a absolvição da ré com fundamento na ausência de provas para a condenação. Subsidiariamente, em caso de condenação, deverá pleitear a não incidência da circunstância agravante de ter sido, o delito, cometido contra mulher grávida; a não incidência da agravante da reincidência; a atenuação da pena como conseqüência à aplicação da atenuante da menoridade relativa da ré.
QUESTÃO 02
Raimundo, já de posse de veículo automotor furtado de concessionária, percebe que não tem onde guardá-lo antes de vendê-lo para a pessoa que o encomendara. Assim, resolve ligar para um grande amigo seu, Henrique, e após contar toda sua empreitada, pede-lhe que ceda a garagem de sua casa para que possa guardar o veículo, ao menos por aquela noite. Como Henrique aceita ajudá-lo, Raimundo estaciona o carro na casa do amigo. Ao raiar do dia, Raimundo parte com o veículo, que seria levado para o comprador.
Considerando as informações contidas no texto responda, justificadamente, aos itens a seguir. A) Raimundo e Henrique agiram em concurso de agentes? (Valor: 0,75)B) Qual o delito praticado por Henrique? (Valor: 0,50)
GABARITO COMENTADO
A. Não há concurso de agentes, pois o auxílio foi proposto após a consumação do crime de furto. Assim, não estão presentes os requisitos necessários à configuração do concurso de agentes, mormente liame subjetivo e identidade da infração penal.
B. Favorecimento real (Art. 349, do CP).Obs.: Respostas contraditórias não serão pontuadas.
QUESTÃO 03
Wilson, extremamente embriagado, discute com seu amigo Junior na calçada de um bar já vazio pelo avançado da hora. A discussão torna-se acalorada e, com intenção de matar, Wilson desfere quinze facadas em Junior, todas na altura do abdômen. Todavia, ao ver o amigo gritando de dor e esvaindo-se em sangue, Wilson, desesperado, pega um taxi para levar Junior ao hospital. Lá chegando, o socorro é eficiente e Junior consegue recuperar-se das graves lesões sofridas.
Analise o caso narrado e, com base apenas nas informações dadas, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.
A) É cabível responsabilizar Wilson por tentativa de homicídio? (Valor: 0,65)
B) Caso Junior, mesmo tendo sido socorrido, não se recuperasse das lesões e viesse a falecer no dia seguinte aos fatos, qual seria a responsabilidade jurídico-penal de Wilson? (Valor: 0,60)
GABARITO COMENTADO
A. Não, pois Wilson será beneficiado pelo instituto do arrependimento eficaz, previsto na parte final do Art. 15 do Código Penal. Assim, somente responderá pelos atos praticados, no caso, as lesões corporais graves sofridas por Júnior.
Obs.: A mera indicação de artigo legal não garante atribuição de pontos. Também não serão pontuadas respostas contraditórias.
B. Nesse caso, como não houve eficácia no arrependimento, o que é exigido pelo Art. 15, do Código Penal, Wilson deverá responder pelo resultado morte, ou seja, deverá responder pelo delito de homicídio doloso consumado.
QUESTÃO 04
Mário está sendo processado por tentativa de homicídio uma vez que injetou substância venenosa em Luciano, com o objetivo de matá-lo. No curso do processo, uma amostra da referida substância foi recolhida para análise e enviada ao Instituto de Criminalística, ficando comprovado que, pelas condições de armazenamento e acondicionamento, a substância não fora hábil para produzir os efeitos a que estava destinada. Mesmo assim, arguindo que o magistrado não estava adstrito ao laudo, o Ministério Público pugnou pela pronúncia de Mário nos exatos termos da denúncia.
Com base apenas nos fatos apresentados, responda justificadamente.A) O magistrado deveria pronunciar Mário, impronunciá-lo ou absolvê-lo sumariamente? (Valor: 0,65)
B) Caso Mário fosse pronunciado, qual seria o recurso cabível, o prazo de interposição e a quem deveria ser endereçado? (Valor: 0,60)
GABARITO COMENTADO
A) Deveria absolvê-lo sumariamente, por força do Art. 415, III, do CPP. O caso narrado não constitui crime, sendo hipótese de crime impossível.
B) É cabível recurso em sentido estrito (Art. 581, IV, do CPP); deve ser interposto no prazo de cinco dias (Art. 586 CPP); a petição de interposição deve ser endereçada ao juiz a quo e as razões deverão ser endereçadas ao Tribunal de Justiça.
QUESTÃO 05
Laura, empresária do ramo de festas e eventos, foi denunciada diretamente no Tribunal de Justiça do Estado “X”, pela prática do delito descrito no Art. 333 do CP (corrupção ativa). Na mesma inicial acusatória, o Procurador Geral de Justiça imputou a Lucas, Promotor de Justiça estadual, a prática da conduta descrita no Art. 317 do CP (corrupção passiva).
A defesa de Laura, então, impetrou habeas corpus ao argumento de que estariam sendo violados os princípios do juiz natural, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa; arguiu, ainda, que estaria ocorrendo supressão de instância, o que não se poderia permitir.
Nesse sentido, considerando apenas os dados fornecidos, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir. A) Os argumentos da defesa de Laura procedem? (Valor: 0,75)B) Laura possui direito ao duplo grau de jurisdição? (Valor: 0,50)
GABARITO COMENTADO
A. Não procedem os argumentos da defesa de Laura, com base no Verbete 704, da Súmula do STF. O fato de Laura ser julgada diretamente pelo Tribunal de Justiça não lhe tira a possibilidade de manejar outros recursos. Assim, não há qualquer ferimento ao devido processo legal, nem ao contraditório e muito menos à ampla defesa. Por fim, também não há que se falar em desrespeito ao princípio do juiz natural, já que a atração por conexão ou continência não configura criação de tribunal de exceção, sendo certo que não se pode confundir “juiz natural” com “juízo de primeiro grau”.
B. Laura não possui direito ao duplo grau de jurisdição. O princípio do duplo grau assegura o julgamento da causa em primeira instância e a revisão da sentença por órgão diverso. O recurso que traduz por excelência o princípio do duplo grau é a apelação, a qual devolve ao Tribunal, para nova análise, toda a matéria de fato e de direito. Como Laura será julgada diretamente pelo Tribunal de Justiça, não terá direito ao duplo grau de jurisdição, mas isso não a impede de exercer o contraditório e nem a ampla defesa, estando-lhe assegurado, assim, o devido processo legal.
Obs.: Não serão pontuadas respostas contraditórias.
QUESTÃO 06

Visando abrir um restaurante, José pede vinte mil reais emprestados a Caio, assinando, como garantia, uma nota promissória no aludido valor, com vencimento para o dia 15 de maio de 2010. Na data mencionada, não tendo havido pagamento, Caio telefona para José e, educadamente, cobra a dívida, obtendo do devedor a promessa de que o valor seria pago em uma semana.
Findo o prazo, Caio novamente contata José, que, desta vez, afirma estar sem dinheiro, pois o restaurante não apresentara o lucro esperado. Indignado, Caio comparece no dia 24 de maio de 2010 ao restaurante e, mostrando para José uma pistola que trazia consigo, afirma que a dívida deveria ser saldada imediatamente, pois, do contrário, José pagaria com a própria vida. Aterrorizado, José entra no restaurante e telefona para a polícia, que, entretanto, não encontra Caio quando chega ao local.
Os fatos acima referidos foram levados ao conhecimento do delegado de polícia da localidade, que instaurou inquérito policial para apurar as circunstâncias do ocorrido. Ao final da investigação, tendo Caio confirmado a ocorrência dos eventos em sua integralidade, o Ministério Público o denuncia pela prática do crime de extorsão qualificada pelo emprego de arma de fogo. Recebida a inicial pelo juízo da 5a Vara Criminal, o réu é citado no dia 18 de janeiro de 2011.
Procurado apenas por Caio para representá-lo na ação penal instaurada, sabendo-se que Joaquim e Manoel presenciaram os telefonemas de Caio cobrando a dívida vencida, e com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija, no último dia do prazo, a peça cabível, invocando todos os argumentos em favor de seu constituinte.
GABARITO COMENTADO
O examinando deverá redigir uma resposta à acusação, prevista no artigo 396 do CPP (e/ou art. 396-A do CPP), a ser endereçada ao juízo da 5a Vara Criminal e apresentada no dia 28 de janeiro de 2011.
Na referida peça, o examinando deverá demonstrar que a conduta descrita pelo Ministério Público caracterizaria apenas o crime de exercício arbitrário das próprias razões, previsto no artigo 345 do CP, uma vez que para a configuração do delito de extorsão seria imprescindível que a vantagem fosse indevida, sendo a conduta, com relação ao delito do artigo 158, atípica.
Outrossim, o examinando deverá esclarecer que o Ministério Público não é parte legítima para figurar no polo ativo de processo criminal pelo delito de exercício arbitrário das próprias razões, pois não houve emprego de violência, sendo este persequível por ação penal privada.
Em razão disso, o examinando deverá afirmar que caberia a José ajuizar queixa-crime dentro do prazo decadencial de seis meses, contados a partir do dia 24 de maio de 2010 e, uma vez não tendo sido oferecida a queixa-crime até o dia 23 de novembro de 2010, incidiu sobre o feito o fenômeno da decadência, restando extinta a punibilidade de Caio.
Ao final, o examinando deverá pedir a absolvição sumária de Caio, com fundamento no artigo 397, III (pela atipicidade do delito de extorsão) e IV (pela incidência da decadência), do CPP. Além de tais pedidos, com base no princípio da eventualidade, deverá requerer a produção de prova testemunhal, com a oitiva de Joaquim e Manoel.
Por fim, o examinando deverá apontar em sua peça a data de 28 de janeiro de 2011.
Não sendo observada a correta divisão das partes, indicação de local, data e assinatura, será impossível atribuição dos pontos relativos à estrutura.
QUESTÃO 07
Em determinada ação fiscal procedida pela Receita Federal, ficou constatado que Lucile não fez constar quaisquer rendimentos nas declarações apresentadas pela sua empresa nos anos de 2009, 2010 e 2011, omitindo operações em documentos e livros exigidos pela lei fiscal.
Iniciado processo administrativo de lançamento, mas antes de seu término, o Ministério Público entendeu por bem oferecer denúncia contra Lucile pela prática do delito descrito no art. 1o, inciso II da Lei n. 8.137/90, combinado com o art. 71 do Código Penal. A inicial acusatória foi recebida e a defesa intimada a apresentar resposta à acusação.
Atento(a) ao caso apresentado, bem como à orientação dominante do STF sobre o tema, responda, fundamentadamente, o que pode ser alegado em favor de Lucile. (Valor: 1,25)
GABARITO COMENTADO
O examinando deverá desenvolver raciocínio acerca da atipicidade do fato, eis que, conforme entendimento pacificado no STF, não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1o, incisos I a IV, da Lei n. 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo (verbete 24 da Súmula Vinculante do STF).
Diante da inexistência de crime, em sede de resposta à acusação, deve-se alegar hipótese de absolvição sumária, conforme art. 397, III do CPP.
Por fim, cumpre destacar que em virtude de o enunciado da questão ser expresso ao exigir fundamentação na resposta, a mera transcrição da referida Súmula (seja de forma direta, seja de forma indireta, dos termos da frase), bem como a mera indicação do art. 397 do CPP, não autorizam a pontuação integral.
QUESTÃO 08
Abel e Felipe observavam diariamente um restaurante com a finalidade de cometer um crime. Sabendo que poderiam obter alguma vantagem sobre os clientes que o frequentavam, Abel e Felipe, sem qualquer combinação prévia, conseguiram, cada um, uniformes semelhantes aos utilizados pelos manobristas de tal restaurante.
No início da tarde, aproveitando a oportunidade em que não havia nenhum funcionário no local, a dupla, vestindo os uniformes de manobristas, permaneceu à espera de suas vítimas, mas, agindo de modo separado.
Tércio, o primeiro cliente, ao chegar ao restaurante, iludido por Abel, entrega de forma voluntária a chave de seu carro. Abel, ao invés de conduzir o veículo para o estacionamento, evade-se do local. Narcísio, o segundo cliente, chega ao restaurante e não entrega a chave de seu carro, mas Felipe a subtrai sem que ele o percebesse. Felipe também se evade do local.
Empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso, responda às questões a seguir.
A) Qual a responsabilidade jurídico-penal de Abel ao praticar tal conduta? (responda motivando sua imputação) (Valor: 0,65)
B) Qual a responsabilidade jurídico-penal de Felipe ao praticar tal conduta? (responda motivando sua imputação) (Valor: 0,60)
GABARITO COMENTADO
Relativamente ao item “A” da questão, o examinando, para garantir a atribuição integral dos pontos respectivos, deverá desenvolver raciocínio no sentido de que Abel cometeu apenas o crime de estelionato, previsto no art. 171 do Código Penal brasileiro.
Outrossim, deverá indicar que o crime caracteriza-se pela fraude que é usada como meio de obter o consentimento da vítima que, iludida, entrega voluntariamente a chave de seu carro para Abel.
No que tange ao item “B”, deverá ser desenvolvido raciocínio no sentido de que Felipe cometeu apenas o delito de furto simples, capitulado no artigo 155 caput do Código Penal.
Saliente-se que, no caso em tela, não serão admitidas respostas que indicarem a incidência de qualificadoras, uma vez que, apesar de o agente ter se vestido de manobrista, tal fato em nada interferiu na subtração do bem.
Tampouco se pode falar em crime cometido mediante destreza, haja vista o fato de que, no enunciado da questão, não há qualquer referência ao fato de Felipe possuir habilidades especiais que pudessem fazer com que efetivasse a subtração sem que a vítima percebesse.
Assim sendo, o delito por ele praticado foi, apenas, o de furto na forma simples, descrito no caput do artigo 155 do Código Penal.
Ainda no item “B”, de maneira alternativa e com o fim de privilegiar demonstração de conhecimento jurídico, será pontuado o examinando esclarecer somente estar presente o núcleo do tipo e, por conta disso, a conduta de Felipe apenas se enquadraria no caput do artigo citado.
Por fim, em nenhum dos itens poderá ser atribuída pontuação pela mera explicação da atuação dos agentes se essa estiver dissociada da correta tipificação do crime.
QUESTÃO 09
João e José foram denunciados pela prática da conduta descrita no art. 316 do CP (concussão). Durante a instrução, percebeu-se que os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo que efetivamente teria ocorrido, razão pela qual, ao cabo da instrução criminal e após a respectiva apresentação de memoriais pelas partes, apurou-se que a conduta típica adequada seria aquela descrita no art. 317 do CP (corrupção passiva). O magistrado, então, fez remessa dos autos ao Ministério Público para fins de aditamento da denúncia, com a nova capitulação dos fatos. Nesse sentido, atento(a) ao caso narrado e considerando apenas as informações contidas no texto, responda fundamentadamente, aos itens a seguir.
A) Estamos diante de hipótese de mutatio libelli ou de emendatio libelli? Qual dispositivo legal deve ser aplicado? (Valor: 0,50)
B) Por que o próprio juiz, na sentença, não poderia dar a nova capitulação e, com base nela, condenar os réus?
(Valor: 0,50)
C) É possível que o Tribunal de Justiça de determinado estado da federação, ao analisar recurso de apelação, proceda à mutatio libelli? (Valor: 0,25)
GABARITO COMENTADO
Para garantir pontuação à questão, o examinando deverá, no item “A”, responder, nos termos do questionado, que a hipótese tratada é de mutatio libelli, instituto descrito no art. 384 do CPP.
Não serão admitidas respostas que tragam emendatio libelli, tendo em vista que o enunciado da questão é claro ao dispor que “os fatos narrados na denúncia não corresponderiam àquilo que efetivamente teria ocorrido”. Tal expressão, por si só, ainda afastaria a incidência do disposto no art. 383, do CPP, uma vez que aquele dispositivo legal traz explicitamente restrição à sua utilização para hipóteses em que não ocorra modificação na “descrição do fato contida na denúncia ou queixa”.
Quanto ao item “B”, para garantir a pontuação pertinente, o examinando deverá responder que o juiz não poderia, na sentença, dar nova capitulação (e com base nela condenar os réus) porque deve obediência aos princípios da imparcialidade e inércia da jurisdição.
De maneira alternativa e com o fim de privilegiar a demonstração de conhecimento jurídico, será admitida resposta no sentido de que tal conduta, por parte do magistrado, feriria o sistema/princípio acusatório ou, ainda, no sentido de que tal conduta feriria o princípio da correlação/congruência entre acusação e sentença.
Ressalte-se que no tocante ao item “B” a questão solicita análise acerca da conduta do magistrado que, na sentença, daria nova capitulação aos fatos em decorrência de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação.
Nesse sentido, cabe destacar que à luz do sistema acusatório adotado pela Constituição da República Federativa do Brasil, o julgador deve ser imparcial e, por isso, suas decisões devem estar balizadas pelo contexto fático descrito na peça acusatória (princípio da correlação entre acusação e sentença).
Assim, caso o magistrado viesse a condenar os réus com fundamento em fatos não narrados na denúncia – tal como descrito no enunciado - não só estaria substituindo-se ao acusador (a quem pertence a atribuição de determinar quais fatos serão imputados aos acusados), mas também estaria violando as garantias do contraditório e ampla defesa dos réus, uma vez que lhes teria subtraído a possibilidade de debater as eventuais provas de tais fatos.
Por fim, para garantir a pontuação relativa ao item “C”, o examinando deverá responder que NÃO é possível que o Tribunal de Justiça, ao analisar o recurso de apelação, proceda à mutatio libelli pois, nos termos do verbete 453 da Súmula do STF, verbis: “não se aplicam à segunda instância o art. 384 (...).”.
Tal conclusão, no item “C”, decorre do reconhecimento de que, advindo inovação no contexto fático que envolve a conduta imputada ao réu no curso da instrução, não pode haver julgamento com base nesse novo contexto fático antes que as partes possam exercer o contraditório em sua plenitude.
Nessa esteira, cabe destacar que a sede própria do contraditório acerca dos fatos e das provas é o primeiro grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância. Tomadas essas duas premissas, alcança-se a conclusão de que eventual modificação da definição jurídica do fato decorrente de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação não pode ser realizada diretamente pelo segundo grau de jurisdição.
QUESTÃO 10
João foi denunciado pela prática do delito previsto no art. 299 caput e parágrafo único do Código Penal. A inicial acusatória foi recebida em 30/10/2000 e o processo teve seu curso normal. A sentença penal, publicada em 29/07/2005, condenou o réu à pena de 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime semi-aberto, mais pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa. Irresignada, somente a defesa interpôs apelação. Todavia, o Egrégio Tribunal de Justiça negou provimento ao apelo, ao argumento de que não haveria que se falar em extinção da punibilidade pela prescrição, haja vista o fato de que o réu era reincidente, circunstância devidamente comprovada mediante certidão cartorária juntada aos autos.
Nesse sentido, considerando apenas os dados narrados no enunciado, responda aos itens a seguir.
A) Está extinta a punibilidade do réu pela prescrição? Em caso positivo, indique a espécie; em caso negativo, indique o motivo. (Valor: 0,75)
B) O disposto no art. 110 caput do CP é aplicável ao caso narrado? (Valor: 0,50)
GABARITO COMENTADO
A questão visa obter do examinando o conhecimento acerca da extinção da punibilidade pela prescrição. Desta forma, para obtenção da pontuação relativa ao item “A”, o examinando deve indicar que a punibilidade do réu está extinta com base na prescrição da pretensão punitiva retroativa, pois entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória transcorreu lapso de tempo superior a quatro anos.
Cumpre destacar que tal modalidade de prescrição é a única que se coaduna com o caso apresentado pelos seguintes fatos:
i. tendo havido o trânsito em julgado para a acusação (pois somente a defesa interpôs recurso de apelação), deve ser considerado o quantum de pena aplicada por ocasião da sentença condenatória, ou seja, 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, não podendo esta ser majorada por força do princípio que impede a sua reforma para pior (non reformatio in pejus). Assim, o prazo prescricional é de 4 (quatro) anos, conforme artigos 107, inciso IV, c/c 109, inciso V e 110, § 1o, todos do CP;
ii. considerando apenas os dados narrados no enunciado, os únicos marcos interruptivos da prescrição, segundo o art. 117 do CP, são o recebimento da denúncia (30/10/2000) e a publicação da sentença penal condenatória (29/07/2005).
Assim, com base na pena aplicada na sentença (com trânsito em julgado para o Ministério Público), retroagindo- se ao primeiro marco interruptivo narrado pela questão (recebimento da denúncia), observa-se que entre este e o segundo marco interruptivo (publicação da sentença condenatória), transcorreu lapso temporal maior do que quatro anos, com a consequente prescrição da pretensão punitiva.
Ressalte-se que justamente pela objetividade do item “A”, e por não ter havido o trânsito em julgado para ambas as partes, a indicação de espécie distinta de prescrição, que não a punitiva, macula a integralidade da resposta e impede a atribuição de pontuação. Não há que se falar, no caso em comento, em prescrição da pretensão executória.
Em relação ao item “B” o examinando, para fazer jus à pontuação respectiva, deve responder que o disposto no art. 110, caput, do CP não é aplicável ao caso narrado, pois tal artigo somente é aplicado em se tratando de prescrição da pretensão executória. Como o caso apresentado demonstra a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva, não há que se falar no aumento de 1/3 (um terço) no prazo prescricional. Este entendimento é corroborado pelo verbete 220 da Súmula do STJ ao afirmar que “a reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.
QUESTÃO 11
Grávida de nove meses, Ana entra em trabalho de parto, vindo dar à luz um menino saudável, o qual é imediatamente colocado em seu colo. Ao ter o recém-nascido em suas mãos, Ana é tomada por extremo furor, bradando aos gritos que seu filho era um “monstro horrível que não saiu de mim” e bate por seguidas vezes a cabeça da criança na parede do quarto do hospital, vitimando-a fatalmente. Após ser dominada pelos funcionários do hospital, Ana é presa em flagrante delito.
Durante a fase de inquérito policial, foi realizado exame médico-legal, o qual atestou que Ana agira sob influência de estado puerperal. Posteriormente, foi denunciada, com base nas provas colhidas na fase inquisitorial, sobretudo o laudo do expert, perante a 1a Vara Criminal/Tribunal do Júri pela prática do crime de homicídio triplamente qualificado, haja vista ter sustentado o Parquet que Ana fora movida por motivo fútil, empregara meio cruel para a consecução do ato criminoso, além de se utilizar de recurso que tornou impossível a defesa da vítima. Em sede de Alegações Finais Orais, o Promotor de Justiça reiterou os argumentos da denúncia, sustentando que Ana teria agido impelida por motivo fútil ao decidir matar seu filho em razão de tê-lo achado feio e teria empregado meio cruel ao bater a cabeça do bebê repetidas vezes contra a parede, além de impossibilitar a defesa da vítima, incapaz, em razão da idade, de defender-se.
A Defensoria Pública, por sua vez, alegou que a ré não teria praticado o fato e, alternativamente, se o tivesse feito, não possuiria plena capacidade de autodeterminação, sendo inimputável. Ao proferir a sentença, o magistrado competente entendeu por bem absolver sumariamente a ré em razão de inimputabilidade, pois, ao tempo da ação, não seria ela inteiramente capaz de se autodeterminar em consequência da influência do estado puerperal. Tendo sido intimado o Ministério Público da decisão, em 11 de janeiro de 2011, o prazo recursal transcorreu in albis sem manifestação do Parquet.
Em relação ao caso acima, você, na condição de advogado(a), é procurado pelo pai da vítima, em 20 de janeiro de 2011, para habilitar-se como assistente da acusação e impugnar a decisão.
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça cabível, sustentando, para tanto, as teses jurídicas pertinentes, datando do último dia do prazo. (valor: 5,00)
GABARITO COMENTADO
O candidato deve redigir uma apelação, com fundamento no artigo 593, I CPP (OU art. 416 CPP) c/c 598 do CPP.
A petição de interposição deve ser endereçada ao Juiz de Direito da 1a Vara Criminal/Tribunal do Júri.
Na petição de interposição da apelação, o candidato deverá requerer a habilitação do pai da criança como assistente de acusação.
Acerca desse item, cumpre salientar que será atribuída a pontuação respectiva se o pedido de habilitação tiver sido feito em peça apartada.
Todavia, também resta decidido que não será pontuado o item relativo à estrutura se o indivíduo que solicitar a habilitação como assistente de acusação não possuir legitimidade para tanto.
Por fim, a petição de interposição deverá ser datada de 31/01/2011 OU 01/02/2011.
No tocante às razões recursais, as mesmas deverão ser dirigidas ao Tribunal de Justiça.
Nelas, o examinando deve argumentar que o juiz não poderia ter absolvido sumariamente a ré em razão da inimputabilidade, porque o Código de Processo Penal, em seu artigo 415, parágrafo único, veda expressamente tal providência, salvo quando for a única tese defensiva, o que não é o caso, haja vista que a defesa também apresentou outra tese, qual seja, a de negativa de autoria.
Também deverá argumentar que a incidência do estado puerperal não é considerada causa excludente de culpabilidade fundada na ausência de capacidade de autodeterminação. O estado puerperal configura elementar do tipo de infanticídio e não causa excludente de imputabilidade/culpabilidade.
As duas teses principais da peça, acima citadas, somente serão passíveis de pontuação integral se preenchidas em sua totalidade, descabendo falar-se em respostas implícitas.
Do mesmo modo, deverá o examinando, em seus pedidos, requerer a reforma da decisão com o fim de se pronunciar a ré pela prática do delito de infanticídio, de modo que seja ela levada a julgamento pelo Tribunal do Júri.
Ao final, também deverá datar corretamente as razões recursais.
Acerca desse ponto, tendo em vista o prazo de três dias disposto no art. 600, § 1o, do CPP, serão aceitas as seguintes datas nas razões: 31/01/2011; 01/02/2011; 02/02/2011; 03/02/2011 e 04/02/2011 (essa última data só será aceita se a petição de interposição tiver sido datada de 01/02/2011).
Cumpre salientar que tais datas justificam-se pelo seguinte: o dia 16 de janeiro de 2011 (termo final do prazo recursal para o Ministério Público) foi domingo e por isso o termo inicial do assistente de acusação será dia 18 de janeiro de 2011 (terça-feira), terminando em 1o de fevereiro de 2011. Todavia, considerando que nem todos os examinandos tiveram acesso ao calendário no momento da prova, permitiu-se a contagem dos dias corridos e, nesse caso, o prazo final para a interposição da apelação seria dia 31 de janeiro de 2011.
Por fim, ainda no tocante ao item da data correta, somente fará jus à respectiva pontuação o examinando que acertar as hipóteses (petição de interposição e razões recursais).
QUESTÃO 12
Ricardo foi denunciado pela prática do delito descrito no art. 1o da lei n. 8.137/90, em concurso material com o crime de falsidade ideológica (art. 299 do CP). Isso porque, conforme narrado na inicial acusatória e confessado pelo réu no interrogatório, obteve, em determinado estado da federação, licenciamento de seu veículo de modo fraudulento, já que indicou endereço falso. Assim agiu porque queria pagar menos tributo, haja vista que a alíquota do IPVA seria menor. Ao cabo da instrução criminal, Ricardo foi condenado nos exatos termos da denúncia, sendo certo que todo o conjunto probatório dos autos era significativo e apontava para a responsabilização do réu. No entanto, atento às particularidades do caso concreto, o magistrado fixou as penas de ambos os delitos no patamar mínimo previsto nos tipos penais, resultando a soma em 03 anos de pena privativa de liberdade.
Como advogado(a) de Ricardo, você deseja recorrer da sentença. Considerando apenas os dados descritos na questão, indique o(s) argumento(s) que melhor atenda(m) aos interesses de seu cliente. (valor: 1.25)
GABARITO COMENTADO
A questão objetiva avaliar o conhecimento acerca dos princípios relativos ao conflito aparente de normas. Há de se levar em consideração que problemáticas não narradas no enunciado não podem ser objeto de exigência. Assim, nos termos da questão, levando em conta apenas os dados fornecidos, o examinando somente fará jus à pontuação integral se desenvolver argumentação lastreada no princípio da consunção (ou princípio da absorção).
Deverá, igualmente, demonstrar conhecimento de que o crime descrito no art. 299 do CP (falsidade ideológica) teria constituído meio para o cometimento do delito-fim (crime contra a ordem tributária – art. 1o da Lei n. 8.137/90), de tal modo que a vinculação entre a falsidade ideológica e o crime contra a ordem tributária permitiria reconhecer, em referido contexto, a preponderância desse último. Consequentemente, Ricardo somente deveria responder pelo delito previsto no art. 1o da Lei n. 8.137/90.
Acerca desse ponto e com o intuito de privilegiar o desenvolvimento do raciocínio, não será cobrado o inciso preciso do mencionado artigo da Lei n. 8.137/90. Todavia, pelo mesmo motivo, eventual resposta que traga apenas a consequência (tipificação da conduta de Ricardo), de maneira isolada e dissociada da correta argumentação e desenvolvimento, não poderá ser pontuada.
Por fim, teses contraditórias no desenvolvimento da aplicação do princípio da consunção maculam a integralidade da questão. Todavia, com o fim de privilegiar a demonstração de conhecimento correto, não serão descontados pontos pela alegação de teses subsidiárias, ainda que inaplicáveis ao caso, desde que não configurem respostas contraditórias.
QUESTÃO 13
Larissa, senhora aposentada de 60 anos, estava na rodoviária de sua cidade quando foi abordada por um jovem simpático e bem vestido. O jovem pediu-lhe que levasse para a cidade de destino, uma caixa de medicamentos para um primo, que padecia de grave enfermidade. Inocente, e seguindo seus preceitos religiosos, a Sra. Larissa atende ao rapaz: pega a caixa, entra no ônibus e segue viagem. Chegando ao local da entrega, a senhora é abordada por policiais que, ao abrirem a caixa de remédios, verificam a existência de 250 gramas de cocaína em seu interior. Atualmente, Larissa está sendo processada pelo crime de tráfico de entorpecente, previsto no art. 33 da lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006.
Considerando a situação acima descrita e empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente, responda: qual a tese defensiva aplicável à Larissa? (valor: 1,25)
GABARITO COMENTADO
A questão pretende buscar do examinando conhecimento acerca do instituto do erro de tipo essencial, inclusive para diferenciá-lo das demais modalidades de erro. Assim, para garantir pontuação, a resposta deverá trazer as seguintes informações: a tese defensiva aplicável é a de que Larissa agiu em erro de tipo essencial incriminador, instituto descrito no art. 20 caput do CP, pois desconhecia circunstância elementar descrita em tipo penal incriminador. Ausente o elemento típico, qual seja, o fato de estar transportando drogas, faz com que, nos termos do dispositivo legal, se exclua o dolo, mas permita-se a punição por crime culposo e, como o dispositivo legal do art. 33 da Lei n. 11.343/06 não admite a modalidade culposa, o fato se tornaria atípico.
Ressalte-se que levando em conta que o Exame de Ordem busca o conhecimento técnico e acadêmico dos examinandos, não serão pontuadas respostas que tragam teses contraditórias. Assim, a resposta indicativa de qualquer outra espécie de erro (seja acidental, de tipo permissivo ou de proibição) implica na impossibilidade de pontuação, estando, a questão, maculada em sua integralidade. Entende-se por tese contraditória aquelas que elencam diversas modalidades de erro, ainda que uma delas seja a correta.
Também com o fim de privilegiar o raciocínio e a demonstração de conhecimento, a mera indicação da consequência correta (atipicidade do fato), dissociada da argumentação pertinente e identificação do instituto aplicável ao caso, não será passível de pontuação. Do mesmo modo, não será pontuada a mera indicação do dispositivo legal, qual seja, o art. 20 caput do CP.
QUESTÃO 14
Há muito tempo Maria encontra-se deprimida, nutrindo desejos de acabar com a própria vida. João, sabedor dessa condição, e querendo a morte de Maria, resolve instigá-la a se matar. Pondo seu plano em prática, João visita Maria todos os dias e, quando ela toca no assunto de não tem mais razão para viver, que deseja se matar, pois a vida não faz mais sentido, João a estimula e a encoraja a pular pela janela.
Um belo dia, logo após ser instigada por João, Maria salta pela janela de seu apartamento e, por pura sorte, sofre apenas alguns arranhões, não sofrendo qualquer ferimento grave. Considerando apenas os fatos apresentados, responda, de forma justificada, aos seguintes questionamentos:
A) João cometeu algum crime? (valor: 0,65)
B) Caso Maria viesse a sofrer lesões corporais de natureza grave em decorrência da queda, a condição jurídica de João seria alterada? (valor: 0,60)
GABARITO COMENTADO
O examinando deve responder, no item ‘A’, que João não cometeu qualquer crime, pois o delito descrito no art. 122 do CP, o qual prevê a conduta de instigação, auxílio ou induzimento ao suicídio, não admite a forma tentada (art. 14, II do CP), sendo certo que tal delito somente se consuma com a ocorrência de lesões corporais graves ou morte. Nesse sentido, como Maria teve apenas alguns arranhões, não houve crime.
Todavia, com o fim de privilegiar a demonstração de conhecimento doutrinário, será aceita como resposta correta ao item ‘A’, a indicação de que haveria crime, mas que o fato não seria punível por faltar condição objetiva de punibilidade. Nesse caso específico, o examinando deverá demonstrar conhecimento sobre o conceito analítico de crime (fato típico, antijurídico e culpável), indicando que a punibilidade não o integra.
Ainda quanto ao item ‘A’, é indispensável a indicação do dispositivo em análise. Portanto, afirmações vagas e genéricas não são passíveis de pontuação.
Já no item ‘B’, o examinando deveria responder que ante a ocorrência de lesões corporais de natureza grave em Maria, a condição jurídica de João seria alterada, passando ele a responder pelo delito previsto no art. 122 do CP na modalidade consumada.
Ressalte-se que levando em consideração a natureza do Exame de Ordem, não será atribuída pontuação para respostas com teses contraditórias, ou mesmo sugestiva de delito na modalidade tentada. Ademais, considera-se errada a resposta indicativa de configuração de concurso de crimes ou a fundamentação isolada.
Pelo mesmo motivo exposto no item ‘A’ (impossibilidade de consideração de afirmações vagas ou genéricas), também não é passível de pontuação a resposta, no item ‘B’, que não indique, de maneira expressa, o artigo legal a que se refere a questão. Desse modo, a mera referência à pena de reclusão de 1 a 3 anos, ou seja, a mera indicação do preceito secundário do tipo, dissociada da tipificação da conduta, também não é pontuada.
Por fim, também não será pontuada a simples transcrição do artigo, dissociada da demonstração de conhecimento doutrinário.
QUESTÃO 15
Maurício, jovem de classe alta, rebelde e sem escrúpulos, começa a namorar Joana, menina de boa família, de classe menos favorecida e moradora de área de risco em uma das maiores comunidades do Brasil. No dia do aniversário de 18 anos de Joana, Maurício resolve convidá-la para jantar num dos restaurantes mais caros da cidade e, posteriormente, leva-a para conhecer a suíte presidencial de um hotel considerado um dos mais luxuosos do mundo, onde passa a noite com ela. Na manhã seguinte, Maurício e Joana resolvem permanecer por mais dois dias. Ao final da estada, Mauricio contabiliza os gastos daqueles dias de prodigalidade, apurando o total de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais). Todos os pagamentos foram realizados em espécie, haja vista que, na noite anterior, Maurício havia trocado com sua mãe um cheque de R$20.000,00 (vinte mil reais) por dinheiro em espécie, cheque que Maurício sabia, de antemão, não possuir fundos. Considerando apenas os fatos descritos, responda, de forma justificada, os questionamentos a seguir.
A) Maurício e Joana cometeram algum crime? Justifique sua resposta e, caso seja positiva, tipifique as condutas atribuídas a cada um dos personagens, desenvolvendo a tese de defesa. (valor: 0,70)
B) Caso Maurício tivesse invadido a casa de sua mãe com uma pistola de brinquedo e a ameaçado, a fim de conseguir a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), sua situação jurídica seria diferente? Justifique. (valor: 0,55)
GABARITO COMENTADO
Para garantir pontuação, o examinando deveria, no item ‘A’, deixar expresso que Joana não cometeu qualquer crime porque não houve sequer conduta de sua parte. Cabe ressaltar que somente será aceita, como fundamento para essa hipótese, a ausência de conduta, levando em consideração o conhecimento teórico exigido no Exame de Ordem.
Assim, descabe analisar a existência de elemento subjetivo (dolo ou culpa), ilicitude ou culpabilidade, pois tais somente seriam apreciados quando houvesse conduta. Consequentemente, a resposta que trouxer apenas tal análise (sem mencionar a conduta) não será pontuada no item respectivo.
Ainda no tocante ao item ‘A’, o examinando deverá indicar que Maurício, diferentemente de Joana, cometeu crime, qual seja, estelionato (OU que teria praticado a conduta descrita no art. 171 caput do CP), mas que poderia alegar em sua defesa a escusa absolutória prevista no art. 181, II do CP.
Sobre esse ponto, não será passível de pontuação a mera indicação do dispositivo legal, dissociada da argumentação exigida.
De igual modo, não será pontuada nenhuma outra modalidade de estelionato senão aquela descrita no caput do art. 171 do CP. Ressalte-se que dados não descritos no enunciado não podem ser presumidos pelos examinandos.
Também não será passível de pontuação a indicação genérica do art. 181 do CP, sem a especificação do inciso adequado ou de argumentação pertinente ao inciso.
Ademais, aplicação da escusa absolutória não conduz à atipicidade da conduta. A conduta continua típica, ilícita e culpável, havendo apenas opção legislativa pela não imposição de sanção de natureza penal, embora a sentença possa produzir efeitos civis.
Em relação ao item ‘B’, a atribuição de pontos estaria condicionada à expressa argumentação no sentido de que a condição jurídica de Maurício seria alterada na medida em que a isenção de pena prevista no Código Penal não se aplica aos crimes de roubo (OU à prática da conduta descrita no art. 157 caput do CP), nos termos do art.183, I do CP. Portanto, Maurício seria processado e apenado pelo crime cometido.
Cumpre salientar que a mera indicação de artigo legal, dissociada da correta argumentação (em qualquer um dos itens), não pode ser pontuada. De igual modo, a mera indicação, no item ‘B’, de que não haveria isenção de pena (ou de que não se aplicaria o art. 181, II do CP por força do disposto no artigo 183, I, do CP), sem a correta tipificação da conduta, não é passível de pontuação.
Além disso, levando em conta que o delito de roubo não se confunde com a extorsão, não será admitida fungibilidade entre as condutas de forma a se considerar qualquer das duas como a prática empreendida por Maurício.
Por fim, não poderá ser considerada correta a resposta que imponha a causa de aumento de pena prevista no parágrafo segundo, inciso I, do artigo 157 do CP. Isso porque a controvérsia acerca da incidência da referida causa de aumento quanto ao uso de arma de brinquedo foi suficientemente solucionada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, que, em 2001, cancelou o verbete sumular n. 174, no julgamento do RESP 213.054-SP.
QUESTÃO 16
No dia 10 de março de 2011, após ingerir um litro de vinho na sede de sua fazenda, José Alves pegou seu automóvel e passou a conduzi-lo ao longo da estrada que tangencia sua propriedade rural. Após percorrer cerca de dois quilômetros na estrada absolutamente deserta, José Alves foi surpreendido por uma equipe da Polícia Militar que lá estava a fim de procurar um indivíduo foragido do presídio da localidade. Abordado pelos policiais, José Alves saiu de seu veículo trôpego e exalando forte odor de álcool, oportunidade em que, de maneira incisiva, os policiais lhe compeliram a realizar um teste de alcoolemia em aparelho de ar alveolar. Realizado o teste, foi constatado que José Alves tinha concentração de álcool de um miligrama por litro de ar expelido pelos pulmões, razão pela qual os policiais o conduziram à Unidade de Polícia Judiciária, onde foi lavrado Auto de Prisão em Flagrante pela prática do crime previsto no artigo 306 da Lei 9.503/1997, c/c artigo 2o, inciso II, do Decreto 6.488/2008, sendo-lhe negado no referido Auto de Prisão em Flagrante o direito de entrevistar-se com seus advogados ou com seus familiares.
Dois dias após a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, em razão de José Alves ter permanecido encarcerado na Delegacia de Polícia, você é procurado pela família do preso, sob protestos de que não conseguiam vê-lo e de que o delegado não comunicara o fato ao juízo competente, tampouco à Defensoria Pública.
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, na qualidade de advogado de José Alves, redija a peça cabível, exclusiva de advogado, no que tange à liberdade de seu cliente, questionando, em juízo, eventuais ilegalidades praticadas pela Autoridade Policial, alegando para tanto toda a matéria de direito pertinente ao caso.
(Valor: 5,0)
GABARITO COMENTADO
O examinando deverá redigir uma petição de relaxamento de prisão, fundamentado no art. 5o, LXV, da CRFB/88, ou art. 310, I, do CPP (embora os fatos narrados na questão sejam anteriores à vigência da Lei 12.403/11, a Banca atribuirá a pontuação relativa ao item também ao examinando que indicar o art. 310, I, do CPP como dispositivo legal ensejador ao pedido de relaxamento de prisão. Isso porque estará demonstrada a atualização jurídica acerca do tema), a ser endereçada ao Juiz de Direito da Vara Criminal.
Na petição, deverá argumentar que:
1. O auto de prisão em flagrante é nulo por violação ao direito à não autoincriminação compulsória (princípio do nemo tenetur se detegere) , previsto no art. 5o, LXIII, da CRFB/88 ou art. 8o, 2, “g” do Decreto 678/92.
2. A prova é ilícita em razão da colheita forçada do exame de teor alcoólico, por força do art. 5o, LVI, da CRFB/88 ou art. 157 do CPP.
3. O auto de prisão em flagrante é nulo pela violação à exigência de comunicação da medida à Autoridade Judiciária, ao Ministério Público e à Defensoria Pública dentro de 24 horas, nos termos do art. 306, §1o, do CPP ou art. 5o, LXII, da CRFB/88, ou art. 6o, inciso V, c/c. artigo 185, ambos do CPP (a banca também convencionou aceitar como fundamento o artigo 306,caput, do CPP, considerando-se a legislação da época dos fatos).
4. O auto de prisão é nulo por violação ao direito à comunicação entre o preso e o advogado, bem com familiares, nos termos do art. 5o, LXIII, da CRFB ou art. 7o, III, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil ou art. 8o, 2, “d” do Decreto 678/92;
Ao final, o examinando deverá formular pedido de relaxamento de prisão em razão da nulidade do auto de prisão em flagrante, com a consequente expedição de alvará de soltura.
QUESTÃO 17
Ao chegar a um bar, Caio encontra Tício, um antigo desafeto que, certa vez, o havia ameaçado de morte. Após ingerir meio litro de uísque para tentar criar coragem de abordar Tício, Caio partiu em sua direção com a intenção de cumprimentá-lo. Ao aproximar-se de Tício, Caio observou que seu desafeto bruscamente pôs a mão por debaixo da camisa, momento em que achou que Tício estava prestes a sacar uma arma de fogo para vitimá-lo. Em razão disso, Caio imediatamente muniu-se de uma faca que estava sobre o balcão do bar e desferiu um golpe no abdome de Tício, o qual veio a falecer. Após análise do local por peritos do Instituto de Criminalística da Polícia Civil, descobriu-se que Tício estava tentando apenas pegar o maço de cigarros que estava no cós de sua calça.
Considerando a situação acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Levando-se em conta apenas os dados do enunciado, Caio praticou crime? Em caso positivo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
b) Supondo que, nesse caso, Caio tivesse desferido 35 golpes na barriga de Tício, como deveria ser analisada a sua conduta sob a ótica do Direito Penal? (Valor: 0,6)
GABARITO COMENTADO
a) Não, pois atuou sob o manto de descriminante putativa, instituto previsto no art. 20, parágrafo 1o do CP, uma vez que supôs, com base em fundado receio, estar em situação de legítima defesa. Como se limitou a dar uma facada, a sua reação foi moderada, não havendo que se falar em punição por excesso.
b) Ainda que tenha procurado se defender de agressão que imaginou estar em vias de ocorrer, Caio agiu em excesso doloso, devendo, portanto, responder por homicídio doloso, na forma do artigo 23, parágrafo único, do CP.
QUESTÃO 18
Hugo é inimigo de longa data de José e há muitos anos deseja matá-lo. Para conseguir seu intento, Hugo induz o próprio José a matar Luiz, afirmando falsamente que Luiz estava se insinuando para a esposa de José. Ocorre que Hugo sabia que Luiz é pessoa de pouca paciência e que sempre anda armado. Cego de ódio, José espera Luiz sair do trabalho e, ao vê-lo, corre em direção dele com um facão em punho, mirando na altura da cabeça. Luiz, assustado e sem saber o motivo daquela injusta agressão, rapidamente saca sua arma e atira justamente no coração de José, que morre instantaneamente. Instaurado inquérito policial para apurar as circunstâncias da morte de José, ao final das investigações, o Ministério Público formou sua opinio no seguinte sentido: Luiz deve responder pelo excesso doloso em sua conduta, ou seja, deve responder por homicídio doloso; Hugo por sua vez, deve responder como partícipe de tal homicídio. A denúncia foi oferecida e recebida.
Considerando que você é o advogado de Hugo e Luiz, responda:a) Qual peça deverá ser oferecida, em que prazo e endereçada a quem? (Valor: 0,3) b) Qual a tese defensiva aplicável a Luiz? (Valor: 0,5)c) Qual a tese defensiva aplicável a Hugo? (Valor: 0,45)
GABARITO COMENTADO
a) Resposta à acusação, no prazo de 10 dias (art. 406 do CPP), endereçada ao juiz presidente do Tribunal do Júri.
OU
Habeas Corpus para extinção da ação penal; ação penal autônoma de impugnação que não possui prazo determinado; endereçado ao Tribunal de Justiça Estadual.
b) A tese defensiva aplicada a Luiz é a da legítima defesa real, instituto previsto no art. 25 do CP, cuja natureza é de causa excludente de ilicitude. Não houve excesso, pois a conduta de José (que mirava com o facão na cabeça do Luiz) configurava injusta agressão e claramente atentava contra a vida de Luiz.
c) Hugo não praticou fato típico, pois, de acordo com a Teoria da Acessoriedade Limitada, o partícipe somente poderá ser punido se o agente praticar conduta típica e ilícita, o que não foi o caso, já que Luiz agiu amparado por uma causa excludente de ilicitude, qual seja, legítima defesa (art. 25 do CP).
OU
Não havia liame subjetivo entre Hugo e Luiz, requisito essencial ao concurso de pessoas, razão pela qual Hugo não poderia ser considerado partícipe.
QUESTÃO 19
Caio, Mévio, Tício e José, após se conhecerem em um evento esportivo de sua cidade, resolveram praticar um estelionato em detrimento de um senhor idoso. Logrando êxito em sua empreitada criminosa, os quatro dividiram os lucros e continuaram a vida normal. Ao longo da investigação policial, apurou-se a autoria do delito por meio dos depoimentos de diversas testemunhas que presenciaram a fraude. Em decorrência de tal informação, o promotor de justiça denunciou Caio, Mévio, Tício e José, alegando se tratar de uma quadrilha de estelionatários, tendo requerido a decretação da prisão temporária dos denunciados. Recebida a denúncia, a prisão temporária foi deferida pelo juízo competente.
Com base no relatado acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Qual(is) o(s) meio(s) de se impugnar tal decisão e a quem deverá(ão) ser endereçado(s)? (Valor: 0,6) b) Quais fundamentos deverão ser alegados? (Valor: 0,65)
GABARITO COMENTADO
a) Relaxamento de prisão, endereçado ao juiz de direito estadual. OUHabeas corpus, endereçado ao Tribunal de Justiça estadual.
b) Ilegalidade da prisão, pois não há formação de quadrilha quando a reunião se dá para a prática de apenas um delito. Não há que se falar em formação de quadrilha, subsistindo apenas o delito único de estelionato. Nesse sentido, não se poderia decretar a prisão temporária, pois tal crime não está previsto no rol taxativo indicado no artigo 1o, III, da Lei 7.960/89. Ademais, a prisão temporária é medida exclusiva do inquérito policial, não podendo, em hipótese alguma, ser decretada quando já instaurada a ação penal.
QUESTÃO 20
Carlos Alberto, jovem recém-formado em Economia, foi contratado em janeiro de 2009 pela ABC Investimentos S.A., pessoa jurídica de direito privado que tem como atividade principal a captação de recursos financeiros de terceiros para aplicar no mercado de valores mobiliários, com a função de assistente direto do presidente da companhia, Augusto César. No primeiro mês de trabalho, Carlos Alberto foi informado de que sua função principal seria elaborar relatórios e portfólios da companhia a serem endereçados aos acionistas com o fim de informá-los acerca da situação financeira da ABC. Para tanto, Carlos Alberto baseava-se, exclusivamente, nos dados financeiros a ele fornecidos pelo presidente Augusto César. Em agosto de 2010, foi apurado, em auditoria contábil realizada nas finanças da ABC, que as informações mensalmente enviadas por Carlos Alberto aos acionistas da companhia eram falsas, haja vista que os relatórios alteravam a realidade sobre as finanças da companhia, sonegando informações capazes de revelar que a ABC estava em situação financeira periclitante.
Considerando-se a situação acima descrita, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) É possível identificar qualquer responsabilidade penal de Augusto César? Se sim, qual(is) seria(m) a(s) conduta(s) típica(s) a ele atribuída(s)? (Valor 0,45)
b) Caso Carlos Alberto fosse denunciado por qualquer crime praticado no exercício das suas funções enquanto assistente da presidência da ABC, que argumentos a defesa poderia apresentar para o caso? (Valor: 0,8)
GABARITO COMENTADO
a) Sim, pois Augusto César agiu com dolo preordenado, sendo autor mediato do crime previsto no artigo 6o da Lei 7.492/86.
b) Poderia argumentar que Carlos Alberto não agiu com dolo, uma vez que recebera informações erradas. Agiu, portanto, em hipótese de erro de tipo essencial invencível/escusável, com base no art. 20, caput, OU art. 20, §2o, do CP.
QUESTÃO 21
Em 10 de janeiro de 2007, Eliete foi denunciada pelo Ministério Público pela prática do crime de furto qualificado por abuso de confiança, haja vista ter alegado o Parquet que a denunciada havia se valido da qualidade de empregada doméstica para subtrair, em 20 de dezembro de 2006, a quantia de R$ 50,00 de seu patrão Cláudio, presidente da maior empresa do Brasil no segmento de venda de alimentos no varejo. A denúncia foi recebida em 12 de janeiro de 2007, e, após a instrução criminal, foi proferida, em 10 de dezembro de 2009, sentença penal julgando procedente a pretensão acusatória para condenar Eliete à pena final de dois anos de reclusão, em razão da prática do crime previsto no artigo 155, §2o, inciso IV, do Código Penal. Após a interposição de recurso de apelação exclusivo da defesa, o Tribunal de Justiça entendeu por bem anular toda a instrução criminal, ante a ocorrência de cerceamento de defesa em razão do indeferimento injustificado de uma pergunta formulada a uma testemunha. Novamente realizada a instrução criminal, ficou comprovado que, à época dos fatos, Eliete havia sido contratada por Cláudio havia uma semana e só tinha a obrigação de trabalhar às segundas, quartas e sextas-feiras, de modo que o suposto fato criminoso teria ocorrido no terceiro dia de trabalho da doméstica. Ademais, foi juntada aos autos a comprovação dos rendimentos da vítima, que giravam em torno de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) mensais. Após a apresentação de memoriais pelas partes, em 9 de fevereiro de 2011, foi proferida nova sentença penal condenando Eliete à pena final de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Em suas razões de decidir, assentou o magistrado que a ré possuía circunstâncias judiciais desfavoráveis, uma vez que se reveste de enorme gravidade a prática de crimes em que se abusa da confiança depositada no agente, motivo pelo qual a pena deveria ser distanciada do mínimo. Ao final, converteu a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, consubstanciada na prestação de 8 (oito) horas semanais de serviços comunitários, durante o período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses em instituição a ser definida pelo juízo de execuções penais. Novamente não houve recurso do Ministério Público, e a sentença foi publicada no Diário Eletrônico em 16 de fevereiro de 2011.
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija, na qualidade de advogado de Eliete, com data para o último dia do prazo legal, o recurso cabível à hipótese, invocando todas as questões de direito pertinentes, mesmo que em caráter eventual. (Valor: 5,0)
GABARITO COMENTADO
O candidato deverá redigir uma apelação, com fundamento no artigo 593, I, do CPP, a ser endereçada ao juiz de direito, com razões inclusas endereçadas ao Tribunal de Justiça. Nas razões recursais, o candidato deverá argumentar que a segunda sentença violou a proibição à reformatio in pejus – configurando-se caso de reformatio in pejus indireta –, contida no artigo 617 do CPP, de modo que, em razão do trânsito em julgado para a acusação, a pena não poderia exceder dois anos de reclusão, estando prescrita a pretensão punitiva estatal, na forma do artigo 109, V, do Código Penal, uma vez que, entre o recebimento da denúncia (12/01/2007) e a prolação de sentença válida (09/02/2011), transcorreu lapso superior a quatro anos.
Superada a questão, o candidato deverá argumentar que inexistia relação de confiança a justificar a incidência da qualificadora (Eliete trabalhava para Cláudio fazia uma semana) e que a quantia subtraída era insignificante, sobretudo tomando-se como referência o patrimônio concreto da vítima. Em razão disso, o candidato deverá requerer a reforma da sentença, de modo a se absolver a ré por atipicidade material de sua conduta, ante a incidência do princípio da insignificância/bagatela.
O candidato deve argumentar, ainda, que, na hipótese de não se reformar a sentença para se absolver a ré, ao menos deveria ser reduzida a pena em razão do furto privilegiado, substituindo-se a sanção por multa.
Em razão de tais pedidos, considerando-se a redução de pena, o candidato deveria requerer a substituição da pena privativa de liberdade por multa, bem como a aplicação da suspensão condicional da pena e/ou suspensão condicional do processo.
Deveria ainda o candidato argumentar sobre a impossibilidade do aumento da pena base realizado pelo magistrado sob o fundamento da enorme gravidade nos crimes em que se abusa da confiança depositada, pois tal motivo já foi levado em consideração para qualificar o delito, não podendo a apelante sofrer dupla punição pelo mesmo fato – bis in idem.
Por fim, o candidato deveria requerer um dos pedidos possíveis para a questão apresentada, tais como:
1- absolvição;
2- reconhecimento da reformatio in pejus, com a aplicação da pena em no máximo 2 anos e a consequente prescrição;
3- atipicidade da conduta, tendo em vista a aplicação do princípio da bagatela;
4-  não incidência da qualificadora do abuso da confiança, com a consequente desclassificação para furto simples;
5-  aplicação da Suspensão Condicional do Processo;
6-  não sendo afastada a qualificadora, a incidência do parágrafo 2o do artigo 155 do CP;
7-  a redução da pena pelo reconhecimento do bis in idem e a consequente prescrição;
8-  aplicação de sursis;
9-  inadequação da pena restritiva aplicada, tendo em vista o que dispõe o artigo 46, §3o, do CP.
Alternativamente, o candidato poderá elaborar embargos de declaração, abordando os pontos indicados no gabarito 2.
QUESTÃO 22
Antônio, pai de um jovem hipossuficiente preso em flagrante delito, recebe de um serventuário do Poder Judiciário Estadual a informação de que Jorge, defensor público criminal com atribuição para representar o seu filho, solicitara a quantia de dois mil reais para defendê-lo adequadamente. Indignado, Antônio, sem averiguar a fundo a informação, mas confiando na palavra do serventuário, escreve um texto reproduzindo a acusação e o entrega ao juiz titular da vara criminal em que Jorge funciona como defensor público. Ao tomar conhecimento do ocorrido, Jorge apresenta uma gravação em vídeo da entrevista que fizera com o filho de Antônio, na qual fica evidenciado que jamais solicitara qualquer quantia para defendê-lo, e representa criminalmente pelo fato. O Ministério Público oferece denúncia perante o Juizado Especial Criminal, atribuindo a Antônio o cometimento do crime de calúnia, praticado contra funcionário público em razão de suas funções, nada mencionando acerca dos benefícios previstos na Lei 9.099/95. Designada Audiência de Instrução e Julgamento, recebida a denúncia, ouvidas as testemunhas, interrogado o réu e apresentadas as alegações orais pelo Ministério Público, na qual pugnou pela condenação na forma da inicial, o magistrado concede a palavra a Vossa Senhoria para apresentar alegações finais orais.
Em relação à situação acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) O Juizado Especial Criminal é competente para apreciar o fato em tela? (Valor: 0,30)b) Antônio faz jus a algum benefício da Lei 9.099/95? Em caso afirmativo, qual(is)? (Valor: 0,30)
c) Antônio praticou crime? Em caso afirmativo, qual? Em caso negativo, por que razão? (Valor: 0,65)
GABARITO COMENTADO
Não, pois, de acordo com o artigo 141, II, do CP, quando a ofensa for praticada contra funcionário público em razão de suas funções, a pena será aumentada de um terço, o que faz com que a sanção máxima abstratamente cominada seja superior a dois anos.
Sim, suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei 9.099/95.
Não. Antônio agiu em erro de tipo vencível/inescusável. Conforme previsão do artigo 20 do CP, nessa hipótese, o agente somente responderá pelo crime se for admitida a punição a título culposo, o que não é o caso, pois o crime em comento não admite a modalidade culposa. Vale lembrar que não houve dolo na conduta de Antônio.
QUESTÃO 23
Joaquina, ao chegar à casa de sua filha, Esmeralda, deparou-se com seu genro, Adaílton, mantendo relações sexuais com sua neta, a menor F.M., de 12 anos de idade, fato ocorrido no dia 2 de janeiro de 2011. Transtornada com a situação, Joaquina foi à delegacia de polícia, onde registrou ocorrência do fato criminoso. Ao término do Inquérito Policial instaurado para apurar os fatos narrados, descobriu-se que Adaílton vinha mantendo relações sexuais com a referida menor desde novembro de 2010. Apurou-se, ainda, que Esmeralda, mãe de F.M., sabia de toda a situação e, apesar de ficar enojada, não comunicava o fato à polícia com receio de perder o marido que muito amava.
Na condição de advogado(a) consultado(a) por Joaquina, avó da menor, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Adaílton praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,3) b) Esmeralda praticou crime? Em caso afirmativo, qual? (Valor: 0,5)
c) Considerando que o Inquérito Policial já foi finalizado, deve a avó da menor oferecer queixa-crime? (Valor: 0,45)
GABARITO COMENTADO
Sim. Estupro de vulnerável, conduta descrita no art. 217-A do CP.
b) Sim. Esmeralda também praticou estupro de vulnerável (artigo 217-A do CP c/c artigo 13, §2o, “a”, do CP), uma vez que tinha a obrigação legal de impedir o resultado, sendo garantidora da menor.
c) Não, pois se trata de ação penal pública incondicionada, nos termos do art. 225, parágrafo único, do CP.
QUESTÃO 24
Jaime, brasileiro, solteiro, nascido em 10/11/1982, praticou, no dia 30/11/2000, delito de furto qualificado pelo abuso de confiança (art. 155, parágrafo 4o, II, do CP). Devidamente denunciado e processado, Jaime foi condenado à pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão. A sentença transitou definitivamente em julgado no dia 15/01/2002, e o término do cumprimento da pena se deu em 20/03/2006. No dia 24/03/2006, Jaime subtraiu um aparelho de telefone celular que havia sido esquecido por Lara em cima do balcão de uma lanchonete. Todavia, sua conduta fora filmada pelas câmeras do estabelecimento, o que motivou o oferecimento de denúncia, por parte do Ministério Público, pela prática de furto simples (art. 155, caput, do CP). A denúncia foi recebida em 14/04/2006, e, em 18/10/2006, Jaime foi condenado à pena de 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Foi fixado o regime inicial aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, com sentença publicada no mesmo dia.
Com base nos dados acima descritos, bem como atento às informações a seguir expostas, responda fundamentadamente:
a) Suponha que a acusação tenha se conformado com a sentença, tendo o trânsito em julgado para esta ocorrido em 24/10/2006. A defesa, por sua vez, interpôs apelação no prazo legal. Todavia, em virtude de sucessivas greves, adiamentos e até mesmo perda dos autos, até a data de 20/10/2010, o recurso da defesa não tinha sido julgado. Nesse sentido, o que você, como advogado, deve fazer? (Valor: 0,60)
b) A situação seria diferente se ambas as partes tivessem se conformado com o decreto condenatório, de modo que o trânsito em julgado definitivo teria ocorrido em 24/10/2006, mas Jaime, temeroso de ficar mais uma vez preso, tivesse se evadido tão logo teve ciência do conteúdo da sentença, somente tendo sido capturado em 25/10/2010? (Valor: 0,65)
GABARITO COMENTADO
Ingressar com habeas corpus com fulcro no art. 648, VII, do CPP (extinção de punibilidade – art.107, IV, do CP), ou com mera petição diretamente dirigida ao relator do processo, considerando-se que a prescrição é matéria de ordem pública e pode até ser conhecida de ofício. O argumento a ser utilizado é a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva superveniente/intercorrente/subsequente (causa extintiva de punibilidade), pois, já ciente do máximo de pena in concretopossível, qual seja, 1 ano e 10 dias-multa, o Estado teria até o dia 17/10/2010 para julgar definitivamente o recurso da defesa, o que não ocorreu, nos termos dos arts. 109, V; 110, §1o; e 117, I e IV, todos do CP. Vale lembrar que a prescrição da pretensão punitiva superveniente pressupõe o trânsito em julgado para a acusação (tal como ocorreu na espécie) e é contada a partir da publicação da sentença penal condenatória, último marco interruptivo da prescrição relacionado na questão. Vale ressaltar que não basta o candidato mencionar que houve prescrição. Tem que ser específico, dizendo ao menos que se trata de prescrição da pretensão punitiva.
b) Sim, a situação seria diferente, pois neste caso não haveria prescrição da pretensão executória nem outra modalidade qualquer. Como Jaime é reincidente, já que o 2o furto foi cometido após o trânsito em julgado definitivo de sentença que lhe condenou pelo 1o furto (art. 63 do CP), a prescrição da pretensão executória tem seu prazo acrescido de 1/3, de acordo com o artigo 110 do CP. Assim, o Estado teria até 23/02/2012 para capturar Jaime, nos termos dos arts. 110 caput e 112, I, do CP.
QUESTÃO 25
João e Maria iniciaram uma paquera no Bar X na noite de 17 de janeiro de 2011. No dia 19 de janeiro do corrente ano, o casal teve uma séria discussão, e Maria, nitidamente enciumada, investiu contra o carro de João, que já não se encontrava em bom estado de conservação, com três exercícios de IPVA inadimplentes, a saber: 2008, 2009 e 2010. Além disso, Maria proferiu diversos insultos contra João no dia de sua festa de formatura, perante seu amigo Paulo, afirmando ser ele “covarde”, “corno” e “frouxo”. A requerimento de João, os fatos foram registrados perante a Delegacia Policial, onde a testemunha foi ouvida. João comparece ao seu escritório e contrata seus serviços profissionais, a fim de serem tomadas as medidas legais cabíveis. Você, como profissional diligente, após verificar não ter passado o prazo decadencial, interpõe Queixa-Crime ao juízo competente no dia 18/7/11.
O magistrado ao qual foi distribuída a peça processual profere decisão rejeitando-a, afirmando tratar-se de clara decadência, confundindo-se com relação à contagem do prazo legal. A decisão foi publicada dia 25 de julho de 2011.
Com base somente nas informações acima, responda: a) Qual é o recurso cabível contra essa decisão? (0,30) b) Qual é o prazo para a interposição do recurso? (0,30) c) A quem deve ser endereçado o recurso? (0,30)
d) Qual é a tese defendida? (0,35)
GABARITO COMENTADO
Como se trata de crime de menor potencial ofensivo, o recurso cabível é Apelação, de acordo com o artigo 82 da Lei 9099/95.
Vale lembrar que a qualificadora do art. 163, parágrafo único, IV, do CP, relativa ao motivo egoístico do crime de dano, caracteriza-se apenas quando o agente pretende obter satisfação econômica ou moral. Assim, a conduta de Maria, motivada por ciúme, não se enquadra na hipótese e configura a modalidade simples do delito de dano (art. 163, caput). Cabe ainda destacar que não houve prejuízo considerável a João, já que o carro danificado estava em mau estado de conservação, o que afasta definitivamente a
qualificadora tipificada no art. 163, parágrafo único, IV, do CP. Assim, o concurso material entre o crime patrimonial e a injúria não ultrapassa o patamar máximo e 2 anos, que define os crimes de menor potencial ofensivo e a competência dos Juizados Especiais Criminais, sendo cabível, portanto, apelação (art. 82 da Lei 9.099/95).
b) 10 dias, de acordo com o §1o do artigo 82 da Lei 9099/95; c) Turma Recursal, consoante art. 82 da Lei 9099/95;
d) O prazo para interposição da queixa-crime é de seis meses a contar da data do fato, conforme previu o artigo 38 do CPP. Trata-se de prazo decadencial, isto é, prazo de natureza material, devendo ser contado de acordo com o disposto no artigo 10 do CP – inclui-se o primeiro dia e exclui-se o último.
QUESTÃO 26
Tício foi denunciado e processado, na 1a Vara Criminal da Comarca do Município X, pela prática de roubo qualificado em decorrência do emprego de arma de fogo. Ainda durante a fase de inquérito policial, Tício foi reconhecido pela vítima. Tal reconhecimento se deu quando a referida vítima olhou através de pequeno orifício da porta de uma sala onde se encontrava apenas o réu. Já em sede de instrução criminal, nem vítima nem testemunhas afirmaram ter escutado qualquer disparo de arma de fogo, mas foram uníssonas no sentido de assegurar que o assaltante portava uma. Não houve perícia, pois os policiais que prenderam o réu em flagrante não lograram êxito em apreender a arma. Tais policiais afirmaram em juízo que, após escutarem gritos de “pega ladrão!”, viram o réu correndo e foram em seu encalço. Afirmaram que, durante a perseguição, os passantes apontavam para o réu, bem como que este jogou um objeto no córrego que passava próximo ao local dos fatos, que acreditavam ser a arma de fogo utilizada. O réu, em seu interrogatório, exerceu o direito ao silêncio. Ao cabo da instrução criminal, Tício foi condenado a oito anos e seis meses de reclusão, por roubo com emprego de arma de fogo, tendo sido fixado o regime inicial fechado para cumprimento de pena. O magistrado, para fins de condenação e fixação da pena, levou em conta os depoimentos testemunhais colhidos em juízo e o reconhecimento feito pela vítima em sede policial, bem como o fato de o réu ser reincidente e portador de maus antecedentes, circunstâncias comprovadas no curso do processo.
Você, na condição de advogado(a) de Tício, é intimado(a) da decisão. Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, redija a peça cabível, apresentando as razões e sustentando as teses jurídicas pertinentes. (Valor: 5,0)
GABARITO COMENTADO
O examinando deve redigir uma apelação, com fundamento no artigo 593, I, do Código de Processo Penal. A petição de interposição deve ser endereçada ao juiz de direito da 1a vara criminal da comarca do município X. Nas razões de apelação o candidato deverá dirigirse ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, argumentando que o reconhecimento feito não deve ser considerado para fins de condenação, pois houve desrespeito à formalidade legal prevista no art. 226, II, do Código de Processo Penal. Dessa forma, inexistiria prova suficiente para a condenação do réu, haja vista ter sido feito somente um único reconhecimento, em sede de inquérito policial e sem a observância das exigências legais, o que levaria à absolvição com fulcro no art. 386, VII, do mesmo diploma (também aceitase como fundamento do pedido de absolvição o art. 386, V do CPP). Outrossim, de maneira alternativa, deverá postular o afastamento da causa especial de aumento de pena decorrente do emprego de arma de fogo, pois esta deveria ter sido submetida à perícia, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal, o que não foi feito, de modo que não há como ser comprovada a potencialidade lesiva da arma. Ademais, sequer foi possível a perícia indireta (art. 167 CPP), pois nenhuma das testemunhas disse ter escutado a arma disparar, de modo que o emprego de arma somente poderia servir para configurar a grave ameaça, elementar do crime de roubo.
QUESTÃO 27
Maria, jovem extremamente possessiva, comparece ao local em que Jorge, seu namorado, exerce o cargo de auxiliar administrativo e abre uma carta lacrada que havia sobre a mesa do rapaz. Ao ler o conteúdo, descobre que Jorge se apropriara de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), que recebera da empresa em que trabalhava para efetuar um pagamento, mas utilizara tal quantia para comprar uma joia para uma moça chamada Júlia. Absolutamente transtornada, Maria entrega a correspondência aos patrões de Jorge.
Com base no relatado acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Jorge praticou crime? Em caso positivo, qual(is)? (Valor: 0,35)
b) Se o Ministério Público oferecesse denúncia com base exclusivamente na correspondência aberta por Maria, o que você, na qualidade de advogado de Jorge, alegaria? (Valor: 0,9)
GABARITO COMENTADO
Sim. Apropriação indébita qualificada (ou majorada) em razão do ofício, prevista no art. 168, parágrafo 1o, III do CP.
b) Falta de justa causa para a instauração de ação penal, já que a denúncia se encontra lastreada exclusivamente em uma prova ilícita, porquanto decorrente de violação a uma norma de direito material (artigo 151 do CP).
QUESTÃO 28
Caio é denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio qualificado por motivo fútil. De acordo com a inicial, em razão de rivalidade futebolística, Caio teria esfaqueado Mévio quarenta e três vezes, causando-lhe o óbito. Pronunciado na forma da denúncia, Caio recorreu com o objetivo de ser impronunciado, vindo o Tribunal de Justiça da localidade a manter a pronúncia, mas excluindo a qualificadora, ao argumento de que Mévio seria arruaceiro e, portanto, a motivação não poderia ser considerada fútil. No julgamento em plenário, ocasião em que Caio confessou a prática do crime, a defesa lê para os jurados a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça no que se refere à caracterização de Mévio como arruaceiro. Respondendo aos quesitos, o Conselho de Sentença absolve Caio.
Sabendo-se que o Ministério Público não recorreu da sentença, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) A esposa de Mévio poderia buscar a impugnação da decisão proferida pelo Conselho de Sentença? Em caso positivo, de que forma e com base em que fundamento? (Valor: 0,65)
b) Caso o Ministério Público tivesse interposto recurso de apelação com fundamento exclusivo no artigo 593, III, “d”, do Código de Processo Penal, poderia o Tribunal de Justiça declarar a nulidade do julgamento por reconhecer a existência de nulidade processual? (Valor: 0,6)
GABARITO COMENTADO
Sim. A esposa da vítima deveria constituir advogado para que ele se habilitasse como assistente de acusação e interpusesse recurso de apelação, com fundamento nos artigos 598 e 593, III, “a” e “d”. Afinal, a defesa violou a proibição expressa contida no artigo 478, I, do CPP, ao ler trecho de decisão que julgou admissível a acusação e manteve a pronúncia do réu. Além disso, tendo o réu confessado o homicídio, a absolvição se mostrou manifestamente contrária à prova dos autos.
b) Não, pois a Súmula 160 do STF proíbe que o Tribunal conheça de nulidade não arguida no recurso de acusação. Assim, a violação ao artigo 478, I, do CPP, por parte da defesa não poderia ser analisada se a acusação não lhe tivesse feito menção no recurso interposto.
QUESTÃO 29
Na cidade de Arsenal, no Estado Z, residiam os deputados federais Armênio e Justino. Ambos objetivavam matar Frederico, rico empresário que possuía valiosas informações contra eles. Frederico morava na cidade de Tirol, no Estado K, mas seus familiares viviam em Arsenal. Sabendo que Frederico estava visitando a família, Armênio e Justino decidiram colocar em prática o plano de matá-lo. Para tanto, seguiram Frederico quando este saía da casa de seus parentes e, utilizando-se do veículo em que estavam, bloquearam a passagem de Frederico, de modo que a caminhonete deste não mais conseguia transitar. Ato contínuo, Armênio e Justino desceram do automóvel. Armênio imobilizou Frederico e Justino desferiu tiros contra ele, Frederico. Os algozes deixaram rapidamente o local, razão pela qual não puderam perceber que Frederico ainda estava vivo, tendo conseguido salvar-se após socorro prestado por um passante. Tudo foi noticiado à polícia, que instaurou o respectivo inquérito policial. No curso do inquérito, os mandatos de Armênio e Justino chegaram ao fim, e eles não conseguiram se reeleger. O Ministério Público, por sua vez, munido dos elementos de informação colhidos na fase inquisitiva, ofereceu denúncia contra Armênio e Justino, por tentativa de homicídio, ao Tribunal do Júri da Justiça Federal com jurisdição na comarca onde se deram os fatos, já que, à época, os agentes eram deputados federais. Recebida a denúncia, as defesas de Armênio e Justino mostraram-se conflitantes. Já na fase instrutória, Frederico teve seu depoimento requerido. A vítima foi ouvida por meio de carta precatória em Tirol. Na respectiva audiência, os advogados de Armênio e Justino não compareceram, de modo que juízo deprecado nomeou um único advogado para ambos os réus. O juízo deprecante, ao final, emitiu decreto condenatório em face de Armênio e Justino. Armênio, descontente com o patrono que o representava, destituiu-o e nomeou você como novo advogado.
Com base no cenário acima, indique duas nulidades que podem ser arguidas em favor de Armênio. Justifique com base no CPP e na CRFB. (Valor: 1,25)
GABARITO COMENTADO
Primeiramente há que ser arguida nulidade por incompetência absoluta (art. 564, I, do CPP), pois no caso não há incidência de nenhuma das hipóteses mencionadas no art. 109 da CRFB que justifiquem a atração do processo à competência da Justiça Federal. Ademais, o fato de os agentes serem exdeputados federais não enseja deslocamento de competência. Nesse sentido, competente é o Tribunal do Júri da Comarca onde se deram os fatos, pois, cessado o foro por prerrogativa de função, voltam a incidir as regras normais de competência para o julgamento da causa, de modo que, dada à natureza da infração (crime doloso contra a vida), a competência é afeta ao Tribunal do Júri de Arsenal.
Além disso, também deverá ser arguida nulidade com base no art. 564, IV, do CPP. A nomeação de somente um advogado para ambos réus, feita pelo juízo deprecado, não respeita o princípio da ampla defesa (art. 5o, LV, da CRFB), pois, como as defesas eram conflitantes, a nomeação de um só advogado prejudica os réus.
Por fim, com base nos artigos 413 e 414 do CPP, bem como art. 5o, LIII da CRFB/88, poderá ser arguida nulidade pela falta de apreciação da causa pelo juiz natural do feito.
QUESTÃO 30
João e Maria, casados desde 2007, estavam passando por uma intensa crise conjugal. João, visando tornar insuportável a vida em comum, começou a praticar atos para causar dano emocional a Maria, no intuito de ter uma partilha mais favorável. Para tanto, passou a realizar procedimentos de manipulação, de humilhação e de ridicularização de sua esposa.
Diante disso, Maria procurou as autoridades policiais e registrou ocorrência em face dos transtornos causados por seu marido. Passados alguns meses, Maria e João chegam a um entendimento e percebem que foram feitos um para o outro, como um casal perfeito. Maria decidiu, então, renunciar à representação.
Nesse sentido e com base na legislação pátria, responda fundamentadamente:
a) Pode haver renúncia (retratação) à representação durante a fase policial, antes de o procedimento ser levado a juízo? (0,65)
b) Pode haver aplicação de pena consistente em prestação pecuniária? (0,6)
GABARITO COMENTADO
Tratase de crime capitulado na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), conforme transcrito abaixo:
“Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
II a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;”
Além disso, o Código Penal assim dispõe:“Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena detenção, de três meses a um ano.
§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendose o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada pela Lei no 11.340, de 2006)
Pena detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei no 11.340, de 2006)
§ 10. Nos casos previstos nos §§1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no §9o deste artigo, aumentase a pena em 1/3 (um terço). (Incluído pela Lei no 10.886, de 2004)”
Sendo assim, de acordo com a Lei supracitada, a renúncia à representação só é admitida na presença do Juiz, em audiência especialmente designada para esta finalidade, nos termos do art. 16 da lei 11.340/2006 e, de acordo com o artigo 17 da referida lei, a prestação pecuniária é vedada.
QUESTÃO 31
No dia 17 de junho de 2010, uma criança recém-nascida é vista boiando em um córrego e, ao ser resgatada, não possuía mais vida. Helena, a mãe da criança, foi localizada e negou que houvesse jogado a vítima no córrego. Sua filha teria sido, segundo ela, sequestrada por um desconhecido. Durante a fase de inquérito, testemunhas afirmaram que a mãe apresentava quadro de profunda depressão no momento e logo após o parto. Além disso, foi realizado exame médico legal, o qual constatou que Helena, quando do fato, estava sob influência de estado puerperal. À míngua de provas que confirmassem a autoria, mas desconfiado de que a mãe da criança pudesse estar envolvida no fato, a autoridade policial representou pela decretação de interceptação telefônica da linha de telefone móvel usado pela mãe, medida que foi decretada pelo juiz competente. A prova constatou que a mãe efetivamente praticara o fato, pois, em conversa telefônica com uma conhecida, de nome Lia, ela afirmara ter atirado a criança ao córrego, por desespero, mas que estava arrependida. O delegado intimou Lia para ser ouvida, tendo ela confirmado, em sede policial, que Helena de fato havia atirado a criança, logo após o parto, no córrego. Em razão das aludidas provas, a mãe da criança foi então denunciada pela prática do crime descrito no art. 123 do Código Penal perante a 1a Vara Criminal (Tribunal do Júri). Durante a ação penal, é juntado aos autos o laudo de necropsia realizada no corpo da criança. A prova técnica concluiu que a criança já nascera morta. Na audiência de instrução, realizada no dia 12 de agosto de 2010, Lia é novamente inquirida, ocasião em que confirmou ter a denunciada, em conversa telefônica, admitido ter jogado o corpo da criança no córrego. A mesma testemunha, no entanto, trouxe nova informação, que não mencionara quando ouvida na fase inquisitorial. Disse que, em outras conversas que tivera com a mãe da criança, Helena contara que tomara substância abortiva, pois não poderia, de jeito nenhum, criar o filho. Interrogada, a denunciada negou todos os fatos. Finda a instrução, o Ministério Público manifestou-se pela pronúncia, nos termos da denúncia, e a defesa, pela impronúncia, com base no interrogatório da acusada, que negara todos os fatos. O magistrado, na mesma audiência, prolatou sentença de pronúncia, não nos termos da denúncia, e sim pela prática do crime descrito no art. 124 do Código Penal, punido menos severamente do que aquele previsto no art. 123 do mesmo código, intimando as partes no referido ato.
Com base somente nas informações de que dispõe e nas que podem ser inferidas pelo caso concreto acima, na condição de advogado(a) de Helena, redija a peça cabível à impugnação da mencionada decisão, acompanhada das razões pertinentes, as quais devem apontar os argumentos para o provimento do recurso, mesmo que em caráter sucessivo.
GABARITO COMENTADO
O recurso cabível é o recurso em sentido estrito, na forma do art. 581, IV, do Código de Processo Penal, dirigido ao Juiz da 1a Vara Criminal (Tribunal do Júri).
Em primeiro lugar, deverá o examinando requerer, em preliminar, o desentranhamento das provas ilícitas.
Isso porque o crime investigado, infanticídio (art. 123 do Código Penal), é punido com pena de detenção. Em razão disso, não era admissível a interceptação telefônica prevista na Lei 9.296/96, pois a lei em tela não admite a medida quando o crime só é punido com pena de detenção (art. 2o, III). É de ressaltar que o crime de aborto, previsto no art. 124, também só é punido com pena de detenção. Além disso, o enunciado indica não existir indícios suficientes de autoria, uma vez que o delegado representou pela decretação da quebra com base em meras suspeitas. Finalmente, não foram esgotados todos os meios de investigação, condição sine qua non para que a medida seja decretada.
Por outro lado, o examinando deverá registrar também que o testemunho de Lia, embora seja prova realizada de modo lícito, será ilícito por derivação, na forma do art. 157, § 1o, do Código e Processo Penal e, portanto, imprestável.
Ainda em preliminar, deverá o examinando suscitar a nulidade do processo por violação do art. 411, § 3o do Código de Processo Penal, c/c art. 384 do Código de Processo Penal. Com efeito, diante das regras acima referidas, o Juiz, vislumbrando a possibilidade de nova definição do fato em razão de prova nova, surgida durante a instrução, deverá abrir vista dos autos para que o Ministério Público, se for o caso, adite a denúncia, mesmo que a pena prevista para a nova definição jurídica seja menor, conforme a nova redação do art. 384 do Código de Processo Penal, dada pela Lei 11.719/2008.
O candidato deverá, ainda, sustentar que não restou provada a materialidade do crime de aborto, uma vez que nenhuma perícia foi feita no sentido de comprovar que a criança faleceu em decorrência da ingestão de substância abortiva.
Finalmente, deveria requerer, em caráter sucessivo, a impronúncia da acusada, uma vez que, retiradas as provas ilícitas dos autos, nenhuma prova de autoria existiria contra a denunciada.
QUESTÃO 32
Caio, na qualidade de diretor financeiro de uma conhecida empresa de fornecimento de material de informática, se apropriou das contribuições previdenciárias devidas dos empregados da empresa e por esta descontadas, utilizando o dinheiro para financiar um automóvel de luxo. A partir de comunicação feita por Adolfo, empregado da referida empresa, tal fato chegou ao conhecimento da Polícia Federal, dando ensejo à instauração de inquérito para apurar o crime previsto no artigo 168-A do Código Penal. No curso do aludido procedimento investigatório, a autoridade policial apurou que Caio também havia praticado o crime de sonegação fiscal, uma vez que deixara de recolher ICMS relativamente às operações da mesma empresa. Ao final do inquérito policial, os fatos ficaram comprovados, também pela confissão de Caio em sede policial. Nessa ocasião, ele afirmou estar arrependido e apresentou comprovante de pagamento exclusivamente das contribuições previdenciárias devidas ao INSS, pagamento realizado após a instauração da investigação, ficando não paga a dívida relativa ao ICMS. Assim, o delegado encaminhou os autos ao Ministério Público Federal, que denunciou Caio pelos crimes previstos nos artigos 168-A do Código Penal e 1o, I, da Lei 8.137/90, tendo a inicial acusatória sido recebida pelo juiz da vara federal da localidade. Após analisar a resposta à acusação apresentada pelo advogado de Caio, o aludido magistrado entendeu não ser o caso de absolvição sumária, tendo designado audiência de instrução e julgamento.
Com base nos fatos narrados no enunciado, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Qual é o meio de impugnação cabível à decisão do Magistrado que não o absolvera sumariamente? (Valor: 0,2)
b) A quem a impugnação deve ser endereçada? (Valor: 0,2)
c) Quais fundamentos devem ser utilizados? (Valor: 0,6)
GABARITO COMENTADO
Habeas Corpus, uma vez que não há previsão de recurso contra a decisão que não absolvera sumariamente o acusado, sendo cabível a ação mandamental, conforme estabelecem os artigos 647 e seguintes do CPP. No caso, não seria admissível o recurso em sentido estrito, uma vez que o enunciado não traz qualquer informação acerca da fundamentação utilizada pelo magistrado para deixar de absolver sumariamente o réu, não podendo o candidato deduzir que teria sido realizado e indeferido pedido expresso de reconhecimento de extinção da punibilidade.
b) Ao Tribunal Regional Federal.
c) Extinção da punibilidade pelo pagamento do débito quanto ao delito previsto no artigo 168- A, do CP, e, após, restando apenas acusação pertinente à sonegação de tributo de natureza estadual, incompetência absoluta – em razão da matéria – do juízo federal para processar e julgar a matéria. Quanto à Súmula Vinculante no 24, o enunciado não traz qualquer informação no sentido de que a via administrativa ainda não teria se esgotado, não podendo o candidato deduzir tal fato.
QUESTÃO 33
Caio, residente no município de São Paulo, é convidado por seu pai, morador da cidade de Belo Horizonte, para visitá-lo. Ao dirigir-se até Minas Gerais em seu carro, Caio dá carona a Maria, jovem belíssima que conhecera na estrada e que, ao saber do destino de Caio, o convence a subtrair pertences da casa do genitor do rapaz, chegando a sugerir que ele aguardasse o repouso noturno de seu pai para efetuar a subtração. Ao chegar ao local, Caio janta com o pai e o espera adormecer, quando então subtrai da residência uma televisão de plasma, um aparelho de som e dois mil reais. Após encontrar-se com Maria no veículo, ambos se evadem do local e são presos quando chegavam ao município de São Paulo.
Com base no relatado acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Caio pode ser punido pela conduta praticada e provada? (Valor: 0,4)
b) Maria pode ser punida pela referida conduta? (Valor: 0,4)
c) Em caso de oferecimento de denúncia, qual será o juízo competente para processamento da ação penal? (Valor: 0,2)
GABARITO COMENTADO
Não, uma vez que incide sobre o caso a escusa absolutória prevista no artigo 181, II, do CP.
b) Sim, uma vez que a circunstância relativa a Caio é de caráter pessoal, não se comunicando a ela (artigo 30 do CP). Assim, poderá ser punida pela prática do crime de furto qualificado pelo repouso noturno.
c) Belo Horizonte, local em que delito se consumou, conforme artigos 69, I, do CPP e 6o do CP.
QUESTÃO 34
Jeremias é preso em flagrante pelo crime de latrocínio, praticado contra uma idosa que acabara de sacar o valor relativo à sua aposentadoria dentro de uma agência da Caixa Econômica Federal e presenciado por duas funcionárias da referida instituição, as quais prestaram depoimento em sede policial e confirmaram a prática do delito. Ao oferecer denúncia perante o Tribunal do Júri da Justiça Federal da localidade, o Ministério Público Federal requereu a decretação da prisão preventiva de Jeremias para a garantia da ordem pública, por ser o crime gravíssimo e por conveniência da instrução criminal, uma vez que as testemunhas seriam mulheres e poderiam se sentir amedrontadas caso o réu fosse posto em liberdade antes da colheita de seus depoimentos judiciais. Ao receber a inicial, o magistrado decretou a prisão preventiva de Jeremias, utilizando-se dos argumentos apontados pelo Parquet.
Com base no caso acima, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso, indique os argumentos defensivos para atacar a decisão judicial que recebeu a denúncia e decretou a prisão preventiva.
GABARITO COMENTADO
Não, pois a competência para processamento e julgamento é de uma vara comum da justiça estadual, por se tratar de crime patrimonial e que não ofende bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas.
b) Não, pois a jurisprudência é pacífica no sentido de que considerações genéricas e presunções de que em liberdade as testemunhas possam sentir-se amedrontadas não são argumentos válidos para a decretação da prisão antes do trânsito em julgado de decisão condenatória, pois tal providência possui natureza estritamente cautelar, de modo que somente poderá ser determinada quando calcada em elementos concretos que demonstrem a existência de risco efetivo à eficácia da prestação jurisdicional.
c) Tribunal Regional Federal, pois a autoridade coatora é juiz de direito federal.
QUESTÃO 35
Caio, professor do curso de segurança no trânsito, motorista extremamente qualificado, guiava seu automóvel tendo Madalena, sua namorada, no banco do carona. Durante o trajeto, o casal começa a discutir asperamente, o que faz com que Caio empreenda altíssima velocidade ao automóvel. Muito assustada, Madalena pede insistentemente para Caio reduzir a marcha do veículo, pois àquela velocidade não seria possível controlar o automóvel. Caio, entretanto, respondeu aos pedidos dizendo ser perito em direção e refutando qualquer possibilidade de perder o controle do carro. Todavia, o automóvel atinge um buraco e, em razão da velocidade empreendida, acaba se desgovernando, vindo a atropelar três pessoas que estavam na calçada, vitimando-as fatalmente. Realizada perícia de local, que constatou o excesso de velocidade, e ouvidos Caio e Madalena, que relataram à autoridade policial o diálogo travado entre o casal, Caio foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime de homicídio na modalidade de dolo eventual, três vezes em concurso formal. Recebida a denúncia pelo magistrado da vara criminal vinculada ao Tribunal do Júri da localidade e colhida a prova, o Ministério Público pugnou pela pronúncia de Caio, nos exatos termos da inicial.
Na qualidade de advogado de Caio, chamado aos debates orais, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Qual(is) argumento(s) poderia(m) ser deduzidos em favor de seu constituinte? (Valor: 0,4)
b) Qual pedido deveria ser realizado? (Valor: 0,3)
c) Caso Caio fosse pronunciado, qual recurso poderia ser interposto e a quem a peça de interposição deveria ser dirigida? (Valor: 0,3)
GABARITO COMENTADO
Incompetência do juízo, uma vez que Caio praticou homicídio culposo, pois agiu com culpa consciente, na medida em que, embora tenha previsto o resultado, acreditou que o evento não fosse ocorrer em razão de sua perícia.
b) Desclassificação da imputação para homicídio culposo e declínio de competência, conforme previsão do artigo 419 do CPP.
c) Recurso em sentido estrito, conforme previsão do artigo 581, IV, do CPP. A peça de interposição deveria ser dirigida ao juiz de direito da vara criminal vinculada ao tribunal do júri, prolator da decisão atacada.
QUESTÃO 36
Em 22 de julho de 2008, Caio foi condenado à pena de 10 (dez) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, pela prática, no dia 10 de novembro de 2006, do crime de tráfico de drogas, previsto no artigo 33 da Lei 11.343/2006. Iniciada a execução da sua pena em 7 de janeiro de 2009, a Defensoria Pública, em 10 de fevereiro de 2011, requereu a progressão do cumprimento da sua pena para o regime semiaberto, tendo o pedido sido indeferido pelo juízo de execuções penais ao argumento de que, para tanto, seria necessário o cumprimento de 2/5 da pena.
Considerando ter sido procurado pela família de Caio para advogar em sua defesa, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.
a) Qual(is) o(s) meio(s) de impugnação da decisão que indeferiu o pedido da Defensoria Pública? (Valor: 0,3)
b) Qual(is) argumento(s) jurídico(s) poderia(m) ser usado(s) em defesa da progressão de regime de Caio? (Valor: 0,7)
GABARITO COMENTADO
a) Habeas Corpus e agravo em execução penal.
b) Tendo em vista que a norma que alterou as regras relativas à progressão de regime possui natureza penal e é mais gravosa ao réu, não pode retroagir de modo a abarcar fatos que lhe são anteriores. No caso, o delito foi praticado antes da edição da lei, devendo, em consequência, ser aplicada a fração de 1/6 para a progressão de regime.
QUESTÃO 37
José da Silva foi preso em flagrante pela polícia militar quando transportava em seu carro grande quantidade de drogas. Levado pelos policiais à delegacia de polícia mais próxima, José telefonou para seu advogado, o qual requereu ao delegado que aguardasse sua chegada para lavrar o flagrante. Enquanto esperavam o advogado, o delegado de polícia conversou informalmente com José, o qual confessou que pertencia a um grupo que se dedicava ao tráfico de drogas e declinou o nome de outras cinco pessoas que participavam desse grupo. Essa conversa foi gravada pelo delegado de polícia.
Após a chegada do advogado à delegacia, a autoridade policial permitiu que José da Silva se entrevistasse particularmente com seu advogado e, só então, procedeu à lavratura do auto de prisão em flagrante, ocasião em que José foi informado de seu direito de permanecer calado e foi formalmente interrogado pela autoridade policial. Durante o interrogatório formal, assistido pelo advogado, José da Silva optou por permanecer calado, afirmando que só se manifestaria em juízo.
Com base na gravação contendo a confissão e delação de José, o Delegado de Polícia, em um único ato, determina que um de seus policiais atue como agente infiltrado e requer, ainda, outras medidas cautelares investigativas para obter provas em face dos demais membros do grupo criminoso: 1. quebra de sigilo de dados telefônicos, autorizada pelo juiz competente; 2. busca e apreensão, deferida pelo juiz competente, a qual logrou apreender grande quantidade de drogas e armas; 3. prisão preventiva dos cinco comparsas de José da Silva, que estavam de posse das drogas e armas. Todas as provas coligidas na investigação corroboraram as informações fornecidas por José em seu depoimento.
Relatado o inquérito policial, o promotor de justiça denunciou todos os envolvidos por associação para o tráfico de drogas (art. 35, Lei 11.343/2006), tráfico ilícito de entorpecentes (art. 33, Lei 11.343/2006) e quadrilha armada (art. 288, parágrafo único).Considerando tal narrativa, excluindo eventual pedido de aplicação do instituto da delação premiada, indique quais as teses defensivas, no plano do direito material e processual, que podem ser arguidas a partir do enunciado acima, pela defesa de José. Indique os dispositivos legais aplicáveis aos argumentos apresentados.
GABARITO COMENTADO
1. gravação informal obtida pelo delegado de polícia constitui prova ilícita, já que o preso tem o direito de ser informado dos seus direitos, dentre os quais o de permanecer calado (art. 5o, inc. LXIII, Constituição). O depoimento policial é um ato formal e, segundo o artigo 6o, V, deve observar as regras para a oitiva do acusado na fase judicial, previstas no Capítulo III, Título VII do Código de Processo Penal. Como as demais provas foram obtidas a partir do depoimento que constitui prova ilícita, devem igualmente ser consideradas ilícitas (art. 157, §1o, Código de Processo Penal). (0,3)
2. A infiltração de agente policial, conforme determina o artigo 53, I da Lei 11343/06, só pode ser determinada mediante autorização judicial e oitiva do Ministério Público. (0,3)
3. Não se admite a acumulação das acusações de quadrilha e associação para o tráfico, já que as duas redações típicas compreendem as mesmas ações objetivas (estabilidade na comunhão de ações e desígnios para a prática de crimes). (0,4)
QUESTÃO 38
Caio, funcionário público, ao fiscalizar determinado estabelecimento comercial exige vantagem indevida. A qual delito corresponde o fato narrado:I. se a vantagem exigida servir para que Caio deixe de cobrar tributo devido;II. se a vantagem, advinda de cobrança de tributo que Caio sabia não ser devida, for desviada para proveito de Caio?
GABARITO COMENTADO
Art. 3o da Lei n. 8.137/90 (0,5) e excesso de exação qualificada – art. 316, § 2o, do CP (0,5).
A exigência de vantagem indevida por funcionário público em razão de sua função caracteriza, em princípio, o delito de concussão. A Lei n. 8.137/90, a lei dos crimes contra a ordem tributária, criou , no que interessa à questão, dois tipos novos: inseriu no artigo 316 do Código Penal dois parágrafos, criando o excesso de exação – nas hipóteses em que a vantagem indevida for ela mesma um tributo ou contribuição social indevida -, e sua forma qualificada, que se dá quando a vantagem é apropriada pelo agente. O outro novel tipo penal está no artigo 3o da Lei n. 8.137/90, que tipifica uma forma específica de concussão: a exigência de vantagem indevida para deixar de cobrar tributo devido.
QUESTÃO 39
Pedro, almejando a morte de José, contra ele efetua disparo de arma de fogo, acertando-o na região toráxica. José vem a falecer, entretanto, não em razão do disparo recebido, mas porque, com intenção suicida, havia ingerido dose letal de veneno momentos antes de sofrer a agressão, o que foi comprovado durante instrução processual. Ainda assim, Pedro foi pronunciado nos termos do previsto no artigo 121, caput, do Código Penal.
Na condição de Advogado de Pedro:I. indique o recurso cabível;II. o prazo de interposição;III. a argumentação visando à melhoria da situação jurídica do defendido. Indique, ainda, para todas as respostas, os respectivos dispositivos legais.
GABARITO COMENTADO
 (i) – Recurso em Sentido Estrito, nos termos do artigo 581, IV, do Código de Processo Penal. (0,2)
(ii) – 5 dias, nos termos do artigo 586, do Código de Processo Penal. (0,2)
(iii) – deveria ser requerida a desclassificação de crime consumado para tentado, já que a ação de Pedro não deu origem a morte de José. Trata-se de hipótese de concausa absolutamente independente pré- existente. (0,4)Artigo 13, do Código Penal. (0,2)
QUESTÃO 40
Aurélio, tentando defender-se da agressão a faca perpetrada por Berilo, saca de seu revólver e efetua um disparo contra o agressor. Entretanto, o disparo efetuado por Aurélio ao invés de acertar Berilo, atinge Cornélio, que se encontrava muito próximo de Berilo. Em consequência do tiro, Cornélio vem a falecer. Aurélio é acusado de homicídio.
Na qualidade de advogado de Aurélio indique a tese de defesa que melhor se adequa ao fato. Justifique sua resposta.
GABARITO COMENTADO
Trata-se o presente caso de um erro na execução (art. 73 do CP, 1a parte), atendendo-se, conforme o citado artigo, ao disposto no parágrafo 3o do artigo 20 do Código Penal. Por outro lado verifica-se que Aurélio ao efetuar o disparo agiu em legítima defesa (art. 25 do CP) própria e real. Entretanto, por um erro acertou pessoa diversa (Cornélio) do agressor (Berilo). Mesmo assim, não fica afastada a legítima defesa posto que de acordo com o art. 20 § 3o do CP “não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime”. Levando-se, ainda, em consideração o fato de que Aurélio agiu em defesa de uma agressão injusta e atual, utilizando- se, ainda, dos meios necessários e que dispunha para se defender.
QUESTÃO 41
Lucas, processado em liberdade, foi condenado na 1a instância à pena de 05 (cinco) anos em regime integralmente fechado, pelo crime de tráfico de drogas, cometido em setembro de 2006. Interpôs Recurso de Apelação o qual foi parcialmente provido. O Tribunal alterou apenas o dispositivo da sentença que fixava o regime em integralmente fechado para inicialmente fechado. Após o trânsito em julgado, Lucas deu inicio ao cumprimento de pena em 10 de fevereiro de 2009. O juízo da execução, em 10 de outubro de 2010, negou a progressão de regime sob o fundamento de que Lucas ainda não havia cumprido 2/5 da pena, em que pese os demais requisitos tenham sido preenchidos.
Diante dos fatos e da decisão acima exposta, sendo que sua intimação, na condição de Advogado de Lucas, ocorreu em 11.10.2010:I. indique o recurso cabível.II. apresente a argumentação adequada, indicando os respectivos dispositivos legais.
GABARITO COMENTADO
 (a) - Recurso Cabível: Agravo em Execução, nos termos do previsto no artigo 197, da Lei n. 7.210/84. (b) - Fundamentação: Com o advento da Lei 11.464/07, restou legalmente instituída a possibilidade de progressão de regime nos crimes hediondos e equiparados, respeitando, assim, o princípio constitucional da individualização da pena. A mencionada lei fixou prazo diferenciado para tais delitos, afastando o critério de cumprimento de 1/6 da pena, determinando o cumprimento de 2/5, para primários e 3/5, para reincidentes. No entanto, no caso em comento, o delito fora cometido antes da entrada em vigor da lei 11.464/07, sendo esta prejudicial ao réu no que tange ao prazo para progressão, razão pela qual não poderá ser aplicada
retroativamente. Logo, quando do pedido perante o juízo da execução, Lucas já havia cumprido o requisito objetivo exigido para a progressão de regime, ou seja, 1/6, devendo ser concedido, nos termos do artigo 112, da Lei n. 7.210/84. O requerimento deve ser de progressão de regime. Pontuação para argumentação: 0,5. Pontuação para indicação dos dispositivos legais: 0,2
QUESTÃO 42
A Polícia Civil do Estado do Rio Grande do Sul recebe notícia crime identificada, imputando a Maria Campos a prática de crime, eis que mandaria crianças brasileiras para o estrangeiro com documentos falsos. Diante da notícia crime, a autoridade policial instaura inquérito policial e, como primeira providência, representa pela decretação da interceptação das comunicações telefônicas de Maria Campos, “dada a gravidade dos fatos noticiados e a notória dificuldade de apurar crime de tráfico de menores para o exterior por outros meios, pois o ‘modus operandi’ envolve sempre atos ocultos e exige estrutura organizacional sofisticada, o que indica a existência de uma organização criminosa integrada pela investigada Maria”. O Ministério Público opina favoravelmente e o juiz defere a medida, limitando-se a adotar, como razão de decidir, “os fundamentos explicitados na representação policial”.
No curso do monitoramento, foram identificadas pessoas que contratavam os serviços de Maria Campos para providenciar expedição de passaporte para viabilizar viagens de crianças para o exterior. Foi gravada conversa telefônica de Maria com um funcionário do setor de passaportes da Polícia Federal, Antônio Lopes, em que Maria consultava Antônio sobre os passaportes que ela havia solicitado, se já estavam prontos, e se poderiam ser enviados a ela. A pedido da autoridade policial, o juiz deferiu a interceptação das linhas telefônicas utilizadas por Antônio Lopes, mas nenhum diálogo relevante foi interceptado.
O juiz, também com prévia representação da autoridade policial e manifestação favorável do Ministério Público, deferiu a quebra de sigilo bancário e fiscal dos investigados, tendo sido identificado um depósito de dinheiro em espécie na conta de Antônio, efetuado naquele mesmo ano, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). O monitoramento telefônico foi mantido pelo período de quinze dias, após o que foi deferida medida de busca e apreensão nos endereços de Maria e Antônio. A decisão foi proferida nos seguintes termos: “diante da gravidade dos fatos e da real possibilidade de serem encontrados objetos relevantes para investigação, defiro requerimento de busca e apreensão nos endereços de Maria (Rua dos Casais, 213) e de Antônio (Rua Castro, 170, apartamento 201)”. No endereço de Maria Campos, foi encontrada apenas uma relação de nomes que, na visão da autoridade policial, seriam clientes que teriam requerido a expedição de passaportes com os nomes de crianças que teriam viajado para o exterior. No endereço indicado no mandado de Antônio Lopes, nada foi encontrado. Entretanto, os policiais que cumpriram a ordem judicial perceberam que o apartamento 202 do mesmo prédio também pertencia ao investigado, motivo pelo qual nele ingressaram, encontrando e apreendendo a quantia de cinquenta mil dólares em espécie. Nenhuma outra diligência foi realizada.
Relatado o inquérito policial, os autos foram remetidos ao Ministério Público, que ofereceu a denúncia nos seguintes termos: “o Ministério Público vem oferecer denúncia contra Maria Campos e Antônio Lopes, pelos fatos a seguir descritos: Maria Campos, com o auxílio do agente da polícia federal Antônio Lopes, expediu diversos passaportes para crianças e adolescentes, sem observância das formalidades legais. Maria tinha a finalidade de viabilizar a saída dos menores do país. A partir da quantia de dinheiro apreendida na casa de Antônio Lopes, bem como o depósito identificado em sua conta bancária, evidente que ele recebia vantagem indevida para efetuar a liberação dos passaportes. Assim agindo, a denunciada Maria Campos está incursa nas penas do artigo 239, parágrafo único, da Lei n. 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), e nas penas do artigo 333, parágrafo único, c/c o artigo 69, ambos do Código Penal. Já o denunciado Antônio Lopes está incurso nas penas do artigo 239, parágrafo único, da Lei n. 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e nas penas do artigo 317, § 1o, c/c artigo 69, ambos do Código Penal”.
O juiz da 15a Vara Criminal de Porto Alegre, RS, recebeu a denúncia, nos seguintes termos: “compulsando os autos, verifico que há prova indiciária suficiente da ocorrência dos fatos descritos na denúncia e do envolvimento dos denunciados. Há justa causa para a ação penal, pelo que recebo a denúncia. Citem-se os réus, na forma da lei”. Antônio foi citado pessoalmente em 27.10.2010 (quarta- feira) e o respectivo mandado foi acostado aos autos dia 01.11.2010 (segunda-feira). Antônio contratou você como Advogado, repassando-lhe nomes de pessoas (Carlos de Tal, residente na Rua 1, n. 10, nesta capital; João de Tal, residente na Rua 4, n. 310, nesta capital; Roberta de Tal, residente na Rua 4, n. 310, nesta capital) que prestariam relevantes informações para corroborar com sua versão.
Nessa condição, redija a peça processual cabível desenvolvendo TODAS AS TESES DEFENSIVAS que podem ser extraídas do enunciado com indicação de respectivos dispositivos legais. Apresente a peça no último dia do prazo.
GABARITO COMENTADO
• O candidato deverá redigir Resposta à Acusação endereçada ao Juiz de Direito da 15a Vara Criminal de Porto Alegre, RS, com base nos artigos 396 e/ou 396-A do Código de Processo Penal. É indispensável a indicação do dispositivo legal que fundamenta a apresentação da peça. Peças denominadas “Defesa Previa”, “Defesa Preliminar” e “Resposta Preliminar” sem indicação do dispositivo legal não serão aceitas. Peças com fundamento simultâneo nos artigos 406 e 514 do Código de Processo Penal, ou em qualquer artigo de outra lei não serão aceitas. Quando se indicava os artigos 396 e/ou 396-A, as peças eram aceitas independente do nome, salvo quando também se fundamentavam no art. 514 do Código de Processo Penal ou em outro artigo não aplicável ao caso. Admitiu-se a resposta acompanhada da exceção de incompetência, pontuando-se os argumentos constantes de ambas as peças.
.     A primeira questão preliminar que deverá ser arguida é incompetência da Justiça Estadual para processar o feito, eis que o crime é de competência federal, nos termos do que prevê o artigo 109, V, da Constituição Federal. Relativamente a esse tema, admitiu-se também a arguição de incompetência com base no inciso IV do art. 109, da Constituição. Em ambos os casos, será considerada válida a indicação da transnacionalidade do crime ou a circunstância de ser uma acusação de crime supostamente praticado por funcionário público federal no exercício das funções e com estas relacionadas. Admite-se também a simples referência ao dispositivo da Constituição, ou até mesmo à Súmula n. 254, do extinto mas sempre Egrégio Tribunal Federal de Recursos. Não será aceita, por outro lado, a referência ao art. 109, I da Constituição nem às Súmulas 122 e/ou 147 do STJ.
.     A segunda questão preliminar que deverá ser arguida é nulidade na interceptação telefônica. Aqui, foram pontuados separadamente os dois argumentos para sustentar a nulidade: (a) falta de fundamentação da decisão nos termos do que disciplina o artigo 5o, da Lei n. 9.296/96 e artigo 93, IX, da Constituição da República; no mesmo sentido; (b) impossibilidade de se decretar a medida de interceptação telefônica como primeira medida investigativa, não respeitando o princípio da excepcionalidade, violando o previsto no artigo 2o, II, da Lei n. 9.296/96. Na nulidade da interceptação não se aceitará o argumento do art. 4o, acerca da ausência de indicação de como seria implementada a medida. Também não se aceitará a nulidade decorrente da incompetência para a decretação, eis que o argumento da incompetência era objeto de pontuação específica.
.     A terceira questão preliminar que deverá ser arguida é a nulidade da decisão que deferiu a busca e apreensão nula, eis que genérica e sem fundamentação, fulcro no artigo 93, IX, da Constituição da República.
.     A quarta questão preliminar que deverá ser arguida é a nulidade da apreensão dos cinquenta mil dólares, eis que o ingresso no outro apartamento de Antônio, onde estava a quantia, não estava autorizado judicialmente. Relativamente a este ponto, era indispensável que se associasse a ilegalidade ao conceito de prova ilícita e consequentemente requerendo-se a desconsideração do dinheiro lá apreendido.
.     A quinta questão preliminar que deverá ser arguida é a inépcia da inicial acusatória, eis que a conduta é genérica, sem descrever as elementares do tipo de corrupção passiva e sem imputar fato determinado. Isso viola o previsto no artigo 8o, 2, ‘b’, do Decreto 678/92, o qual prevê como garantia do acusado a comunicação prévia e pormenorizada da acusação formulada. Além disso, limita o exercício do direito de defesa, em desrespeito ao previsto no artigo 5o, LV, da Constituição da República. Por fim, há violação ao artigo 41, do Código de Processo Penal.
.     Em relação ao crime de corrupção passiva, previsto no artigo 317, §1o, do Código Penal, o candidato deverá apontar a falta de justa causa para a ação penal. Afirmações genéricas de falta de justa causa não serão consideradas suficientes para obtenção da pontuação. Com efeito, é preciso que o candidato faça um cotejo entre o tipo penal (com seus elementos normativos, objetivos e subjetivos) e os fatos narrados no enunciado da questão. São exemplos de argumentos: não há prova suficiente de que o réu recebia vantagem indevida para a emissão de passaportes de forma irregular; não há nenhuma prova de que os passaportes fossem emitidos de forma irregular; nenhum passaporte foi apreendido ou periciado na fase de inquérito policial; não há prova de que os passaportes supostamente requeridos por Maria na ligação telefônica foram, efetivamente, emitidos; não há prova de que houve o exaurimento do crime, nos termos do que prevê o §1o do artigo 317, do Código Penal, ou seja, que Antônio tenha efetivamente praticado ato infringindo dever funcional.
.     No que tange ao crime previsto no artigo 239, parágrafo único, da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), não há qualquer indício da prática delituosa por parte de Antônio, eis que não há sequer referência de que ele tivesse ciência da intenção de Maria. Em outras palavras, o candidato deverá indicar que não havia consciência de que Antônio estivesse colaborando para a prática do crime supostamente praticado por Maria, inexistindo, dessa forma dolo. Assim como no caso do crime anterior, afirmações genéricas de falta de justa causa não serão consideradas suficientes para obtenção da pontuação. Com efeito, é preciso que o candidato faça um cotejo entre o tipo penal (com seus elementos normativos, objetivos e subjetivos) e os fatos narrados no enunciado da questão. Dessa forma, relativamente à atipicidade do crime do art. 239, é indispensável que o candidato apontasse a ausência de dolo ou falasse do elemento subjetivo do tipo. Argumentos relacionados exclusivamente ao nexo causal não serão considerados aptos.
.     o final, o candidato deverá especificar provas, indicando rol de testemunhas. Os requerimentos devem ser de declaração das nulidades, absolvição sumária e, alternativamente, instrução processual com produção da prova requerida pela defesa. Para pontuar o pedido não é necessário que o candidato faça todos os pedidos constantes do gabarito, mas que seus pedidos estejam coerentes com a argumentação desenvolvida na peça. Por outro lado, se houver argumentos flagrantemente equivocados em maior número do que adequados, o pedido deixará de ser pontuado. No pedido, não foi admitida absolvição com fulcro no art. 386 e do 415 do Código de Processo Penal, já que ele trata das hipóteses de absolvição após o transcurso do processo, e não na fase de resposta.
.     O último dia do prazo é 08.11.2010, eis que a contagem inicia na data da intimação pessoal. Não serão aceitas datas como 06 ou 07 de novembro, pois o enunciado é claro ao especificar que a petição deveria ser protocolada no último dia do prazo, o qual se prorrogou até o dia útil subsequente. Erros como 08 de outubro e 08 de setembro (ou qualquer outra data) serão considerados insuscetíveis de pontuação.
.     Por fim, o gabarito não contempla nenhuma atribuição de pontuação para as argumentações relativas à: (1) ausência de notificação para apresentar resposta preliminar (art. 514, Código de Processo Penal); (2) nulidade da decisão que decretou a quebra do sigilo bancário. Também não será atribuída pontuação á simples narrativa dos fatos nem às afirmações genéricas de que não havia justa causa para a ação penal.



É NECESSÁRIA A PROVA DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO MENOR PARA A CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES?

BSERVAÇÕES PRÉVIAS: Súmula 500 do STJ. RESPOSTA: NÃO "O crime de corrupção de menores, por ser delito formal e de perigo a...