O art. 123 do Código Penal Militar não contempla a hipótese de perdão judicial como causa de
extinção da punibilidade e, ainda que in bonan partem, não se aplica, por analogia, o art. 121, § 5º, do
Código Penal (“§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as
conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne
desnecessária”). Na espécie, o paciente fora condenado por homicídio culposo por não ter observado as
normas de segurança quanto ao manejo de armas de fogo e, tampouco, regra técnica de profissão, o que
causara o resultado morte. Observou-se que o art. 123 do CPM traria os casos de extinção de punibilidade
e de seu rol não constaria o perdão judicial, embora essa possibilidade estivesse prevista no art. 255 do
mesmo diploma, a cuidar de receptação culposa. Aduziu-se que a analogia pressuporia lacuna, omissão na
lei e, na situação, tratar-se-ia de silêncio eloquente.
HC 116254/SP, rel. Min. Rosa Weber, 25.6.2013. (HC-116254)
(Informativo 712, 1ª Turma)
domingo, 1 de abril de 2018
Crime culposo e agravante por motivo torpe
A 1ª Turma concedeu ordem de habeas corpus para retirar o agravamento correspondente a ¼ da
pena-base da reprimenda imposta ao condenado. Na espécie, o paciente, militar, determinara a
subordinado, então condutor do veículo, que lhe entregasse a direção, embora não possuísse carteira de
motorista. Após assumir a direção, ocorrera acidente pelo qual fora condenado por lesão corporal e
homicídio culposo com a agravante do motivo torpe. No caso, considerara-se como qualificadora a
futilidade do motivo que levou o réu a tomar para si o volante da viatura, (…) por mero capricho. A Turma
entendeu que, tendo em vista que nos crimes culposos seria necessário aferir o grau de culpabilidade do
agente, não seria possível, em um segundo momento, analisar circunstância, com a exceção da
reincidência, que revelasse o seu maior grau de culpabilidade, sob pena de incorrer em bis in idem.
HC 120165/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 11.2.2014. (HC-120165)
(Informativo 735, 1ª Turma)
Princípio da consunção na justiça militar
É cabível o trancamento da ação penal militar instaurada em desfavor de réu, pelo crime de
abandono de posto, por ter sido apenas crime-meio para alcançar o delito-fim de deserção, posteriormente
arquivado. Com base nesse entendimento, a 2ª Turma deu provimento a recurso ordinário em “habeas
corpus” para trancar a ação penal militar instaurada contra o recorrente. No caso, além de denunciado
pelo crime de abandono de posto, contra ele fora instaurada instrução provisória de deserção (CPM, art.
187). Posteriormente, fora licenciado perante a organização militar por ter sido considerado incapaz em
inspeção de saúde, razão pela qual o expediente referente à deserção fora arquivado. A Turma destacou
que o motivo de ambos os delitos teria sido o mesmo. Dessa forma, o abandono de lugar de serviço, no
caso, teria composto a linha de desdobramento da ofensa maior ao bem jurídico: deserção. Demonstrado
que a intenção do recorrente era desertar, inexistiria justa causa para o prosseguimento da ação penal de
abandono de posto. Asseverou não estar caracterizado concurso material de crimes (duas ações
autônomas), a incidir, na hipótese, o fenômeno da absorção de um crime por outro.
RHC 125112/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.2.2014. (RHC-125112)
(Informativo 774, 2ª Turma)
Crime de dirigir sem habilitação e lesão corporal culposa na direção de veículo
A Segunda Turma concedeu a ordem de “habeas corpus” para restabelecer a decisão de 1º grau que
rejeitara a denúncia quanto ao crime de dirigir sem habilitação. No caso, o paciente teria sido denunciado
pela suposta prática do delito em comento (CTB, art. 309), uma vez que, ao conduzir automóvel em via
pública sem documento, colidira com outro automóvel, causando lesões em passageiros de seu veículo. O
juízo entendera que o delito do art. 309 do CTB teria sido absorvido pela conduta de praticar lesão corporal
culposa na direção de veículo automotor, tipificada no art. 303 do CTB, crime de ação pública condicionada
à representação, que não fora formalizada no caso concreto, o que teria dado ensejo à extinção da
punibilidade. Em seguida, a apelação interposta pelo Ministério Público fora provida para anular a sentença
e determinar o prosseguimento do feito referente ao crime de dirigir sem habilitação, decisão que fora
mantida pelo STJ. A Turma consignou que o crime de dirigir sem habilitação seria absorvido pelo delito de
lesão corporal culposa em direta aplicação do princípio da consunção. Isso porque, de acordo com o CTB, já
seria causa de aumento de pena para o crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor o
fato de o agente não possuir permissão para dirigir ou carteira de habilitação. Assim, em decorrência da
vedação de “bis in idem”, não se poderia admitir que o mesmo fato fosse atribuído ao paciente como crime
autônomo e, simultaneamente, como causa especial de aumento de pena. Além disso, o crime do art. 303 do
CTB, imputado ao paciente, seria de ação pública condicionada à representação, que, como se inferiria da própria nomenclatura, só poderia ser perseguido mediante a representação do ofendido. Diante da ausência
de representação, seria imperativo reconhecer a extinção da punibilidade do crime de dirigir sem habilitação.
HC 128921/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.8.2015. (HC-128921)
(Informativo 796, 2ª Turma)
Crime de tortura e regime inicial de cumprimento da pena
O condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado, nos termos do
disposto no § 7º do art. 1º da Lei 9.455/1997 - Lei de Tortura. Com base nessa orientação, a Primeira Turma
denegou pedido formulado em “habeas corpus”, no qual se pretendia o reconhecimento de constrangimento
ilegal consubstanciado na fixação, em sentença penal transitada em julgado, do cumprimento das penas
impostas aos pacientes em regime inicialmente fechado. Alegavam os impetrantes a ocorrência de violação
ao princípio da individualização da pena, uma vez que desrespeitados os artigos 33, § 3º, e 59 do CP.
Apontavam a existência de similitude entre o disposto no artigo 1º, § 7º, da Lei de Tortura e o previsto no
art. 2º, § 1º, da Lei de Crimes Hediondos, dispositivo legal que já teria sido declarado inconstitucional pelo
STF no julgamento do HC 111.840/ES (DJe de 17.12.2013). Salientavam, por fim, afronta ao Enunciado
719 da Súmula do STF. O Ministro Marco Aurélio (relator) denegou a ordem. Considerou que, no caso, a
dosimetria e o regime inicial de cumprimento das penas fixadas atenderiam aos ditames legais. Asseverou
não caber articular com a Lei de Crimes Hediondos, pois a regência específica (Lei 9.455/1997) prevê
expressamente que o condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado, o
que não se confundiria com a imposição de regime de cumprimento da pena integralmente fechado.
Assinalou que o legislador ordinário, em consonância com a CF/1988, teria feito uma opção válida, ao
prever que, considerada a gravidade do crime de tortura, a execução da pena, ainda que fixada no mínimo
legal, deveria ser cumprida inicialmente em regime fechado, sem prejuízo de posterior progressão. Os
Ministros Roberto Barroso e Rosa Weber acompanharam o relator, com a ressalva de seus entendimentos
pessoais no sentido do não conhecimento do “writ”. O Ministro Luiz Fux, não obstante entender que o
presente “habeas corpus” faria as vezes de revisão criminal, ante o trânsito em julgado da decisão
impugnada, acompanhou o relator.
HC 123316/SE, rel. Min. Marco Aurélio, 9.6.2015. (HC-123316)
(Informativo 789, 1ª Turma)
Lei de drogas e princípio da consunção
A Segunda Turma conheceu parcialmente e, nessa extensão, concedeu, em parte, a ordem em
“habeas corpus”, para restabelecer a sentença imposta ao paciente pelo juízo singular, com o decotamento
da confissão espontânea fixado em 2º grau. Na espécie, ele fora condenado pela prática de tráfico de
drogas e associação para o tráfico (Lei 11.343/2006, artigos 33 e 35). O tribunal local, ao apreciar as
apelações da acusação e da defesa, reduzira a pena referente ao tráfico, mas condenara o réu com relação
aos delitos dos artigos 33, § 1º, I; e 34 da Lei 11.343/2006. No “habeas”, sustentava-se a existência de
irregularidades quanto às transcrições de escutas telefônicas colhidas em investigação; a ilegalidade
quanto à pena-base; a ocorrência do princípio da consunção, considerados os delitos de tráfico e dos
artigos 33, § 1º, I; e 34 da Lei 11.343/2006; a inexistência do crime de associação para o tráfico; a
ilegalidade quanto à incidência da agravante do art. 62, I, do CP; e a ocorrência de tráfico privilegiado. A
Turma assinalou não haver nulidade quanto às transcrições de interceptações telefônicas, que teriam sido
devidamente disponibilizadas, sem que a defesa, entretanto, houvesse solicitado a transcrição total ou
parcial ao longo da instrução. Ademais, entendeu que, dadas as circunstâncias do caso concreto, seria
possível a aplicação do princípio da consunção, que se consubstanciaria pela absorção dos delitos
tipificados nos artigos 33, § 1º, I, e 34 da Lei 11.343/2006, pelo delito previsto no art. 33, “caput”, do
mesmo diploma legal. Ambos os preceitos buscariam proteger a saúde pública e tipificariam condutas que
— no mesmo contexto fático, evidenciassem o intento de traficância do agente e a utilização dos
aparelhos e insumos para essa mesma finalidade — poderiam ser consideradas meros atos preparatórios
do delito de tráfico previsto no art. 33, “caput”, da Lei 11.343/2006. Quanto às demais alegações, não
haveria vícios aptos a redimensionar a pena-base fixada, bem assim estaria demonstrada a existência de
associação para o tráfico. Além disso, a suposta ocorrência de tráfico privilegiado não poderia ser
analisada, por demandar análise fático-probatória. Por fim, a questão relativa à incidência do art. 62, I, do
CP, não teria sido aventada perante o STJ, e sua análise implicaria supressão de instância.
HC 109708/SP, rel. Min. Teori Zavascki, 23.6.2015. (HC-109708)
(Informativo 791, 2ª Turma)
Princípio da consunção: homicídio e posse ilegal de arma
A 1ª Turma, por maioria, julgou extinto “habeas corpus” em que se discutia a aplicabilidade do
princípio da consunção em hipótese de prática de homicídio com o uso de arma de fogo de
numeração raspada. No caso, o paciente fora absolvido sumariamente em relação ao delito de
homicídio, uma vez sua conduta haver caracterizado legítima defesa. Não obstante, remanescia a
persecução penal no tocante ao crime de posse e porte de arma de fogo. A Turma reputou que os
tipos penais seriam diversos, e que a excludente de ilicitude reconhecida quanto ao homicídio não
alcançaria a posse ilegal de arma de fogo com numeração raspada. Vencido o Ministro Luiz Fux
(relator), que concedia a ordem de ofício, por entender incidir o princípio da consunção.
HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 24.2.2015. (HC-120678)
(Informativo 775, 1ª Turma)
Ação penal e prescrição em perspectiva
Não se admite a denominada prescrição em perspectiva, haja vista a inexistência de previsão legal
do instituto. Com base nessa orientação, a Primeira Turma negou provimento a agravo regimental em que
se impugnava decisão monocrática que determinara o prosseguimento de inquérito, ouvindo-se o
Ministério Público Federal quanto a possíveis diligências. Na espécie, em face da diplomação de um dos
investigados no cargo de deputado federal, os autos foram remetidos ao STF. A Turma destacou que, por
ocasião do julgamento do presente recurso, o agravante não mais deteria prerrogativa de foro, porém,
competiria ao STF processar e julgar o agravo regimental em que se impugna decisão monocrática de
integrante da Corte. Apontou a inadequação da decisão do juízo de origem que teria prejulgado ação
penal que sequer fora proposta, ao aventar uma possível penalidade e, a partir da pena hipotética,
pronunciar a prescrição da pretensão punitiva. Afastada a prescrição e o arquivamento dos autos, a Turma
determinou a remessa do inquérito ao juiz da vara criminal competente.
Inq 3574 AgR/MT, rel. Min. Marco Aurélio, 2.6.2015. (Inq-3574)
(Informativo 788, 1ª Turma)
Marco temporal da prescrição em 2ª instância: sessão de julgamento ou publicação do acórdão
A prescrição da pretensão punitiva do Estado, em segundo grau de jurisdição, se interrompe na data
da sessão de julgamento do recurso e não na data da publicação do acórdão. Com base nesse
entendimento, a 1ª Turma, por maioria, negou provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” em que
se alegava a extinção da punibilidade do delito pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. O
Colegiado afirmou que, por se tratar de acórdão, a publicação do ato ocorreria com a realização da sessão
de julgamento. O Ministro Roberto Barroso enfatizou que a prescrição seria a perda de uma pretensão
pelo seu não exercício, dentro de um determinado prazo. Portanto, a prescrição estaria associada à inércia
do titular do direito. Dessa forma, com a realização da sessão de julgamento, não se poderia reconhecer
essa inércia. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso. Reputava que a
interrupção da prescrição só ocorreria com a publicação da sentença ou acórdão condenatório recorrível
(CP, art. 117, IV). Pontuava que o acórdão somente se tornaria recorrível com a sua confecção.
Observava que a publicação do aresto teria ocorrido cinco meses depois da sessão de julgamento.
RHC 125078/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 3.3.2015. (RHC-125078)
(Informativo 776, 1ª Turma)
Inviolabilidade de domicílio e flagrante delito
A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno,
quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro
da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do
agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados. Essa a orientação do Plenário, que reconheceu
a repercussão geral do tema e, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia,
à luz do art. 5º, XI, LV e LVI, da Constituição, a legalidade das provas obtidas mediante invasão de
domicílio por autoridades policiais sem o devido mandado de busca e apreensão. O acórdão impugnado
assentara o caráter permanente do delito de tráfico de drogas e mantivera condenação criminal fundada
em busca domiciliar sem a apresentação de mandado de busca e apreensão. A Corte asseverou que o texto
constitucional trata da inviolabilidade domiciliar e de suas exceções no art. 5º, XI (“a casa é asilo
inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso
de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”).
Seriam estabelecidas, portanto, quatro exceções à inviolabilidade: a) flagrante delito; b) desastre; c)
prestação de socorro; e d) determinação judicial. A interpretação adotada pelo STF seria no sentido de
que, se dentro da casa estivesse ocorrendo um crime permanente, seria viável o ingresso forçado pelas
forças policiais, independentemente de determinação judicial. Isso se daria porque, por definição, nos
crimes permanentes, haveria um interregno entre a consumação e o exaurimento. Nesse interregno, o
crime estaria em curso. Assim, se dentro do local protegido o crime permanente estivesse ocorrendo, o
perpetrador estaria cometendo o delito. Caracterizada a situação de flagrante, seria viável o ingresso
forçado no domicílio. Desse modo, por exemplo, no crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/2006, art. 33),
estando a droga depositada em uma determinada casa, o morador estaria em situação de flagrante delito,
sendo passível de prisão em flagrante. Um policial, em razão disso, poderia ingressar na residência, sem
autorização judicial, e realizar a prisão. Entretanto, seria necessário estabelecer uma interpretação que
afirmasse a garantia da inviolabilidade da casa e, por outro lado, protegesse os agentes da segurança
pública, oferecendo orientação mais segura sobre suas formas de atuação. Nessa medida, a entrada
forçada em domicílio, sem uma justificativa conforme o direito, seria arbitrária. Por outro lado, não seria
a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificaria a medida. Ante o que
consignado, seria necessário fortalecer o controle “a posteriori”, exigindo dos policiais a demonstração de
que a medida fora adotada mediante justa causa, ou seja, que haveria elementos para caracterizar a
suspeita de que uma situação a autorizar o ingresso forçado em domicílio estaria presente. O modelo
probatório, portanto, deveria ser o mesmo da busca e apreensão domiciliar — apresentação de “fundadas
razões”, na forma do art. 240, §1º, do CPP —, tratando-se de exigência modesta, compatível com a fase
de obtenção de provas. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que provia o recurso por entender que não
estaria configurado, na espécie, o crime permanente.
RE 603616/RO, rel. Min. Gilmar Mendes, 4 e 5.11.2015. (RE-603616)
(Informativo 806, Plenário, Repercussão Geral)
Norma penal militar e discriminação sexual
As expressões “pederastia ou outro” — mencionada na rubrica enunciativa referente ao art. 235
do CPM — e “homossexual ou não” — contida no aludido dispositivo — não foram recepcionadas
pela Constituição (“Pederastia ou outro ato de libidinagem - Art. 235. Praticar, ou permitir o militar
que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração milita r:
Pena - detenção, de seis meses a um ano”). Essa a conclusão do Plenário que, por maioria, julgou
parcialmente procedente pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental
proposta contra a referida norma penal. De início, o Tribunal conheceu do pedido. No ponto,
considerou que os preceitos tidos como violados possuiriam caráter inequivocamente fundamental (CF,
artigos 1º, III e V; 3º, I e IV; e 5º, “caput”, I, III, X e XLI). Além disso, o diploma penal militar seria
anterior à Constituição, de modo que não caberia ação direta de inconstitucionalidade para questionar
norma nele contida. Assim, não haveria outro meio apto a sanar a suposta lesão aos preceitos
fundamentais. No mérito, o Colegiado apontou que haveria um paralelo entre as condutas do art. 233
do CP (ato obsceno) e 235 do CPM. Na norma penal comum, o bem jurídico protegido seria o poder
público. Na norma penal militar, por outro lado, o bem seria a administração militar, tendo em conta a
disciplina e a hierarquia, princípios estes com embasamento constitucional (CF, artigos 42 e 142).
Haveria diferenças não discriminatórias entre a vida civil e a vida da caserna, marcada por valores que
não seriam usualmente exigidos, de modo cogente e imperativo, aos civis. Por essa razão, a tutela penal
do bem jurídico protegido pelo art. 235 do CPM deveria se manter. Acresceu, entretanto, que o aludido
dispositivo, embora pudesse ser aplicado a heterossexuais e a homossexuais, homens e mulheres, teria
o viés de promover discriminação em desfavor dos homossexuais, o que seria inconstitucional, haja
vista a violação dos princípios da dignidade humana e da igualdade, bem assim a vedação à
discriminação odiosa. Desse modo, a lei não poderia se utilizar de expressões pejorativas e
discriminatórias, considerado o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual como
liberdade essencial do indivíduo. Vencidos os Ministros Rosa Weber e Celso de Mello, que acolhiam
integralmente o pedido para declarar não recepcionado pela Constituição o art. 235 do CPM em sua
integralidade.
ADPF 291/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 28.10.2015. (ADPF-291)
(Informativo 805, Plenário)
Uso de munição como pingente e atipicidade
É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição desacompanhada de arma.
Com base nessa orientação, a Segunda Turma concedeu a ordem em “habeas corpus” para restabelecer a
decisão de tribunal local que absolvera o paciente. Na espécie, o paciente portava — como pingente —
munição de uso proibido sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (Lei
10.826/20013, art. 16, “caput”). Condenado em primeira instância à pena de três anos de reclusão,
substituída por duas penas restritivas de direitos, fora absolvido pelo tribunal local.
Segundo a Corte estadual, a conduta imputada ao sentenciado não representava qualquer perigo de
lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico tutelado pelo art. 16, “caput”, da Lei 10.826/2003.
A condenação fora restabelecida pelo STJ para afastar a atipicidade da conduta, objeto do presente
“habeas”. A Turma apontou que, no caso concreto, o comportamento do paciente não oferecera perigo,
abstrato ou concreto.
HC 133984/MG, rel. Min. Cármen Lúcia, 17.5.2016. (HC-133984)
(Informativo 826, 2ª Turma)
“Habeas corpus” e regime de cumprimento de pena
A Primeira Turma, por maioria, concedeu a ordem em “habeas corpus” em que se pretendia alterar
o regime inicial de cumprimento de pena e substituir a pena privativa de liberdade pela restritiva de
direitos.
Na espécie, o paciente foi condenado à pena de dois anos de reclusão, em regime inicial fechado, e
ao pagamento de duzentos dias-multa. Isso ocorreu em razão da prática do delito tipificado no art. 33,
“caput”, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), com a incidência de causa de diminuição da pena prevista
no § 4º do referido dispositivo legal.
Segundo a defesa, não haveria justificativa legal para a imposição de regime inicial fechado de
cumprimento da pena. Alegava, ainda, que seria inconstitucional a vedação da substituição da pena
privativa de liberdade pela restritiva de direitos no âmbito da Lei de Drogas e que o paciente, antes da
concessão da medida liminar, já teria cumprido mais da metade da pena em regime fechado.
A Turma decidiu que, em caso de réu não reincidente, tendo sido a pena base fixada em seu mínimo
legal e sendo positivas as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal (CP), é cabível a
imposição do regime aberto de cumprimento da pena e a substituição da pena privativa de liberdade pela
restritiva de direitos, a teor dos arts. 33 e 44 do CP.
Os ministros Roberto Barroso e Rosa Weber, com ressalva de seus entendimentos pessoais quanto
ao não cabimento do “writ”, impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de
Justiça, concederam a ordem de ofício, nos termos do voto do ministro Marco Aurélio (relator).
Vencido o ministro Edson Fachin, que denegava a ordem por entender que a natureza e a quantidade
da substância ou do produto, bem como a personalidade e a conduta social do agente deveriam
preponderar sobre as circunstâncias judiciais genéricas do art. 59 do CP, conforme dicção expressa do art.
42 da Lei de Drogas.
HC 129714/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 11.10.2016. (HC-129714)
(Informativo 843, 1ª Turma)
Impossibilidade de trancamento de ação penal via “habeas corpus
A Primeira Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciado pela
prática do crime de estupro de vulnerável (Código Penal, art. 217-A).
No caso, o paciente, aos dezoito anos de idade, manteve relação sexual com a vítima, de treze anos de
idade. Na impetração, sustentava-se ausência de justa causa pela atipicidade da conduta, pois a conjunção
carnal teria sido consentida pela vítima, em razão de relacionamento afetivo com o paciente.
O Colegiado reafirmou entendimento segundo o qual, sendo a vítima menor de quatorze anos, o estupro
é presumido, embora se trate de dois jovens, com idades próximas, em relacionamento afetivo. A ministra Rosa
Weber destacou, ainda, o fato de o paciente estar solto.
Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedia a ordem para trancar a ação penal. Afirmava
não existir crime presumido e considerava que a condição de vítima não se verificaria quando, nos dias atuais,
menor de quatorze anos aquiesce em manter relação sexual.
HC 122945/BA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso,
julgamento em 21.3.2017.
(Informativo 858, 1ª Turma)
Tipicidade HC: Crime militar impróprio e competência
A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, indeferiu a ordem em habeas corpus pelo qual se
discutia a competência para o julgamento de militar denunciado pela suposta prática do crime de
falsidade ideológica na forma continuada [CPM, art. 312, c/c o art. 80 (1)]. No caso, o paciente
teria atestado, falsamente, a regularidade técnica para navegação de embarcações civis. A defesa
alega a incompetência da justiça militar para o julgamento do feito (Informativo 755).
A Turma apontou que o crime em comento tem natureza formal. Configura -se, portanto,
independentemente do resultado e, ademais, é praticado em detrimento da fé públic a militar.
Incide, portanto, o art. 9º, II, “e”, do CPM (2); e o art. 124 da CF (3).
Vencido o ministro Luiz Fux (relator), que concedeu a ordem.
(1) CPM: “Art. 312. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar, ou nêle inserir ou
fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade
sôbre fato jurìdicamente relevante, desde que o fato atente contra a administração ou o serviço militar: Pena - reclusão, até cinco
anos, se o documento é público; reclusão, até três anos, se o documento é particular. (...) Art. 80. Aplica-se a regra do artigo
anterior, quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições
de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser considerados como continuação do
primeiro”.
(2) CPM: “Art. 9º. Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: II - os crimes previstos neste Código, embora
também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: ... e) por militar em situação de atividade, ou
assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar”.
(3) CF: “Art. 124. à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei”.
HC 110233/AM, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, julgamento em
10.10.2017.
(Informativo 881, Primeira Turma)
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