PRINCIPAIS
INFORMATIVOS DO STJ 2013 e 2014 SOBRE MATERIA PENAL E PROCESSUAL PENAL –TESES DEFENSIVAS -
DIREITO
PENAL. NECESSIDADE DE GRADAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART.
46 DA LEI 11.343/2006 CONFORME O GRAU DE INCAPACIDADE DO RÉU.
Reconhecida a
semi-imputabilidade do réu, o Juiz não pode aplicar a causa de diminuição de
pena prevista no art. 46 da Lei 11.343/2006 em seu grau mínimo (1/3) sem expor
qualquer dado substancial, em concreto, que justifique a adoção dessa fração.
De acordo com o referido artigo, a pena pode ser reduzida de um terço a dois
terços se, por força de determinadas circunstâncias, o agente não possuía, ao
tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito
do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. A diminuição da
pena, nessa situação, deve ser avaliada de acordo com o grau de deficiência
intelectiva do réu, vale dizer, de sua capacidade de autodeterminação. Nesse
contexto, a ausência da justificativa para aplicação do redutor em seu grau
mínimo viola o princípio do livre convencimento motivado, malferindo o disposto
no art. 93, IX, da CF. HC 167.376-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em
23/9/2014 (Informativo nº 547).
DIREITO
PENAL. CAUSA DE AUMENTO DA PENA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS EM TRANSPORTE
PÚBLICO. A utilização de transporte público com a única finalidade
de levar a droga ao destino, de forma oculta, sem o intuito de disseminá-la
entre os passageiros ou freqüentadores do local, não implica a incidência da
causa de aumento de pena do inciso III do artigo 40 da Lei 11.343/2006.
Precedente citado do STJ: REsp 1.345.827-AC, Quinta Turma, DJe 27/3/2014.
Precedentes citados do STF: HC 119.782-MS, Primeira Turma, DJe 3/2/2014; e HC
119.811-MS, Segunda Turma, DJe 1º/7/2014.. REsp 1.443.214-MS, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/9/2014 (Vide Informativo n. 543)
(Informativo nº 547).
DIREITO
PENAL. CONFISSÃO QUALIFICADA.
A confissão qualificada –
aquela na qual o agente agrega teses defensivas discriminantes ou exculpantes
–, quando efetivamente utilizada como elemento de convicção, enseja a aplicação
da atenuante prevista na alínea d do inciso III do artigo 65 do CP. Precedentes
citados: AgRg no REsp 1.384.067-SE, Quinta Turma, DJe 12/2/2014; e AgRg no REsp
1.416.247-GO, Sexta Turma, DJe 15/5/2014. AgRg no REsp 1.198.354-ES, Rel. Min.
Jorge Mussi, julgado em 16/10/2014 (Informativo nº 551).
DIREITO
PENAL. SUBSTITUIÇÃO DA PENA NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.
O fato de o tráfico de
drogas ser praticado com o intuito de introduzir substâncias ilícitas em
estabelecimento prisional não impede, por si só, a substituição da pena
privativa de liberdade por restritivas de direitos, devendo essa circunstância
ser ponderada com os requisitos necessários para a concessão do benefício.
Precedentes citados do STJ: AgRg no REsp 1.370.835-DF, Quinta Turma, DJe
29/5/2013 e AgRg no REsp 1.326.532/DF, Sexta Turma, DJe 14/11/2013. Precedente
citado do STF: RHC 112.706, Primeira Turma, DJe 7/3/2013. AgRg no REsp
1.359.941-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/2/2014 (Informativo
nº 536).
DIREITO
PENAL. CONDENAÇÕES POR FATOS POSTERIORES AO CRIME EM JULGAMENTO.
Na dosimetria da pena, os
fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizados como
fundamento para valorar negativamente a culpabilidade, a personalidade e a
conduta social do réu. Precedentes citados: HC 268.762-SC, Quinta Turma, DJe
29/10/2013 e HC 210.787-RJ, Quinta Turma, DJe 16/9/2013. HC 189.385- RS, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014 (Informativo nº 535).
DIREITO
PENAL. ABSORÇÃO DOS CRIMES DE FALSIDADE IDEOLÓGICA E DE USO DE DOCUMENTO FALSO
PELO DE SONEGAÇÃO FISCAL.
O crime de sonegação fiscal
absorve o de falsidade ideológica e o de uso de documento falso praticados
posteriormente àquele unicamente para assegurar a evasão fiscal. Após evolução
jurisprudencial, o STJ passou a considerar aplicável o princípio da consunção
ou da absorção quando os crimes de uso de documento falso e falsidade
ideológica – crimes meio – tiverem sido praticados para facilitar ou encobrir a
falsa declaração, com vistas à efetivação do pretendido crime de sonegação
fiscal – crime fim –, localizando-se na mesma linha de desdobramento causal de
lesão ao bem jurídico, integrando, assim, o iter criminis do delito fim. Cabe
ressalvar que, ainda que os crimes de uso de documento falso e falsidade
ideológica sejam cometidos com o intuito de sonegar o tributo, a aplicação do
princípio da consunção somente tem lugar nas hipóteses em que os crimes meio
não extrapolem os limites da incidência do crime 181 fim. Aplica-se, assim,
mutatis mutandis, o comando da Súmula 17 do STJ (Quando o falso se exaure no
estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido). Precedentes
citados: AgRg no REsp 1.366.714-MG, Quinta Turma, DJe 5/11/2013; AgRg no REsp
1.241.771-SC, Sexta Turma, DJe 3/10/2013. EREsp 1.154.361-MG, Rel. Min. Laurita
Vaz, julgado em 26/2/2014 (Informativo nº 535).
DIREITO
PENAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO POR OMISSÃO DE ANOTAÇÃO NA CTPS.
A simples omissão de
anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) não configura, por
si só, o crime de falsificação de documento público (art. 297, § 4º, do CP).
Isso porque é imprescindível que a conduta do agente preencha não apenas a
tipicidade formal, mas antes e principalmente a tipicidade material, ou seja,
deve ser demonstrado o dolo de falso e a efetiva possibilidade de vulneração da
fé pública. Com efeito, o crime de falsificação de documento público trata-se
de crime contra a fé pública, cujo tipo penal depende da verificação do dolo,
consistente na vontade de falsificar ou alterar o documento público, sabendo o
agente que o faz ilicitamente. Além disso, a omissão ou alteração deve ter
concreta potencialidade lesiva, isto é, deve ser capaz de iludir a percepção
daquele que se depare com o documento supostamente falsificado. Ademais, pelo
princípio da intervenção mínima, o Direito Penal só deve ser invocado quando os
demais ramos do Direito forem insuficientes para proteger os bens considerados
importantes para a vida em sociedade. Como corolário, o princípio da
fragmentariedade elucida que não são todos os bens que têm a proteção do
Direito Penal, mas apenas alguns, que são os de maior importância para a vida
em sociedade. Assim, uma vez verificado que a conduta do agente é
suficientemente reprimida na esfera administrativa, de acordo com o art. 47 da
CLT, a simples omissão de anotação não gera conseqüências que exijam repressão
pelo Direito Penal. REsp 1.252.635-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 24/4/2014 (Informativo nº 539)
DIREITO
PENAL. ATIPICIDADE DA FALSA DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA PARA OBTENÇÃO DE
JUSTIÇA GRATUITA.
É atípica a mera declaração
falsa de estado de pobreza realizada com o intuito de obter os benefícios da
justiça gratuita. O art. 4º da Lei 1.060/1950 dispõe que a sanção aplicada
àquele que apresenta falsa declaração de hipossuficiência é meramente
econômica, sem previsão de sanção penal. Além disso, tanto a jurisprudência do
STJ e do STF quanto a doutrina entendem que a mera declaração de
hipossuficiência inidônea não pode ser considerada documento para fins penais.
Precedentes citados do STJ: HC 218.570-SP, Sexta Turma, DJe 5/3/2012; HC
217.657-SP, Sexta Turma, DJe 22/2/2012; e HC 105.592-RJ, Quinta Turma, DJe
19/4/2010. Precedente citado do STF: HC 85.976-MT, Segunda Turma, DJ 24/2/2006.
HC 261.074-MS, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora convocada do TJ-SE),
julgado em 5/8/2014 (Informativo nº 546).
DIREITO
PENAL. ELEMENTO SUBJETIVO DO CRIME DE CALÚNIA.
A manifestação do advogado
em juízo para defender seu cliente não configura crime de calúnia se emitida
sem a intenção de ofender a honra. Isso porque, nessa situação, não se verifica
o elemento subjetivo do tipo penal. Com efeito, embora a imunidade do advogado
no exercício de suas funções incida somente sobre os delitos de injúria e de
difamação (art. 142, I, do CP), para a configuração de quaisquer das figuras
típicas dos crimes contra a honra – entre eles, a calúnia – faz-se necessária a
intenção de ofender o bem jurídico tutelado. Nesse contexto, ausente a intenção
de caluniar (animus caluniandi), não pode ser imputado ao advogado a prática de
calúnia. Rcl 15.574-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 9/4/2014
(Informativo nº 539).
DIREITO
PENAL. CARACTERIZAÇÃO DO TIPO PENAL DO ART. 102 DO ESTATUTO DO IDOSO.
Incorre no tipo penal
previsto no art. 102 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) – e não no tipo
penal de furto (art. 155 do CP) – o estagiário de instituição financeira que se
utiliza do cartão magnético e da senha de acesso à conta de depósitos de pessoa
idosa para realizar transferências de valores para sua conta pessoal. O tipo
penal previsto no art. 102 da Lei 10.741/2003 tem a seguinte redação:
“Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro
rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade”. Na
hipótese, o autor do delito desviou bens da vítima. Para essa conduta, não há
necessidade de prévia posse por parte do agente, restrita à hipótese de
apropriação. Da mesma forma, é evidente que a transferência dos valores da
conta bancária da vítima para conta pessoal do autor desviou os bens de sua
finalidade. Não importa perquirir qual seria a real destinação desses valores
(finalidade), pois, independente de qual fosse, foram eles dela desviados, ao
serem, por meio de fraude, transferidos para a conta do autor. REsp
1.358.865-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/9/2014 (Informativo
nº 547).
DIREITO
PENAL. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 12.015/2009.
O condenado por estupro e
atentado violento ao pudor, praticados no mesmo contexto fático e contra a
mesma vítima, tem direito à aplicação retroativa da Lei 12.015/2009, de modo a
ser reconhecida a ocorrência de crime único, devendo a prática de ato
libidinoso diverso da conjunção carnal ser valorada na aplicação da pena-base
referente ao crime de estupro. De início, cabe registrar que, diante do
princípio da continuidade normativa, não há falar em abolitio criminis quanto
ao crime de atentado violento ao pudor cometido antes da alteração legislativa
conferida pela Lei 12.015/2009. A referida norma não descriminalizou a conduta
prevista na antiga redação do art. 214 do CP (que tipificava a conduta de
atentado violento ao pudor), mas apenas a deslocou para o art. 213 do CP,
formando um tipo penal misto, com condutas alternativas (estupro e atentado
violento ao pudor). Todavia, nos termos da jurisprudência do STJ, o
reconhecimento de crime único não implica desconsideração 186 absoluta da conduta
referente à prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, devendo tal
conduta ser valorada na dosimetria da pena aplicada ao crime de estupro,
aumentando a pena-base. Precedentes citados: HC 243.678-SP, Sexta Turma, DJe
13/12/2013; e REsp 1.198.786-DF, Quinta Turma, DJe 10/04/2014. HC 212.305-DF,
Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora Convocada do TJ/SE), julgado em
24/4/2014 (Informativo nº 543)
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. DEMONSTRAÇÃO DA MATERIALIDADE DO CRIME PREVISTO NO
ART. 7º, IX, DA LEI 8.137/1990.
Para a demonstração da
materialidade do crime previsto no art. 7º, IX, da Lei 8.137/1990, é
imprescindível a realização de perícia para atestar se as mercadorias
apreendidas estavam em condições impróprias para o consumo. Precedentes citados
do STJ: AgRg no REsp 1.175.679-RS, Sexta Turma, DJe 28/3/2012; e HC 132.257-SP,
Quinta Turma, DJe 8/9/2011. Precedente citado do STF: HC 90.779-PR, Primeira
187 Turma, DJe 23/10/2008. AgRg no Resp 1.111.736-RS, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 17/12/2013 (Informativo nº 533).
DIREITO
PENAL. CONFIGURAÇÃO DE CRIME ÚNICO EM ROUBO PRATICADO NO INTERIOR DE ÔNIBUS.
Em roubo praticado no
interior de ônibus, o fato de a conduta ter ocasionado violação de patrimônios
distintos – o da empresa de transporte coletivo e o do cobrador – não
descaracteriza a ocorrência de crime único se todos os bens subtraídos estavam
na posse do cobrador. É bem verdade que a jurisprudência do STJ e do STF
entende que o roubo perpetrado com violação de patrimônios de diferentes
vítimas, ainda que em um único evento, configura concurso formal de crimes, e
não crime único. Todavia, esse mesmo entendimento não pode ser aplicado ao caso
em que os bens subtraídos, embora pertençam a pessoas distintas, estavam sob os
cuidados de uma única pessoa, a qual sofreu a grave ameaça ou violência.
Precedente citado: HC 204.316-RS, Sexta Turma, DJe 19/9/2011. AgRg no REsp
1.396.144-DF, Rel. Min. Walter de Almeida Guilherme (Desembargador Convocado do
TJ/SP), julgado em 23/10/2014 (Informativo nº 551).
DIREITO
PENAL. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
Aplica-se o princípio da
insignificância à conduta formalmente tipificada como furto consistente na
subtração, por réu primário e sem antecedentes, de um par de óculos avaliado em
R$ 200,00. A lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses
desprovidas de significação social, razão pela qual os princípios da
insignificância e da intervenção mínima surgem para evitar situações dessa
natureza, atuando como instrumentos de interpretação restrita do tipo penal.
Posto isso, conveniente trazer à colação excerto de julgado do STF (HC
98.152-MG, DJ 5/6/2009), no qual foram apresentados os requisitos necessários
para a aferição do relevo material da tipicidade penal: “O postulado da
insignificância – que considera necessária, na aferição do relevo material da
tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima
ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação,
(c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a
inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se, em seu processo de
formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema
penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a
intervenção mínima do Poder Público em matéria penal”. Na hipótese em análise,
verifica-se a presença dos referidos vetores, de modo a atrair a incidência do
princípio da insignificância. AgRg no RHC 44.461-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 27/5/2014 (Informativo nº 542).
DIREITO
PENAL. HIPÓTESE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
Aplica-se o princípio da
insignificância à conduta formalmente tipificada como furto tentado consistente
na tentativa de subtração de chocolates, avaliados em R$ 28,00, pertencentes a
um supermercado e integralmente recuperados, ainda que o réu tenha, em seus
antecedentes criminais, registro de uma condenação transitada em julgado pela
prática de crime da mesma natureza. A intervenção do Direito Penal há de ficar
reservada para os casos realmente necessários. Para o reconhecimento da
insignificância da ação, não se pode levar em conta apenas a expressão
econômica da lesão. Todas as peculiaridades do caso concreto devem ser
consideradas, como, por exemplo, o grau de reprovabilidade do comportamento do
agente, o valor do objeto, a restituição do bem, a repercussão econômica para a
vítima, a premeditação, a ausência de violência e o tempo do agente na prisão
pela conduta. Nem a reincidência nem a reiteração criminosa, tampouco a
habitualidade delitiva, são suficientes, por si sós e isoladamente, para
afastar a aplicação do denominado princípio da insignificância. Nesse contexto,
não obstante a certidão de antecedentes criminais indicar uma condenação
transitada em julgado em crime de mesma natureza, na situação em análise, a
conduta do réu não traduz lesividade efetiva e concreta ao bem jurídico
tutelado. Ademais, há de se ressaltar que o mencionado princípio não fomenta a
atividade criminosa. São outros e mais complexos fatores que, na verdade, têm
instigado a prática delitiva na sociedade moderna. HC 299.185-SP, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 9/9/2014 (Informativo nº 548).
DIREITO
PENAL. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA NO CRIME DE FURTO.
Aplica-se o princípio da
insignificância à conduta formalmente tipificada como furto consistente na
subtração, por réu primário, de bijuterias avaliadas em R$ 40 pertencentes a
estabelecimento comercial e restituídas posteriormente à vítima. De início, há
possibilidade de, a despeito da subsunção formal de um tipo penal a uma conduta
humana, concluir-se pela atipicidade material da conduta, por diversos motivos,
entre os quais a ausência de ofensividade penal do comportamento verificado.
Vale lembrar que, em atenção aos princípios da fragmentariedade e da
subsidiariedade, o Direito Penal apenas deve ser utilizado contra ofensas
intoleráveis a determinados bens jurídicos e nos casos em que os demais ramos
do Direito não se mostrem suficientes 192 para protegê-los. Dessa forma,
entende-se que o Direito penal não deve ocupar-se de bagatelas. Nesse contexto,
para que o magistrado possa decidir sobre a aplicação do princípio da
insignificância, faz-se necessária a ponderação do conjunto de circunstâncias que
rodeiam a ação do agente para verificar se a conduta formalmente descrita no
tipo penal afeta substancialmente o bem jurídico tutelado. Nessa análise, no
crime de furto, avalia-se notadamente: a) o valor do bem ou dos bens furtados;
b) a situação econômica da vítima; c) as circunstâncias em que o crime foi
perpetrado, é dizer, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o
concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de
considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima
etc.; e d) a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se
demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou estilo de vida, com
sucessivas ocorrências (reincidente ou não). Assim, caso seja verificada a
inexpressividade do comportamento do agente, fica afastada a intervenção do
Direito Penal. Precedentes citados do STJ: AgRg no REsp 1.400.317- MG, Sexta
Turma, DJe 13/12/2013; HC 208.770-RJ, Sexta Turma, DJe 12/12/2013. Precedentes
citados do STF: HC 115.246-MG, Segunda Turma, DJe 26/6/2013; HC 109.134-RS,
Segunda Turma, DJe 1º/3/2012. HC 208.569-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz,
julgado em 22/4/2014 (Informativo nº 540).
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE REDUÇÃO A
CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO.
Para configuração do delito
de “redução a condição análoga à de escravo” (art. 149 do CP) – de competência
da Justiça Federal – é desnecessária a restrição à liberdade de locomoção do
trabalhador. De fato, a restrição à liberdade de locomoção do trabalhador é uma
das formas de cometimento do delito, mas não é a única. Conforme se infere da
redação do art. 149 do CP, o tipo penal prevê outras condutas que podem ofender
o bem juridicamente tutelado, isto é, a liberdade de o indivíduo ir, vir e se
autodeterminar, dentre elas submeter o sujeito passivo do delito a condições de
trabalho degradantes, subumanas. Precedentes citados do STJ: AgRg no CC
105.026- MT, Terceira Seção, DJe 17/2/2011; CC 113.428-MG, Terceira Seção, DJe 1º/2/2011.
Precedente citado do STF: Inq 3.412, Tribunal Pleno, DJe 12/11/2012. CC
127.937- GO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 28/5/2014 (Informativo nº 543)
DIREITO
PENAL. APLICABILIDADE DO PERDÃO JUDICIAL NO CASO DE HOMICÍDIO CULPOSO NA
DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR.
O perdão judicial não pode
ser concedido ao agente de homicídio culposo na direção de veículo automotor
(art. 302 do CTB) que, embora atingido moralmente de forma grave pelas conseqüências
do acidente, não tinha vínculo afetivo com a vítima nem sofreu seqüelas físicas
gravíssimas e permanentes. Conquanto o perdão judicial possa ser aplicado nos
casos em que o agente de homicídio culposo sofra seqüelas físicas gravíssimas e
permanentes, a doutrina, quando se volta para o sofrimento psicológico do
agente, enxerga no § 5º do art. 121 do CP a exigência de um laço prévio entre
os envolvidos para reconhecer como “tão grave” a forma como as conseqüências da
infração atingiram o agente. A interpretação dada, na maior parte das vezes, é
no sentido de que só sofre intensamente o réu que, de forma culposa, matou
alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos. O exemplo mais comumente
lançado é o caso de um pai que mata culposamente o filho. Essa interpretação
desdobra se em um norte que ampara o julgador. Entender pela desnecessidade do
vínculo seria abrir uma fenda na lei, não desejada pelo legislador. Isso
porque, além de ser de difícil aferição o “tão grave” sofrimento, o argumento
da desnecessidade do vínculo serviria para todo e qualquer caso de delito de
trânsito com vítima fatal. Isso não significa dizer o que a lei não disse, mas
apenas conferir-lhe interpretação mais razoável e humana, sem perder de vista o
desgaste emocional que possa sofrer o acusado dessa espécie de delito, mesmo
que não conhecendo a vítima. A solidarização com o choque psicológico do agente
não pode conduzir a uma eventual banalização do instituto do perdão judicial, o
que seria no mínimo temerário no atual cenário de violência no trânsito, que
tanto se tenta combater. Como conclusão, conforme entendimento doutrinário, a
desnecessidade da pena que esteia o perdão judicial deve, a partir da nova
ótica penal e constitucional, referir-se à comunicação para a comunidade de que
o intenso e perene sofrimento do
infrator não justifica o reforço de vigência da norma por meio da sanção
penal. REsp 1.455.178-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 5/6/2014
(Informativo nº 542).
DIREITO
PENAL. PARÂMETRO PARA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AO CRIME DE
DESCAMINHO.
O valor de R$ 20 mil fixado
pela Portaria MF 75/2012 – empregado como critério para o arquivamento, sem
baixa na distribuição, das execuções fiscais de débitos inscritos na Dívida
Ativa da União – não pode ser utilizado como parâmetro para fins de aplicação
do princípio da insignificância aos crimes de descaminho. Inicialmente,
importante ressaltar que o entendimento, tanto do STF quanto do STJ (REsp
1.112.748-TO, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, DJe 13/10/2009), tem
sido o de que incide o princípio da insignificância no crime de descaminho
quando o valor dos tributos iludidos não ultrapassar o montante de R$ 10 mil,
valor este fixado pela Lei 10.522/2002 para servir como piso para arquivamento,
sem baixa nos autos, de execuções fiscais. Mais recentemente, o Ministério da
Fazenda editou a Portaria MF 75/2012, a qual elevou o valor de arquivamento
para R$ 20 mil. Desde então, o STF tem, em alguns de seus julgados, empregado o
referido patamar para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância ao
descaminho, quando o valor dos tributos iludidos não ultrapassar o montante de
R$ 20 mil. Não obstante esse entendimento, importante analisar a validade
formal da elevação do parâmetro pela Portaria MF 75/2012. Nesse passo,
ressalte-se que, atualmente, com o advento da Lei 10.522/2002, o Ministro da
Fazenda possui autonomia tão somente para estabelecer o cronograma,
determinando as prioridades e as condições a serem obedecidas quando forem
remetidos os débitos passíveis de inscrição em Dívida Ativa da União e cobrança
judicial pela Procuradoria da Fazenda Nacional. A lei não previu a competência
para que o Ministro da Fazenda, por meio de portaria, altere o valor fixado
como parâmetro para arquivamento de execução fiscal, sem baixa na distribuição.
Com isso, a alteração do valor para arquivamento de execução fiscal só pode ser
realizada por meio de lei, não sendo a referida portaria, portanto, meio
normativo válido para esse fim. Ademais, da leitura da aludida portaria,
extrai-se que o valor foi estabelecido para orientar a ação em sede
executivo-fiscal, com base apenas no custo benefício da operação; claramente,
portanto, como uma opção de política econômico-fiscal. Em vista disso,
importante ponderar: pode-se aceitar que o Poder Judiciário se veja limitado
por parâmetro definido por autoridade do Poder Executivo, estabelecido
unicamente por critérios de eficiência, economicidade, praticidade e as
peculiaridades regionais e/ou do débito? Afigura-se inusitada a compreensão de
que o Ministro da Fazenda, por meio de portaria, ao alterar 196 o patamar de
arquivamento de execuções fiscais de débitos com a Fazenda Pública, determine o
rumo da jurisdição criminal de outro Poder da República. Por fim, não há como
aplicar os princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade do Direito Penal
ao caso analisado. O caráter fragmentário orienta que o Direito Penal só pode
intervir quando se trate de tutelar bens fundamentais e contra ofensas
intoleráveis; já o caráter subsidiário significa que a norma penal exerce uma função
meramente suplementar da proteção jurídica em geral, só valendo a imposição de
suas sanções quando os demais ramos do Direito não mais se mostrem eficazes na
defesa dos bens jurídicos. Os referidos princípios penais ganhariam relevo se o
atuar do Direito Administrativo eliminasse a lesão ao erário, e não na situação
ora analisada, em que, por opção decorrente da confessada ineficiência da
Procuradoria da Fazenda Nacional, queda-se inerte a Administração Pública
quanto ao seu dever de cobrar judicialmente os tributos iludidos. REsp
1.393.317-PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/11/2014
(Informativo 551).
DIREITO
PENAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI MARIA DA
PENHA.
O descumprimento de medida
protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei
11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). De fato, a
jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que, para a configuração do
crime de desobediência, não basta apenas o não cumprimento de uma ordem
judicial, sendo indispensável que inexista a previsão de sanção específica em
caso de descumprimento (HC 115.504-SP, Sexta Turma, Dje 9/2/2009). Desse modo,
está evidenciada a atipicidade da conduta, porque a legislação previu alternativas
para que ocorra o efetivo cumprimento das medidas protetivas de urgência,
previstas na Lei Maria da Penha, prevendo sanções de natureza civil, processual
civil, administrativa e processual penal. Precedentes citados: REsp
1.374.653-MG, Sexta Turma, DJe 2/4/2014; e AgRg no Resp 1.445.446-MS, Quinta
Turma, DJe 6/6/2014. RHC 41.970- MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/8/2014
(Vide Informativo n. 538)
DIREITO
PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CRIME DE DESCAMINHO.
O princípio da
insignificância não é aplicável ao crime de descaminho quando o valor do
tributo iludido for superior a R$ 10 mil, ainda que a Portaria 75/2012 do
Ministério da Fazenda tenha estabelecido o valor de R$ 20 mil como parâmetro
para o não ajuizamento de execuções fiscais pela Procuradoria da Fazenda
Nacional. Por um lado, o valor de R$ 10 mil fixado pelo art. 20 da Lei
10.522/2002 não foi alterado. É que portaria emanada do Poder Executivo não tem
força normativa capaz de revogar ou modificar lei em sentido estrito, conforme
dispõe o art. 2º da Lei 4.657/1942. Por outro lado, o patamar utilizado para a
incidência do princípio da insignificância é jurisprudencial e não legal, ou
seja, não foi a Lei 10.522/2002 que definiu ser insignificante, na seara penal,
o descaminho de valores de até R$ 10 mil; foram os julgados dos Tribunais
Superiores que definiram a utilização do referido parâmetro, que, por acaso,
está expresso em lei. Não é correto, portanto, fazer uma vinculação de forma
absoluta, de modo que toda vez que for modificado o patamar para ajuizamento de
execução fiscal estaria alterado o valor considerado bagatelar. Além disso, a
Portaria 75/2012 do Ministério da Fazenda não proíbe de modo absoluto a
cobrança de créditos inferiores a R$ 20 mil, mas o permite desde que atestado o
elevado potencial de recuperabilidade do crédito ou quando se mostre –
observados os critérios de eficiência, economicidade, praticidade e as
peculiaridades regionais e/ou do débito – conveniente a cobrança. Desse modo,
ao novo valor apresentado, agregam-se outros 198 requisitos de cunho
eminentemente subjetivo. Note-se ainda que, pela forma como redigidas as
disposições da Portaria 75/2012 do Ministério da Fazenda, fica patente o
intuito de se aperfeiçoar a utilização da máquina pública, visando autorizar o
não ajuizamento de execução cujo gasto pode ser, naquele momento, maior que o
crédito a ser recuperado. Inviável, pois, falar em valor irrisório, mas sim em
estratégia de cobrança. Por fim, embora relevante a missão do princípio da
insignificância na seara penal, por se tratar de critério jurisprudencial e
doutrinário que incide de forma tão drástica sobre a própria tipicidade penal –
ou seja, sobre a lei –, deve-se ter criterioso cuidado na sua aplicação, sob
pena de se chegar ao extremo de desproteger por completo bens juridicamente
tutelados pelo direito penal. AgRg no REsp 1.406.356- PR, Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 6/2/2014 (Informativo nº 536).
DIREITO
PENAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA PREVISTA NA LEI MARIA DA
PENHA.
O descumprimento de medida
protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei
11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). De fato, o
art. 330 do CP dispõe sobre o crime de desobediência, que consiste em “desobedecer
a ordem legal de funcionário público”. Para esse crime, entende o STJ que as
determinações cujo cumprimento seja assegurado por sanções de natureza civil,
processual civil ou administrativa retiram a tipicidade do delito de
desobediência, salvo se houver ressalva expressa da lei quanto à possibilidade
de aplicação cumulativa do art. 330 do CP (HC 16.940-DF, Quinta Turma, DJ
18/11/2002). Nesse contexto, o art. 22, § 4º, da Lei 11.340/2006 diz que se
aplica às medidas protetivas, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º e
6º do art. 461 do CPC, ou seja, no caso de descumprimento de medida protetiva,
pode o juiz fixar providência com o objetivo de alcançar a tutela específica da
obrigação, afastando-se o crime de desobediência. Vale ressaltar que, a exclusão
do crime em questão ocorre tanto no caso de previsão legal de penalidade
administrativa ou civil como no caso de penalidade de cunho processual penal.
Assim, quando o descumprimento da medida protetiva der ensejo à prisão
preventiva, nos termos do art. 313, III, do CPP, também não há falar em crime
de desobediência. REsp 1.374.653-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado
em 11/3/2014 (Informativo nº 538)
DIREITO
PENAL. UTILIZAÇÃO DE TRANSPORTE PÚBLICO PARA CONDUZIR DROGA ILÍCITA.
O simples fato de o agente
utilizar-se de transporte público para conduzir a droga não atrai a incidência
da majorante prevista no art. 40, III, da Lei de Drogas (11.343/2006), que deve
ser aplicada somente quando constatada a efetiva comercialização da substância
em seu interior. Precedente citado do STJ: REsp 1.345.827-AC, Quinta Turma, DJe
27/3/2014. Precedentes citados do STF: HC 119.782-MS, Primeira Turma, DJe
3/2/2014; e HC 115.815-PR, Segunda Turma, DJe 28.8.2013. AgRg no REsp
1.295.786-MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 18/6/2014 (Vide
Informativo n. 481) (Informativo nº 543).
DIREITO
PENAL. AUTOFINANCIAMENTO PARA O TRÁFICO DE DROGAS.
Na hipótese de
autofinanciamento para o tráfico ilícito de drogas, não há concurso material
entre os crimes de tráfico (art. 33, caput, da Lei 11.343/2006) e de
financiamento ao tráfico (art. 36), devendo, nessa situação, ser o agente
condenado às penas do crime de tráfico com incidência da causa de aumento de
pena prevista no art. 40, VII. De acordo com a doutrina especialista no
assunto, denomina-se autofinanciamento a situação em que o agente atua, ao
mesmo tempo, como financiador e como traficante de drogas. Posto isso, tem-se
que o legislador, ao prever como delito autônomo a atividade de financiar ou
custear o tráfico (art. 36 da Lei 11.343/2006), objetivou – em exceção à teoria
monista – punir o agente que não tem participação direta na execução no
tráfico, limitando-se a fornecer dinheiro ou bens para subsidiar a mercancia,
sem importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,
vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo,
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas
ilicitamente. Observa-se, ademais, que, para os casos de tráfico cumulado com o
financiamento ou custeio da prática do crime, expressamente foi estabelecida a
aplicação da causa de aumento de pena do art. 40, VII, da referida lei, cabendo
ressaltar, entretanto, que a aplicação da aludida causa de aumento de pena
cumulada com a condenação pelo financiamento ou custeio do tráfico configuraria
inegável bis in idem. De outro modo, atestar a impossibilidade de aplicação
daquela causa de aumento em casos de autofinanciamento para o tráfico levaria à
conclusão de que a previsão do art. 40, VII, seria inócua quanto às penas do
art. 33, caput. REsp 1.290.296-PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura,
julgado em 17/12/2013 (Informativo nº 534).
SÚMULA
n. 513
A abolitio criminis
temporária prevista na Lei n. 10.826/2003 aplica-se ao crime de posse de arma
de fogo de uso permitido com numeração, marca ou qualquer outro sinal de
identificação raspado, suprimido ou adulterado, praticado somente até
23/10/2005
DIREITO
PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E CONCEITO TÉCNICO DE ARMA DE FOGO.
Não está caracterizado o
crime de porte ilegal de arma de fogo quando o instrumento apreendido sequer
pode ser enquadrado no conceito técnico de arma de fogo, por estar quebrado e,
de acordo com laudo pericial, totalmente inapto para realizar disparos. De
fato, tem-se como típica a conduta de portar arma de fogo sem autorização ou em
desconformidade com determinação legal ou regulamentar, por se tratar de delito
de perigo abstrato, cujo bem jurídico protegido é a incolumidade pública,
independentemente da existência de qualquer resultado naturalístico. Nesse
passo, a classificação do crime de porte ilegal de arma de fogo como de perigo
abstrato traz, em seu arcabouço teórico, a presunção, pelo próprio tipo penal,
da probabilidade de vir a ocorrer algum dano pelo mau uso da arma. Com isso,
flagrado o agente portando um objeto eleito como arma de fogo, temos um fato
provado – o porte do instrumento – e o nascimento de duas presunções, quais
sejam, de que o objeto é de fato arma de fogo, bem como tem potencial lesivo. No
entanto, verificado por perícia que o estado atual do objeto apreendido não
viabiliza sequer a sua inclusão no conceito 206 técnico de arma de fogo, pois
quebrado e, conseqüentemente, inapto para realização de disparo, não há como
caracterizar o fato como crime de porte ilegal de arma de fogo. Nesse caso,
tem-se, indubitavelmente, o rompimento da ligação lógica entre o fato provado e
as mencionadas presunções. AgRg no AREsp 397.473-DF, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 19/8/2014 (Informativo nº 544)
DIREITO
PENAL. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA NO CRIME DE TORTURA.
Não é obrigatório que o
condenado por crime de tortura inicie o cumprimento da pena no regime prisional
fechado. Dispõe o art. 1º, § 7º, da Lei 9.455/1997 – lei que define os crimes
de tortura e dá outras providências – que “O condenado por crime previsto nesta
Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime
fechado”. Entretanto, cumpre ressaltar que o Plenário do STF, ao julgar o HC
111.840- ES (DJe 17.12.2013), afastou a obrigatoriedade do regime inicial
fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados, devendo-se
observar, para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, o disposto
no art. 33 c/c o art. 59, ambos do CP. Assim, por ser equiparado a crime
hediondo, nos termos do art. 2º, caput e § 1º, da Lei 8.072/1990, é evidente
que essa interpretação também deve ser aplicada ao crime de tortura, sendo o
caso de se desconsiderar a regra disposta no art. 1º, § 7º, da Lei 9.455/1997, que
possui a mesma disposição da norma declarada inconstitucional. Cabe esclarecer
que, ao adotar essa posição, não se está a violar a Súmula Vinculante n.º 10,
do STF, que assim dispõe: "Viola a cláusula de reserva de plenário (CF,
art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare
expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público,
afasta sua incidência, no todo ou em parte". De fato, o entendimento
adotado vai ao encontro daquele proferido pelo Plenário do STF, tornando-se
desnecessário submeter tal questão ao Órgão Especial desta Corte, nos termos do
art. 481, parágrafo único, do CPC: "Os órgãos fracionários dos tribunais
não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade,
quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal
Federal sobre a questão". Portanto, seguindo a orientação adotada pela
Suprema Corte, deve-se utilizar, para a fixação do regime inicial de
cumprimento de pena, o disposto no art. 33 c/c o art. 59, ambos do CP e as
Súmulas 440 do STJ e 719 do STF. Confiram-se, a propósito, os mencionados
verbetes sumulares: "Fixada a pena base no mínimo legal, é vedado o
estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da
sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito." (Súmula
440 do STJ) e "A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a
pena aplicada permitir exige motivação idônea." (Súmula 719 do STF).
Precedente citado: REsp 1.299.787-PR, Quinta Turma, DJe 3/2/2014. HC
286.925-RR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 13/5/2014 (Informativo nº 540).
DIREITO
PENAL. PRÁTICA DE FALTA GRAVE E LIVRAMENTO CONDICIONAL. RECURSO REPETITIVO
(ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A prática de falta grave não
interrompe o prazo para a obtenção de livramento condicional. Aplica-se, nessa
situação, o entendimento consagrado na Súmula 441 do STJ. REsp 1.364.192-RS,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 12/2/2014 (Informativo nº 546).
DIREITO
PENAL. PRÁTICA DE FALTA GRAVE, COMUTAÇÃO DE PENA E INDULTO. RECURSO REPETITIVO
(ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A prática de falta grave não
interrompe automaticamente o prazo necessário para a concessão de indulto ou de
comutação de pena, devendo-se observar o cumprimento dos requisitos previstos
no decreto presidencial pelo qual foram instituídos. Precedentes citados: AgRg
no HC 275.754-RS, Quinta Turma, DJe 9/10/2013; e AgRg no AREsp 199.014-SP,
Sexta Turma, DJe 28/10/2013. REsp 1.364.192-RS, Rel. Min. Sebastião Reis
Júnior, julgado em 12/2/2014 (Informativo nº 546)
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. PROCEDIMENTO PARA A CONVERSÃO DA PENA RESTRITIVA DE
DIREITOS EM PRIVATIVA DE LIBERDADE.
É imprescindível a prévia
intimação pessoal do reeducando que descumpre pena restritiva de direitos para
que se proceda à conversão da pena alternativa em privativa de liberdade. Isso
porque se deve dar oportunidade para que o reeduncando esclareça as razões do
descumprimento, em homenagem aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Precedentes citados: HC 256.036-SP, Quinta Turma, DJe 3/9/2013; HC 221.404-RJ,
Sexta Turma, DJe 23/4/2013. HC 251.312-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em
18/2/2014 (Informativo nº 536).
DIREITO
PENAL. PRÁTICA DE CRIME DURANTE LIVRAMENTO CONDICIONAL.
O cometimento de crime
durante o período de prova do livramento condicional não implica a perda dos
dias remidos. Isso porque o livramento condicional possui regras distintas da
execução penal dentro do sistema progressivo de penas. Assim, no caso de
revogação do livramento condicional que seja motivada por infração penal
cometida na vigência do benefício, aplica-se o disposto nos arts. 142 da Lei
7.210/1984 (LEP) e 88 do CP, os quais determinam que não se computará na pena o
tempo em que esteve solto o liberado e não se concederá, em relação à mesma
pena, novo livramento. A cumulação dessas sanções com os efeitos próprios da
prática da falta grave não é possível, por inexistência de disposição legal
nesse sentido. Desse modo, consoante o disposto no art. 140, parágrafo único,
da LEP, as penalidades para o sentenciado no gozo de livramento condicional
consistem em revogação do benefício, advertência ou agravamento das condições.
Precedentes citados: REsp 1.101.461-RS, Sexta Turma, DJe 19/2/2013; e AgRg no
REsp 1.236.295-RS, Quinta Turma, DJe 2/10/2013. HC 271.907-SP, Rel. Min.
Rogerio Schietti Cruz, julgado em 27/3/2014 (Informativo nº 539).
DIREITO
PENAL. ILEGALIDADE NA MANUTENÇÃO DE INIMPUTÁVEL EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL.
É ilegal a manutenção da
prisão de acusado que vem a receber medida de segurança de internação ao final
do processo, ainda que se alegue ausência de vagas em estabelecimentos
hospitalares adequados à realização do tratamento. Com efeito, o inimputável
não pode, em nenhuma hipótese, ser responsabilizado pela falta de manutenção de
estabelecimentos adequados ao cumprimento da medida de segurança, por ser essa
responsabilidade do Estado. Precedentes citados: HC 81.959- MG, Sexta Turma, DJ
25/2/2008; RHC 13.346-SP, Quinta Turma, DJ 3/2/2003; e HC 22.916-MG, Quinta
Turma, DJ 18/11/2002. RHC 38.499-SP, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura,
julgado em 11/3/2014 (Informativo nº 537)
DIREITO
PENAL. APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA NA RELAÇÃO ENTRE MÃE E FILHA.
É possível a incidência da Lei
11.340/2006 (Lei Maria da Penha) nas relações entre mãe e filha. Isso porque,
de acordo com o art. 5º, III, da Lei 11.340/2006, configura violência doméstica
e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe
cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou
tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Da análise do
dispositivo citado, infere-se que o objeto de tutela da Lei é a mulher em
situação de vulnerabilidade, não só em relação ao cônjuge ou companheiro, mas
também qualquer outro familiar ou pessoa que conviva com a vítima,
independentemente do gênero do agressor. Nessa mesma linha, entende a jurisprudência
do STJ que o sujeito ativo do crime pode ser tanto o homem como a mulher, desde
que esteja presente o estado de vulnerabilidade caracterizado por uma relação
de poder e submissão. Precedentes citados: HC 175.816-RS, Quinta Turma, DJe
28/6/2013; e HC 250.435-RJ, Quinta Turma, DJe 27/9/2013. HC 277.561-AL, Rel.
Min. Jorge Mussi, julgado em 6/11/2014 (Informativo nº 551).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. NULIDADE DE QUEIXA-CRIME POR VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO.
É nula a queixa-crime
oferecida por advogado substabelecido com reserva de direitos por procurador
que recebera do querelante apenas os poderes da cláusula ad judicia et extra –
poderes para o foro em geral –, ainda que ao instrumento de substabelecimento
tenha sido acrescido, pelo substabelecente, poderes especiais para a
propositura de ação penal privada. De acordo com o art. 44 do CPP, a “queixa
poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do
instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo
quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente
requeridas no juízo criminal”. Posto isso, cabe esclarecer que a procuração é o
instrumento pelo qual uma pessoa nomeia outra de sua confiança como seu
representante (procurador), para 384 agir em seu nome em determinada situação.
É a procuração que define o conteúdo, os limites e a extensão do poder de
representação. O substabelecimento, por sua vez, é um ato de transferência dos
poderes outorgados na procuração inicial para que terceira pessoa possa
praticar os mesmos atos, ou seja, é o repasse de poderes. Em decorrência, ainda
que o substabelecimento esteja inserido na cláusula ad judicia, há limites
objetivos que devem ser observados quando da transferência desses poderes. Ou
seja, apenas aqueles originariamente outorgados podem ser transferidos. Conseqüentemente,
não podem ser ampliados pelo substabelecente, visto que este lida com poderes e
direitos de terceiros, e não próprios. Destarte, o mandatário só pode
substabelecer aqueles poderes que lhe foram constituídos pelo outorgante
originário, não sendo possível falar em transferência, pelo mencionado
instrumento, daquilo que não recebeu. Nessa conjuntura, se a procuração firmada
pelo querelante somente conferir os poderes da cláusula ad judicia et extra,
apenas estes podem ser objeto de transferência aos substabelecidos. Assim, deve
ser tida por inexistente a inclusão, ao substabelecer, de poderes especiais
para a propositura de ação penal privada, se eles não constavam do mandato originário.
Portanto, cabe reconhecer a nulidade da queixa-crime, por vício de
representação, tendo em vista que a procuração outorgada para a sua propositura
não atende às exigências do art. 44 do CPP. RHC 33.790-SP, Rel. originário Min.
Maria Thereza De Assis Moura, Rel. para Acórdão Min. Sebastião Reis Júnior,
julgado em 27/6/2014 (Informativo nº 544)
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPENTÊNCIA PARA JULGAR CRIME DE PERIGO DE DESASTRE
FERROVIÁRIO.
Não havendo ofensa direta a
bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou
empresas públicas (art. 109, IV, da CF), compete à Justiça Estadual – e não à
Justiça Federal – processar e julgar suposto crime de perigo de desastre
ferroviário qualificado pelo resultado lesão corporal e morte (art. 260, IV, §
2º, c/c art. 263 do CP) ocorrido por ocasião de descarrilamento de trem em
malha ferroviária da União. De fato, o bem jurídico tutelado pelo crime de
perigo de desastre ferroviário é a incolumidade pública, consubstanciada na
segurança dos meios de comunicação e transporte. Indiretamente, também se
tutelam a vida e a integridade física das pessoas vítimas do desastre. O
sujeito passivo do delito é, portanto, a coletividade em geral e, de forma
indireta, as pessoas que, eventualmente, sofram lesões corporais ou morte.
Precedente citado: CC 45.652-SP, Terceira Seção, DJe 24/11/2004. RHC 50.054-SP,
Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 4/11/2014 (Informativo nº 551)
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. DEMONSTRAÇÃO DA MATERIALIDADE DO CRIME PREVISTO NO
ART. 7º, IX, DA LEI 8.137/1990.
Para a demonstração da
materialidade do crime previsto no art. 7º, IX, da Lei 8.137/1990, é
imprescindível a realização de perícia para atestar se as mercadorias
apreendidas estavam em condições impróprias para o consumo. Precedentes citados
do STJ: AgRg no REsp 1.175.679-RS, Sexta Turma, DJe 28/3/2012; e HC 132.257-SP,
Quinta Turma, DJe 8/9/2011. Precedente citado do STF: HC 90.779-PR, Primeira
Turma, DJe 23/10/2008. AgRg no Resp 1.111.736-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 17/12/2013 (Informativo nº 533).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. INDICIAMENTO COMO ATRIBUIÇÃO EXCLUSIVA DA AUTORIDADE POLICIAL.
O magistrado não pode
requisitar o indiciamento em investigação criminal. Isso porque o indiciamento
constitui atribuição exclusiva da autoridade policial. De fato, é por meio do
indiciamento que a autoridade policial aponta determinada pessoa como a autora
do ilícito em apuração. Por se tratar de medida ínsita à fase investigatória,
por meio da qual o delegado de polícia externa o seu convencimento sobre a
autoria dos fatos apurados, não se admite que seja requerida ou determinada
pelo magistrado, já que tal procedimento obrigaria o presidente do inquérito à
conclusão de que determinado indivíduo seria o responsável pela prática
criminosa, em nítida violação ao sistema acusatório adotado pelo ordenamento
jurídico pátrio. Nesse mesmo sentido, é a inteligência do art. 2º, § 6º, da Lei
12.830/2013, o qual consigna que o indiciamento é ato inserto na esfera de
atribuições da polícia judiciária. Precedente citado do STF: HC 115.015-SP,
Segunda Turma, DJe 11/9/2013. RHC 47.984-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
4/11/2014. (Informativo nº 552)
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA INEPTA POR FALTA DE DESCRIÇÃO ADEQUADA DE CONDUTA
COMISSIVA POR OMISSÃO.
É inepta denúncia que impute
a prática de homicídio na forma omissiva imprópria quando não há descrição
clara e precisa de como a acusada – médica cirurgiã de sobreaviso – poderia ter
impedido o resultado morte, sendo insuficiente a simples menção do não
comparecimento da denunciada à unidade hospitalar, quando lhe foi solicitada a
presença para prestar imediato atendimento a paciente que foi a óbito. Com
efeito, o legislador estabeleceu alguns requisitos essenciais para a formalização
da acusação, a fim de que seja assegurado ao acusado o escorreito exercício do
contraditório e da ampla defesa, pois a higidez da denúncia é uma garantia do
denunciado. Neste contexto, quando se imputa a alguém crime comissivo por
omissão (art. 13, § 2º, b, do CP), é necessário que se demonstre o nexo
normativo entre a conduta omissiva e o resultado normativo, porque só se tem
por constituída a relação de causalidade se, baseado em elementos empíricos,
for possível concluir, com alto grau de probabilidade, que o resultado não
ocorreria se a ação devida fosse efetivamente realizada. Na hipótese em foco, a
denúncia não descreveu com a clareza necessária qual foi a conduta omitida pela
denunciada que teria impedido o resultado morte, com probabilidade próxima da
certeza. Assim, se inexistir a descrição do liame de causalidade normativa
entre a conduta comissiva por omissão e a morte da vítima, não há que se falar
em materialidade de crime de homicídio, porquanto é imprescindível que a
imputação esteja embasada em prova técnica, como laudo cadavérico, parecer
médico ou perícia médica, que permita, com dados científicos, demonstrar com a
mínima segurança que a vítima evoluiu a óbito por falta daquele atendimento
médico imediato e especializado não prestado pelo acusado. Destaque-se que a
falta de laudo de necropsia não impede o reconhecimento da materialidade
delitiva nos crimes de homicídio, podendo, muitas vezes, vir demonstrada por
outros meios de prova, como, por exemplo, depoimentos testemunhais. RHC 39.627-RJ,
Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 8/4/2014 (Informativo nº 538).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA QUE NÃO DESCREVE DE FORMA CLARA E PRECISA
A CONDUTA DO AGENTE.
É inepta denúncia que, ao
descrever a conduta do acusado como sendo dolosa, o faz de forma genérica, a
ponto de ser possível enquadrá-la tanto como culpa consciente quanto como dolo
eventual. Com efeito, o elemento psíquico que caracteriza o injusto penal, em
sua forma dolosa ou culposa, deve estar bem caracterizado, desde a denúncia,
pois é tênue a linha entre o dolo eventual e a culpa consciente. Na hipótese em
análise, há nítida violação da garantia do contraditório e da plenitude de
defesa, por não despontar da exordial acusatória, com a clareza e a precisão
exigidas, o dolo, em sua forma eventual, que teria animado o agente, sendo
impossível conhecer no caso em apreço as circunstâncias subjetivas. RHC
39.627-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 8/4/2014 (Informativo nº
538).
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. PROCEDIMENTO PARA A CONVERSÃO DA PENA RESTRITIVA DE
DIREITOS EM PRIVATIVA DE LIBERDADE.
É imprescindível a prévia
intimação pessoal do reeducando que descumpre pena restritiva de direitos para
que se proceda à conversão da pena alternativa em privativa de liberdade. Isso
porque se deve dar oportunidade para que o reeduncando esclareça as razões do
descumprimento, em homenagem aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Precedentes citados: HC 256.036-SP, Quinta Turma, DJe 3/9/2013; HC 221.404-RJ,
Sexta Turma, DJe 23/4/2013. HC 251.312-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em
18/2/2014 (Informativo nº 536).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA DO JUIZ DA PRONÚNCIA.
O juiz na pronúncia não pode
decotar a qualificadora relativa ao “meio cruel” (art. 121, § 2º, III, do CP)
quando o homicídio houver sido praticado mediante efetiva reiteração de golpes
em região vital da vítima. O STJ possui entendimento consolidado no sentido de
que o decote de qualificadoras por ocasião da decisão de pronúncia só está
autorizado quando forem manifestamente improcedentes, isto é, quando
completamente destituídas de amparo nos elementos cognitivos dos autos. Nesse
contexto, a reiteração de golpes na vítima, ao menos em princípio e para fins
de pronúncia, é circunstância indiciária do “meio cruel”, previsto no art. 121,
§ 2º, III, do CP, que consiste em meio no qual o agente, ao praticar o delito,
provoca um maior sofrimento à vítima. Não se trata, pois, a reiteração de
golpes na vítima de qualificadora manifestamente improcedente que autorize a
excepcional exclusão pelo juiz da pronúncia, sob pena de usurpação da
competência constitucionalmente atribuída ao Tribunal do Júri. Precedente
citado: HC 224.773-DF, Quinta Turma, DJe 6/6/2013. REsp 1.241.987-PR, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 6/2/2014 (Informativo nº 537).
DIREITO
PENAL E PROCESSUAL PENAL. QUESTÃO PREJUDICIAL EXTERNA E CRIME DE DESCAMINHO.
Ainda que o descaminho seja
delito de natureza formal, a existência de decisão administrativa ou judicial
favorável ao contribuinte – anulando o auto de infração, o relatório de
perdimento e o processo administrativo fiscal – caracteriza questão prejudicial
externa facultativa que autoriza a suspensão do processo penal (art. 93 do
CPP). O STF, por ocasião do julgamento do HC 99.740-RJ (DJe 1º/2/2011), firmou
compreensão no sentido de que a consumação do delito de descaminho e a abertura
de processo-crime não estão a depender da constituição administrativa do débito
fiscal porque o delito de descaminho é formal e prescinde do resultado. E,
secundando o entendimento do Pretório Excelso, este STJ, por ambas as Turmas
com competência em matéria penal, vem também decidindo que o descaminho é crime
formal, e que a persecução penal independe da constituição do crédito
tributário, como se colhe em reiterados precedentes. Do exposto, resulta que,
sendo desnecessária a constituição definitiva do crédito tributário para a
tipificação do delito, não fica a ação penal – instaurada para a apuração de
crime de descaminho – no aguardo de processo administrativo, ação judicial ou
execução fiscal acerca do crédito tributário, tendo em vista a independência
entre as esferas. Todavia, a existência de decisão administrativa ou judicial
favorável ao contribuinte provoca inegável repercussão na própria tipificação
do delito, caracterizando questão prejudicial externa facultativa que autoriza
a suspensão do processo penal (art. 93 do CPP). REsp 1.413.829-CE, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 11/11/2014. (Informativo
552).Informativos 2013
DIREITO
PENAL. COMPENSAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA
REINCIDÊNCIA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
É possível, na segunda fase
da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a
agravante da reincidência. Precedentes citados: EREsp 1.154.752-RS, Terceira
Seção, DJe 4/9/2012; HC 217.249-RS, Quinta Turma, DJe 4/3/2013; e HC
130.797-SP, Sexta Turma, DJe 1º/2/2013. REsp 1.341.370”MT, Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior, julgado em 10/4/2013 (Informativo nº 0522).
DIREITO
PENAL. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA.
O termo inicial da
prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença
condenatória para a acusação, ainda que pendente de apreciação recurso
interposto pela defesa que, em face do princípio da presunção de inocência,
impeça a execução da pena. Isso porque o art. 112, I, do CP (redação dada pela
Lei 7.209/1984) dispõe que a prescrição, após a sentença condenatória
irrecorrível, começa a correr “do dia em que transita em julgado a sentença
condenatória, para a acusação [...]”. Cabe registrar que a redação original do
dispositivo não possuía a expressão “para a acusação”, o que gerava grande
discussão doutrinária e jurisprudencial, prevalecendo o entendimento de que a
contagem do lapso para a prescrição executória deveria ser a partir do trânsito
em julgado para a acusação, tendo em vista que a pena não poderia mais ser
aumentada. Posteriormente, com a reforma do CP, por meio da Lei 7.209/1984, o
legislador, em conformidade com a orientação jurisprudencial predominante,
acrescentou a expressão "para a acusação", não havendo mais, a partir
de então, dúvida quanto ao marco inicial da contagem do prazo prescricional. É
necessário ressaltar que a interpretação do referido dispositivo em
conformidade com o art. 5º, LVII, da CF – no sentido de que deve prevalecer,
para efeito de contagem do prazo da prescrição da pretensão executória, o
trânsito em julgado para ambas as partes, ante a impossibilidade de o Estado
dar início à execução da pena antes da sentença condenatória definitiva – não
se mostra razoável, pois estaria utilizando dispositivo da CF para respaldar
“interpretação” totalmente desfavorável ao réu e contra expressa disposição
legal. Na verdade, caso prevaleça o aludido entendimento, haveria ofensa à
própria norma constitucional, máxime ao princípio da legalidade. Ademais,
exigir o trânsito em julgado para ambas as partes como termo inicial da
contagem do lapso da prescrição da pretensão executória, ao contrário do texto
expresso da lei, seria inaugurar novo marco interruptivo da prescrição não
previsto no rol taxativo do art. 117 do CP, situação que também afrontaria o
princípio da reserva legal. Assim, somente com a devida alteração legislativa é
que seria possível modificar o termo inicial da prescrição da pretensão
executória, e não por meio de "adequação hermenêutica". Vale
ressaltar que o art. 112, I, do CP é compatível com a norma constitucional, não
sendo o caso, portanto, de sua não recepção. Precedentes citados: AgRg no AREsp
214.170-DF, Sexta Turma, DJe 19/9/2012; e HC 239.554-SP, Quinta Turma, DJe
1/8/2012. HC 254.080-SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
15/10/2013 (Informativo nº 0532).
DIREITO
PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA.
A possibilidade de
ocorrência da prescrição da pretensão executória surge somente com o trânsito
em julgado da condenação para ambas as partes. Isso porque o título penal
executório surge a partir da sentença condenatória definitiva, isto é, com o
trânsito em julgado para acusação e defesa, quando também surgirá a
possibilidade de ocorrência da prescrição executória. Antes do trânsito em
julgado para ambas as partes, eventual prescrição será da pretensão punitiva.
Todavia, esse entendimento não altera o termo inicial da contagem do lapso
prescricional, o qual começa da data em que a condenação transitou em julgado
para a acusação, conforme dispõe expressamente o art. 112, I, do CP. HC
254.080-SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 15/10/2013
(Informativo nº 0532)
DIREITO
PENAL. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO ENQUANTO NÃO HOUVER TRÂNSITO EM JULGADO
PARA AMBAS AS PARTES.
Deve ser reconhecida a
extinção da punibilidade com fundamento na prescrição da pretensão punitiva, e
não com base na prescrição da pretensão executória, na hipótese em que os
prazos correspondentes a ambas as espécies de prescrição tiverem decorrido
quando ainda pendente de julgamento agravo interposto tempestivamente em face
de decisão que tenha negado, na origem, seguimento a recurso especial ou
extraordinário. De início, cumpre esclarecer que se mostra mais interessante
para o réu obter o reconhecimento da extinção da punibilidade com fundamento na
prescrição da pretensão punitiva, pois, ainda que ambas possam ter se implementado,
tem-se que os efeitos da primeira são mais abrangentes, elidindo a reincidência
e impedindo o reconhecimento de maus antecedentes. A prescrição da pretensão
executória só pode ser reconhecida após o trânsito em julgado para ambas as partes,
ainda que o seu lapso tenha início com o trânsito em julgado para a acusação, nos
termos do que dispõe o art. 112, I, do CP. Nesse contexto, havendo interposição
tempestiva de agravo contra decisão de inadmissibilidade do recurso especial ou
extraordinário (art. 544 do CPC e art. 28 da Lei 8.038/1990), não se operaria a
coisa julgada, pois a decisão do Tribunal de origem é reversível. Ademais,
mostra-se temerário considerar que o controle inicial, realizado pela instância
recorrida, prevalece para fins de trânsito em julgado sobre o exame proferido
pela própria Corte competente. Posto isso, enquanto não houver o trânsito em
julgado para ambas as partes da decisão condenatória, não há que se falar em
prescrição da pretensão executória, eis que ainda em curso o prazo da
prescrição da pretensão punitiva, de forma intercorrente. Entretanto, se o
agravo for manejado intempestivamente, sua interposição não impedirá o
implemento do trânsito em julgado, o qual pode ser de pronto identificado, haja
vista se tratar de evento objetivamente aferível, sem necessidade de adentrar o
próprio mérito do recurso. Nesse caso, ainda que submetido ao duplo juízo de
admissibilidade, inevitável o reconhecimento da intempestividade. REsp
1.255.240-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/9/2013
(Informativo nº 0532)
DIREITO
PENAL. PRAZO PARA A COMUTAÇÃO DA PENA.
O cometimento de falta grave
não interrompe o prazo estipulado como critério objetivo para concessão de
comutação da pena caso o decreto presidencial concessivo assim não preveja.
Precedentes citados: HC 138.361/RS, Quinta Turma, DJe de 19/10/2009; e HC
131.880/SP, Quinta Turma, Rel. DJe de 5/10/2009. HC 266.280-SP, Rel. Min.
Laurita Vaz, julgado em 15/8/2013 (Informativo nº 0529).
DIREITO
PENAL. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA.
O fato de a vítima não ter
contribuído para o delito é circunstância judicial neutra e não implica o
aumento da sanção. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.294.129-AL, Quinta
Turma, DJe 15/2/2013; HC 178.148-MS, Quinta Turma, DJe 24/2/2012. HC 217.819- BA,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/11/2013.
DIREITO
PENAL. REGIME PRISIONAL MAIS GRAVOSO ESTABELECIDO COM BASE EM CIRCUNSTÂNCIAS
PRÓPRIAS DO CRIME DE ROUBO.
No crime de roubo, a
circunstância de a arma de fogo ter sido apontada contra o rosto da vítima não
pode ser utilizada como fundamento para fixar regime prisional mais severo do
que aquele previsto no art. 33, § 2º, do CP. Isso porque essa circunstância
caracteriza "grave ameaça", elemento ínsito do crime de roubo. AgRg
no AREsp 349.732/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 5/11/2013
(Informativo nº 0531).
DIREITO
PENAL. COMUNICABILIDADE DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR.
Uma vez reparado o dano
integralmente por um dos autores do delito, a causa de diminuição de pena do
arrependimento posterior, prevista no art. 16 do CP, estende-se aos demais
coautores, cabendo ao julgador avaliar a fração de redução a ser aplicada,
conforme a atuação de cada agente em relação à reparação efetivada. De fato,
trata-se de circunstância comunicável, em razão de sua natureza objetiva.
Deve-se observar, portanto, o disposto no art. 30 do CP, segundo o qual
"não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal,
salvo quando elementares do crime". REsp 1.187.976-SP, Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior, julgado em 7/11/2013 (Informativo nº 0531).
DIREITO PENAL. MARCO INTERRUPTIVO DA
PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA.
Para efeito de configuração
do marco interruptivo do prazo prescricional a que se refere o art. 117, IV, do
CP, considera-se como publicado o “acórdão condenatório recorrível” na data da
sessão pública de julgamento, e não na data de sua veiculação no Diário da
Justiça ou em meio de comunicação congênere. Conforme entendimento do STJ e do
STF, a publicação do acórdão nos veículos de comunicação oficial deflagra o
prazo recursal, mas não influencia na contagem do prazo da prescrição.
Precedentes citados do STJ: EDcl no REsp 962.044-SP, Quinta Turma, DJe 7/11/2011;
e AgRg no Ag 1.325.925-SP, Sexta Turma, DJe 25/10/2010. Precedentes citados do
STF: AI-AgR 539.301-DF, Segunda Turma, DJ 3/2/2006; e HC 70.180-SP, Primeira
Turma, DJ 1º/12/2006. HC 233.594-SP, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira,
julgado em 16/4/2013 (Informativo nº 0521).
DIREITO
PENAL. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AO FURTO DE BEM CUJO
VALOR SEJA DE POUCO MAIS DE 23% DO SALÁRIO MÍNIMO DA ÉPOCA.
Sendo favoráveis as
condições pessoais do agente, é aplicável o princípio da insignificância em
relação à conduta que, subsumida formalmente ao tipo correspondente ao furto
simples (art. 155, caput, do CP), consista na subtração de bem móvel de valor
equivalente a pouco mais de 23% do salário mínimo vigente no tempo do fato.
Nessa situação, ainda que ocorra a perfeita adequação formal da conduta à lei
incriminadora e esteja comprovado o dolo do agente, inexiste a tipicidade material,
que consiste na relevância penal da conduta e do resultado produzido. Assim, em
casos como este, a aplicação da sanção penal configura indevida desproporcionalidade,
pois o resultado jurídico – a lesão produzida ao bem jurídico tutelado – há de
ser considerado como absolutamente irrelevante. AgRg no HC 254.651-PE, Rel.
Min. Jorge Mussi, julgado em 12/3/2013 (Informativo nº 0516)
DIREITO
PENAL. APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NA HIPÓTESE DE ACUSADO
REINCIDENTE OU PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES.
Ainda que se trate de
acusado reincidente ou portador de maus antecedentes, deve ser aplicado o
princípio da insignificância no caso em que a conduta apurada esteja restrita à
subtração de 11 latas de leite em pó avaliadas em R$ 76,89 pertencentes a
determinado estabelecimento comercial. Nessa situação, o fato, apesar de se
adequar formalmente ao tipo penal de furto, é atípico sob o aspecto material,
inexistindo, assim, relevância jurídica apta a justificar a intervenção do
direito penal. HC 250.122-MG, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 2/4/2013
(Informativo nº 520).
DIREITO
PENAL. ROUBO. MAJORANTE. PERÍCIA QUE CONSTATA INEFICÁCIA DA ARMA DE FOGO.
A majorante do art. 157, §
2º, I, do CP não é aplicável aos casos nos quais a arma utilizada na prática do
delito é apreendida e periciada, e sua inaptidão para a produção de disparos é
constatada. O legislador, ao prever a majorante descrita no referido dispositivo,
buscou punir com maior rigor o indivíduo que empregou artefato apto a lesar a
integridade física do ofendido, representando perigo real, o que não ocorre nas
hipóteses de instrumento notadamente sem potencialidade lesiva. Assim, a utilização
de arma de fogo que não tenha potencial lesivo afasta a mencionada majorante,
mas não a grave ameaça, que constitui elemento do tipo “roubo” na sua forma
simples. Precedentes citados: HC 190.313-SP, DJe 4/4/2011, e HC 157.889-SP, DJe
19/10/2012. HC 247.669-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/12/2012
(Informativo nº 0511).
DIREITO
PENAL. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE DANO COMETIDO CONTRA O PATRIMÔNIO DO DF.
A conduta de destruir,
inutilizar ou deteriorar o patrimônio do Distrito Federal não configura, por si
só, o crime de dano qualificado, subsumindo-se, em tese, à modalidade simples
do delito. Com efeito, é inadmissível a realização de analogia in malam partem
a fim de ampliar o rol contido no art. 163, III, do CP, cujo teor impõe punição
mais severa para o dano “cometido contra o patrimônio da União, Estados, Municípios,
empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista”.
Assim, na falta de previsão do Distrito Federal no referido preceito legal,
impõe se a desclassificação da conduta
analisada para o crime de dano simples, nada obstante a mens legis do tipo,
relativa à necessidade de proteção ao patrimônio público, e a discrepância em
considerar o prejuízo aos bens distritais menos gravoso do que o causado aos
demais entes elencados no dispositivo criminal. HC 154.051-DF, Rel.Min. Maria
Thereza de Assis Moura, julgado em 4/12/2012 (Informativo nº 0515).
DIREITO
PENAL. DOLO NO DELITO DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA.
Para a caracterização do
crime de apropriação indébita de contribuição previdenciária (art. 168-A do
CP), não há necessidade de comprovação de dolo específico. Trata-se de crime
omissivo próprio, que se perfaz com a mera omissão de recolhimento de
contribuição previdenciária no prazo e na forma legais. Desnecessária, portanto,
a demonstração do animus rem sibi habendi, bem como a comprovação do especial
fim de fraudar a Previdência Social. Precedentes citados do STJ: REsp 1.172.349-PR,
Quinta Turma, DJe 24/5/2012; e HC 116.461-PE, Sexta Turma, DJe 29/2/2012;
Precedentes citados do STF: AP 516-DF, Pleno, DJe de 6/12/2010; e HC 96.092-SP,
Primeira Turma, DJe de 1º/7/2009. EREsp 1.296.631-RN, Rel. Min. Laurita Vaz,
julgado em 11/9/2013 (Informativo nº 0528).
DIREITO
DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E PENAL. APLICABILIDADE DE ESCUSA ABSOLUTÓRIA NA
HIPÓTESE DE ATO INFRACIONAL.
Nos casos de ato infracional
equiparado a crime contra o patrimônio, é possível que o adolescente seja
beneficiado pela escusa absolutória prevista no art. 181, II, do CP. De acordo
com o referido artigo, é isento de pena, entre outras hipóteses, o descendente
que comete crime contra o patrimônio em prejuízo de ascendente, ressalvadas as
exceções delineadas no art. 183 do mesmo diploma legal, cujo teor proíbe a
aplicação da escusa: a) se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando
haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa; b) ao estranho que participa
do crime; ou c) se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior
a 60 anos. Efetivamente, por razões de política criminal, com base na existência
de laços familiares ou afetivos entre os envolvidos, o legislador optou por afastar
a punibilidade de determinadas pessoas. Nessa conjuntura, se cumpre aos ascendentes
o dever de lidar com descendentes maiores que lhes causem danos ao patrimônio,
sem que haja interesse estatal na aplicação de pena, também não se observa, com
maior razão, interesse na aplicação de medida socioeducativa ao adolescente
pela prática do mesmo fato. Com efeito, tendo em mente que, nos termos do art.
103 do ECA, ato infracional é a conduta descrita como crime ou contravenção
penal, é possível a aplicação de algumas normas penais na omissão do referido
diploma legal, sobretudo na hipótese em que se mostrarem mais benéficas ao adolescente.
Ademais, não há razoabilidade no contexto em que é prevista imunidade absoluta
ao sujeito maior de 18 anos que pratique crime em detrimento do patrimônio de
seu ascendente, mas no qual seria permitida a aplicação de medida
socioeducativa, diante da mesma situação fática, ao adolescente. De igual modo,
a despeito da função reeducativa ou pedagógica da medida socioeducativa que
eventualmente vier a ser imposta, não é razoável a ingerência do Estado nessa
relação específica entre ascendente e descendente, porque, a teor do disposto
no art. 1.634, I, do CC, compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores,
dirigir-lhes a criação e educação. Portanto, se na presença da imunidade absoluta
aqui tratada não há interesse estatal na aplicação de pena, de idêntico modo, não
deve haver interesse na aplicação de medida socioeducativa. HC 251.681-PR, Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 3/10/2013 (Informativo nº 0531).
DIREITO
PENAL. APLICAÇÃO DA REGRA DA CONTINUIDADE DELITIVA AO ESTELIONATO
PREVIDENCIÁRIO PRATICADO MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DE CARTÃO MAGNÉTICO DO
BENEFICIÁRIO FALECIDO.
A regra da continuidade
delitiva é aplicável ao estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CP)
praticado por aquele que, após a morte do beneficiário, passa a receber
mensalmente o benefício em seu lugar, mediante a utilização do cartão magnético
do falecido. Nessa situação, não se verifica a ocorrência de crime único, pois
a fraude é praticada reiteradamente, todos os meses, a cada utilização do
cartão magnético do beneficiário já falecido. Assim, configurada a reiteração
criminosa nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, tem
incidência a regra da continuidade delitiva prevista no art. 71 do CP. A
hipótese, ressalte-se, difere dos casos em que o estelionato é praticado pelo
próprio beneficiário e daqueles em que o não beneficiário insere dados falsos
no sistema do INSS visando beneficiar outrem; pois, segundo a jurisprudência do
STJ e do STF, nessas situações o crime deve ser considerado único, de modo a
impedir o reconhecimento da continuidade delitiva. REsp 180 1.282.118-RS, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 26/2/2013 (Informativo nº 0516).
DIREITO
PENAL. PENA APLICÁVEL À CONDUTA DE ADQUIRIR E OCULTAR, COM INTUITO DE LUCRO,
CDS E DVDS FALSIFICADOS.
Deve ser aplicado o preceito
secundário a que se refere o § 2º do art. 184 do CP, e não o previsto no § 1º
do art. 12 da Lei n. 9.609/1998, para a fixação das penas decorrentes da
conduta de adquirir e ocultar, com intuito de lucro, CDs e DVDs falsificados. O
preceito secundário descrito no § 1º do art. 12 da Lei n. 9.609/1998 é destinado
a estipular, em abstrato, punição para o crime de violação de direitos de autor
de programa de computador, delito cujo objeto material é distinto do tutelado
pelo tipo do § 2º do art. 184 do Código Penal. Desta feita, não havendo
adequação típica da conduta em análise ao previsto no § 1º do art. 12 da Lei n.
9.609/1998, cumpre aplicar o disposto no § 2º do art. 184 do Código Penal, uma
vez que este tipo é bem mais abrangente, sobretudo após a redação que lhe foi
dada pela Lei n. 10.695/2003. Ademais, não há desproporcionalidade da pena de
reclusão de dois a quatro anos e multa quando comparada com reprimendas
previstas para outros tipos penais, pois o próprio legislador, atento aos
reclamos da sociedade que representa, entendeu merecer tal conduta pena
considerável, especialmente pelos graves e extensos danos que acarreta, estando
geralmente relacionada a outras práticas criminosas, como a sonegação fiscal e
a formação de quadrilha. HC 191.568-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 7/2/2013
(Informativo nº 0515)
DIREITO
PENAL. EFEITOS DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO CRIME MEIO EM RELAÇÃO AO
CRIME-FIM.
No caso em que a falsidade
ideológica tenha sido praticada com o fim exclusivo de proporcionar a
realização do crime de descaminho, a extinção da punibilidade quanto a este —
diante do pagamento do tributo devido — impede que, em razão daquela primeira
conduta, considerada de forma autônoma, proceda-se à persecução penal do
agente. Isso porque, nesse contexto, exaurindo-se o crime-meio na prática do
crime-fim, cuja punibilidade não mais persista, falta justa causa para a persecução
pelo crime de falso, porquanto carente de autonomia. RHC 31.321-PR, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 16/5/2013 (Informativo nº 0523).
DIREITO
PENAL. ABSORÇÃO DA FALSIDADE IDEOLÓGICA PELO CRIME DE DESCAMINHO.
Responderá apenas pelo crime
de descaminho, e não por este em concurso com o de falsidade ideológica, o
agente que, com o fim exclusivo de iludir o pagamento de tributo devido pela
entrada de mercadoria no território nacional, alterar a 182 verdade sobre o
preço desta. Isso porque, na situação em análise, a primeira conduta realizada
pelo agente, com adequação típica no art. 299 do CP, serve apenas como meio para
alcançar o fim pretendido, qual seja, a realização do fato previsto como crime
no art. 334 do CP. Trata-se, pois, de uma das hipóteses em que se aplica o
princípio da consunção, quando um crime é meio necessário ou normal fase de
preparação ou de execução de outro crime. Nesse contexto, evidenciado o nexo
entre as condutas e inexistindo dolo diverso que enseje a punição do falso como
crime autônomo, fica este absorvido pelo descaminho. RHC 31.321-PR, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 16/5/2013 (Informativo nº 0523)
DIREITO
PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 2º, II, DA LEI N. 8.137/1990.
TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL.
O termo inicial do prazo
prescricional do crime previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 é a data
da entrega de declaração pelo próprio contribuinte, e não a inscrição do
crédito tributário em dívida ativa. Segundo a jurisprudência do tribunal (Súm.
n. 436/STJ), “a entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal
constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte
do fisco”. A simples apresentação pelo contribuinte de declaração ou documento equivalente
nos termos da lei possui o condão de constituir o crédito tributário, independentemente
de qualquer outro tipo de procedimento a ser executado pelo Fisco. Assim, em
razão de o crédito já estar constituído, é da data da entrega da declaração que
se conta o prazo prescricional do delito previsto no art. 2º, II, da Lei n.
8.137/1990. HC 236.376-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
19/11/2012 (Informativo nº 0511).
DIREITO
PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME NO TRÁFICO DE DROGAS. RECURSO REPETIVO (ART. 543-C
DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
A partir da vigência da Lei
11.464/2007, que modificou o art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/1990, exige-se o
cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5
(três quintos), se reincidente, para a progressão de regime no caso de
condenação por tráfico de drogas, ainda que aplicada a causa de diminuição
prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. O art. 2º da Lei 8.072/1990 equiparou
o delito de tráfico de entorpecentes aos crimes hediondos, dispondo, no § 2º do
mesmo artigo, que a progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos
no caput, somente poderá ocorrer após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena,
se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente. Por sua
vez, o tipo penal do tráfico de drogas está capitulado no art. 33 da Lei
11.343/2006, que, em seu § 4º, estabelece que as penas poderão ser reduzidas de
1/6 a 2/3, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se
dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
Constata-se, de plano, da leitura desses dispositivos, que o art. 2º, § 2º, da
Lei 8.072/1990 não excluiu de seu rol o tráfico de drogas quando houver a
aplicação da minorante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. Se assim o quisesse,
poderia o legislador tê-lo feito, uma vez que a redação atual do dispositivo, conferida
pela Lei 11.464/2007, é posterior à vigência da Lei 11.343/2006. Outrossim, observa-se
que a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 elenca,
como requisitos necessários para a sua aplicação, circunstâncias inerentes não
à conduta praticada pelo agente, mas à sua pessoa — primariedade, bons
antecedentes, não dedicação a atividades criminosas e não integração de
organização criminosa. Dessa forma, a aplicação da causa de diminuição de pena
prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime
de tráfico de drogas, pois a sua incidência não decorre do reconhecimento de
uma menor gravidade da conduta praticada e tampouco da existência de uma figura
privilegiada do crime. A criação da minorante tem suas raízes em questões de
política criminal, surgindo como um favor legislativo ao pequeno traficante,
ainda não envolvido em maior profundidade com o mundo criminoso, de forma a lhe
propiciar uma oportunidade mais rápida de ressocialização. Precedentes citados
do STF: AgRg no HC 114.452-RS, Primeira Turma, DJe 8/11/2012; do STJ: HC
224.038-MG, Sexta Turma, DJe 27/11/2012, e HC 254.139- MG, Quinta Turma, DJe
23/11/2012. REsp 1.329.088-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em
13/3/2013 (Informativo nº 0519).
DIREITO
PENAL. ABSORÇÃO DO CRIME DE POSSE DE MAQUINÁRIO PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.
Responderá apenas pelo crime
de tráfico de drogas – e não pelo mencionado crime em concurso com o de posse
de objetos e maquinário para a fabricação de drogas, previsto no art. 34 da Lei
11.343/2006 – o agente que, além de preparar para venda certa quantidade de
drogas ilícitas em sua residência, mantiver, no mesmo local, uma balança de
precisão e um alicate de unha utilizados na preparação das substâncias. De
fato, o tráfico de maquinário visa proteger a saúde pública, ameaçada com a
possibilidade de a droga ser produzida, ou seja, tipifica-se conduta que pode
ser considerada como mero ato preparatório. Portanto, a prática do crime
previsto no art. 33, caput, da Lei de Drogas absorve o delito capitulado no
art. 34 da mesma lei, desde que não fique caracterizada a existência de
contextos autônomos e coexistentes aptos a vulnerar o bem jurídico tutelado de
forma distinta. Na situação em análise, não há autonomia necessária a embasar a
condenação em ambos os tipos penais simultaneamente, sob pena de “bis in idem”.
Com efeito, é salutar aferir quais objetos se mostram aptos a preencher a
tipicidade penal do tipo do art. 34, o qual visa coibir a produção de drogas.
Deve ficar demonstrada a real lesividade dos objetos tidos como instrumentos
destinados à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sob
pena de a posse de uma tampa de caneta – utilizada como medidor –, atrair a incidência
do tipo penal em exame. Relevante, assim, analisar se os objetos apreendidos são
aptos a vulnerar o tipo penal em tela. Na situação em análise, além de a
conduta não se mostrar autônoma, verifica-se que a posse de uma balança de
precisão e de um alicate de unha não pode ser considerada como posse de
maquinário nos termos do que descreve o art. 34, pois os referidos instrumentos
integram a prática do delito de tráfico, não se prestando à configuração do
crime de posse de maquinário. REsp 1.196.334-PR, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 19/9/2013 (Informativo nº 0531).
DIREITO
PENAL. SUBSIDIARIEDADE DO TIPO DO ART. 37 EM RELAÇÃO AO DO ART. 35 DA LEI
11.343/2006.
Responderá apenas pelo crime
de associação do art. 35 da Lei 11.343/2006 – e não pelo mencionado crime em
concurso com o de colaboração como informante, previsto no art. 37 da mesma lei
– o agente que, já integrando associação que se destine à prática do tráfico de
drogas, passar, em determinado momento, a colaborar com esta especificamente na
condição de informante. A configuração do crime de associação para o tráfico
exige a prática, reiterada ou não, de condutas que visem facilitar a consumação
dos crimes descritos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 da Lei 11.343/2006, sendo
necessário que fique demonstrado o ânimo associativo, um ajuste prévio
referente à formação de vínculo permanente e estável. Por sua vez, o crime de colaboração
como informante constitui delito autônomo, destinado a punir específica forma
de participação na empreitada criminosa, caracterizando-se como colaborador aquele
que transmite informação relevante para o êxito das atividades do grupo, associação
ou organização criminosa destinados à prática de qualquer dos crimes previstos
nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 da Lei 11.343/2006. O tipo penal do art. 37 da
referida lei (colaboração como informante) reveste-se de verdadeiro caráter de subsidiariedade,
só ficando preenchida a tipicidade quando não se comprovar a prática de crime
mais grave. De fato, cuidando-se de agente que participe do próprio delito de tráfico
ou de associação, a conduta consistente em colaborar com informações já será inerente
aos mencionados tipos. A referida norma incriminadora tem como destinatário o
agente que colabora como informante com grupo, organização criminosa ou associação,
desde que não tenha ele qualquer envolvimento ou relação com atividades daquele
grupo, organização criminosa ou associação em relação ao qual atue como informante.
Se a prova indica que o agente mantém vínculo ou envolvimento com esses grupos,
conhecendo e participando de sua rotina, bem como cumprindo sua tarefa na empreitada
comum, a conduta não se subsume ao tipo do art. 37, podendo configurar outros
crimes, como o tráfico ou a associação, nas modalidades autoria e participação.
Com efeito, o exercício da função de informante dentro da associação é próprio
do tipo do art. 35 da Lei 11.343/2006 (associação), no qual a divisão de
tarefas é uma realidade para consecução do objetivo principal. Portanto, se a
prova dos autos não revela situação em que a conduta do paciente seja
específica e restrita a prestar informações ao grupo criminoso, sem qualquer
outro envolvimento ou relação com as atividades de associação, a conduta estará
inserida no crime de associação, o qual é mais abrangente e engloba a mencionada
atividade. Dessa forma, conclui-se que só pode ser considerado informante, para
fins de incidência do art. 37 da Lei 11.343/2006, aquele que não integre a
associação, nem seja coautor ou partícipe do delito de tráfico. Nesse contexto,
considerar que o informante possa ser punido duplamente – pela associação e
pela colaboração com a própria associação da qual faça parte –, além de
contrariar o princípio da subsidiariedade, revela indevido bis in idem,
punindo-se, de forma extremamente severa, aquele que exerce função que não pode
ser entendida como a mais relevante na divisão de tarefas do mundo do tráfico.
HC 224.849-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 11/6/2013
(Informativo nº 0527).
DIREITO
PENAL. APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º DA LEI N. 11.343/2006.
O magistrado não pode deixar
de aplicar a minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 se
utilizando exclusivamente dos elementos descritos no núcleo do referido tipo
penal para concluir que o réu se dedicava à atividade criminosa. O art. 33, §
4º, da Lei n. 11.343/2006 prevê a aplicação de causa especial de diminuição de pena
ao agente de crime de tráfico que tenha bons antecedentes, seja réu primário,
não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. Para
que se negue a aplicação da referida minorante em razão do exercício do tráfico
como atividade criminosa, deve o juiz basear-se em dados concretos que indiquem
tal situação, sob pena de toda e qualquer ação descrita no núcleo do tipo ser
considerada incompatível com a aplicação da causa especial de diminuição de
pena. Precedente citado: REsp 1.085.039-MG, DJe 28/9/2009. HC 253.732-RJ, Rel.
Min. Jorge Mussi, julgado em 6/12/2012 (Informativo nº 0514).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR AÇÃO PENAL REFERENTE AOS
CRIMES DE CALÚNIA E DIFAMAÇÃO ENVOLVENDO DIREITOS INDÍGENAS.
Compete à Justiça Federal –
e não à Justiça Estadual – processar e julgar ação penal referente aos crimes
de calúnia e difamação praticados no contexto de disputa pela posição de
cacique em comunidade indígena. O conceito de direitos indígenas, previsto no
art. 109, XI, da CF/88, para efeito de fixação da competência da Justiça
Federal, é aquele referente às matérias que envolvam a organização social dos índios,
seus costumes, línguas, crenças e tradições, bem como os direitos sobre as
terras que tradicionalmente ocupam, compreendendo, portanto, a hipótese em
análise. Precedentes citados: CC 105.045-AM, DJe 1º/7/2009; e CC 43.155-RO, DJ
30/11/2005. CC 123.016-TO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
26/6/2013 (Informativo nº 0527)
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR O CRIME DE
PECULATO-DESVIO.
Compete ao foro do local
onde efetivamente ocorrer o desvio de verba pública – e não ao do lugar para o
qual os valores foram destinados – o processamento e julgamento da ação penal
referente ao crime de peculato-desvio (art. 312, "caput", segunda
parte, do CP). Isso porque a consumação do referido delito ocorre quando o funcionário
público efetivamente desvia o dinheiro, valor ou outro bem móvel. De fato, o
resultado naturalístico é exigido para a consumação do crime, por se tratar o
peculato desvio de delito material. Ocorre que o resultado que se exige nesse
delito não é a vantagem obtida com o desvio do dinheiro, mas sim o efetivo
desvio do valor. Dessa forma, o foro do local do desvio deve ser considerado o
competente, tendo em vista que o art. 70 do CPP estabelece que a competência
será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração. CC
119.819-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/8/2013 (Informativo
nº 0526).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA PARA O JULGAMENTO DE CRIME DE ESTELIONATO.
Compete à Justiça Estadual,
e não à Justiça Federal, processar e julgar crime de estelionato cometido por
particular contra particular, ainda que a vítima resida no estrangeiro, na
hipótese em que, além de os atos de execução do suposto crime terem ocorrido no
Brasil, não exista qualquer lesão a bens, serviços ou interesses da União. O
fato de a vítima ter residência fora do Brasil não é fator de determinação da
competência jurisdicional, conforme o art. 69 do CPP. CC 125.237-SP, Rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze, julgado em 4/2/2013 (Informativo nº 0514).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA. CONTRAVENÇÃO PENAL.
É da competência da Justiça
estadual o julgamento de contravenções penais, mesmo que conexas com delitos de
competência da Justiça Federal. A Constituição Federal expressamente excluiu,
em seu art. 109, IV, a competência da Justiça Federal para o julgamento das
contravenções penais, ainda que praticadas em detrimento de bens, serviços ou
interesse da União. Tal orientação está consolidada na Súm. n.38/STJ.
Precedentes citados: CC 20.454-RO, DJ 14/2/2000, e CC 117.220-BA, DJe 7/2/2011.
CC 120.406-RJ, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora convocada
do TJ-PE), julgado em 12/12/2012 (Informativo nº 0511
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA. USO DE DOCUMENTO FALSO JUNTO À PRF.
Compete à Justiça Federal o
julgamento de crime consistente na apresentação de Certificado de Registro e
Licenciamento de Veículo (CRLV) falso à Polícia Rodoviária Federal. A
competência para processo e julgamento do delito previsto no art. 304 do CP
deve ser fixada com base na qualificação do órgão ou entidade à qual foi apresentado
o documento falsificado, que efetivamente sofre prejuízo em seus bens ou serviços,
pouco importando, em princípio, a natureza do órgão responsável pela expedição
do documento. Assim, em se tratando de apresentação de documento falso à PRF,
órgão da União, em detrimento do serviço de patrulhamento ostensivo das rodovias
federais, previsto no art. 20, II, do CTB, afigura-se inarredável a competência
da Justiça Federal para o julgamento da causa, nos termos do art. 109, IV, da
CF. Precedentes citados: CC 112.984-SE, DJe 7/12/2011, e CC 99.105-RS, DJe
27/2/2009. CC 124.498-ES, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora convocada
do TJ-PE), julgado em 12/12/2012 (Informativo nº 0511)
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. ILEGALIDADE DE PRISÃO PROVISÓRIA QUANDO REPRESENTAR MEDIDA
MAIS SEVERA DO QUE A POSSÍVEL PENA A SER APLICADA.
É ilegal a manutenção da
prisão provisória na hipótese em que seja plausível antever que o início do
cumprimento da reprimenda, em caso de eventual condenação, dar-se-á em regime
menos rigoroso que o fechado. De fato, a prisão provisória é providência
excepcional no Estado Democrático de Direito, só sendo justificável quando
atendidos os critérios de adequação, necessidade e proporcionalidade. Dessa
forma, para a imposição da medida, é necessário demonstrar concretamente a
presença dos requisitos autorizadores da preventiva (art. 312 do CPP) —
representados pelo fumus comissi delicti e pelo periculum libertatis — e, além
disso, não pode a referida medida ser mais grave que a própria sanção a ser
possivelmente aplicada na hipótese de condenação do acusado. É o que se defende
com a aplicação do princípio da homogeneidade, corolário do princípio da
proporcionalidade, não sendo razoável manter o acusado preso em regime mais
rigoroso do que aquele que eventualmente lhe será imposto quando da condenação.
Precedente citado: HC 64.379- SP, Sexta Turma, DJe 3/11/2008. HC 182.750-SP,
Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 14/5/2013 (Informativo nº 0523).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E INDIVIDUALIZADA PARA
A IMPOSIÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DO CPP.
É necessária a devida
fundamentação — concreta e individualizada — para a imposição de qualquer das
medidas alternativas à prisão previstas no art. 319 do CPP. Isso porque essas
medidas cautelares, ainda que mais benéficas, representam um constrangimento à
liberdade individual. Assim, é necessária a devida fundamentação em respeito ao
art. 93, IX, da CF e ao disposto no art. 282 do CPP, segundo o qual as referidas
medidas deverão ser aplicadas observando-se a "necessidade para aplicação
da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos
expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais", bem
como a "adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e
condições pessoais do indiciado ou acusado". HC 231.817”SP, Rel. Min.
Jorge Mussi, julgado em 23/4/2013 (Informativo nº 0521).
DIREITO
PROCESSUAL PENAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA APLICAÇÃO DE FALTA DISCIPLINAR
AO PRESO. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
Para o reconhecimento da
prática de falta disciplinar, no âmbito da execução penal, é imprescindível a
instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento
prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado
constituído ou defensor público nomeado. No âmbito da execução penal, a atribuição
de apurar a conduta faltosa do detento, assim como realizar a subsunção do fato
à norma legal, ou seja, verificar se a conduta corresponde a uma falta leve,
média ou grave, e aplicar eventual sanção disciplinar é do diretor do
estabelecimento prisional, em razão de ser o detentor do poder disciplinar
(Seção III do Capítulo IV da LEP). Não se olvida, entretanto, que, em razão do
cometimento de falta de natureza grave, determinadas conseqüências e sanções
disciplinares são de competência do juiz da execução penal, quais sejam, a
regressão de regime (art. 118, I), a revogação de saída temporária (art. 125),
a perda dos dias remidos (art. 127) e a conversão de pena restritiva de
direitos em privativa de liberdade (art. 181, § 1º, d, e § 2º). A propósito, o art.
48 estabelece que a autoridade administrativa “representará” ao juiz da
execução penal para adoção dessas sanções disciplinares de competência do juiz
da execução penal. Dessa forma, constata-se que a LEP não deixa dúvida ao
estabelecer que todo o "processo" de apuração da falta disciplinar
(investigação e subsunção), assim como a aplicação da respectiva punição, é
realizado dentro da unidade penitenciária, cuja responsabilidade é do seu
diretor. Somente se for reconhecida a prática de falta disciplinar de natureza
grave pelo diretor do estabelecimento prisional, é que será comunicado ao juiz
da execução penal para que aplique determinadas sanções, que o legislador,
excepcionando a regra, entendeu por bem conferir caráter jurisdicional. No tocante
à formalização dessa seqüência de atos concernentes à apuração da conduta faltosa
do detento e aplicação da respectiva sanção, o art. 59 da LEP é expresso ao determinar
que: “praticada a falta disciplinar, deverá ser instaurado o procedimento para a
sua apuração, conforme regulamento, assegurado o direito de defesa”. E mais,
mesmo sendo a referida lei do ano de 1984, portanto, anterior à CF de 1988,
ficou devidamente assegurado o direito de defesa do preso, que abrange não só a
autodefesa, mas também a defesa técnica, a ser realizada por profissional
devidamente inscrito nos quadros da OAB. Não por outro motivo o legislador
disciplinou expressamente nos arts. 15, 16 e 83, § 5º, da LEP, a
obrigatoriedade de instalação da Defensoria Pública nos estabelecimentos
penais, a fim de assegurar a defesa técnica daqueles que não possuírem recursos
financeiros para constituir advogado. Ademais, vale ressaltar que o direito de
defesa garantido ao sentenciado tem assento constitucional, mormente porque o
reconhecimento da prática de falta disciplinar de natureza grave acarreta conseqüências
danosas que repercutem, em última análise, em sua liberdade. Com efeito, os
incisos LIV e LV do art. 5º da CF respaldam a obrigatoriedade da presença de defensor
regularmente constituído na OAB, em procedimento administrativo disciplinar, no
âmbito da execução da pena. No particular, registre-se que a Súmula Vinculante
5, a qual dispõe que “a falta de defesa técnica por advogado no processo
administrativo disciplinar não ofende a Constituição”, não se aplica à execução
penal. Primeiro, porque todos os precedentes utilizados para elaboração do
aludido verbete sumular são originários de questões não penais, onde estavam em
discussão procedimentos administrativos de natureza previdenciária (RE
434.059); fiscal (AI 207.197); disciplinar-estatutário militar (RE 244.027); e
tomada de contas especial (MS 24.961). Segundo, porque, conforme mencionado, na
execução da pena está em jogo a liberdade 346 do sentenciado, o qual se
encontra em situação de extrema vulnerabilidade, revelando se incompreensível
que ele possa exercer uma ampla defesa sem o conhecimento técnico do
ordenamento jurídico, não se podendo, portanto, equipará-lo ao indivíduo que
responde a processo disciplinar na esfera cível-administrativa. Ademais,
observa-se que o Regulamento Penitenciário Federal, aprovado pelo Dec.
6.049/2007 – que disciplina as regras da execução da pena em estabelecimento
prisional federal, seguindo a diretriz traçada pela Lei 7.210/1984 (LEP) –,
determina expressamente a obrigatoriedade de instauração de procedimento
administrativo para apuração de falta disciplinar, bem como a
imprescindibilidade da presença de advogado. Seria, portanto, um verdadeiro
contrassenso admitir que o preso que cumpre pena em estabelecimento penal
federal, regido pelo aludido Decreto, possua mais direitos e garantias em
relação àquele que esteja cumprindo pena em presídio estadual. Ademais, quanto
ao disposto no art. 118, I e § 2º, da LEP – que determina que o apenado deva
ser ouvido previamente antes de ser regredido definitivamente de regime –, mesmo
que se entenda que somente o juiz possa ouvi-lo, não se pode perder de vista
que antes de ser aplicada qualquer sanção disciplinar pela prática de falta
grave deve ser instaurado o devido procedimento administrativo pelo diretor do
presídio. Somente após todo esse procedimento é que o diretor do
estabelecimento prisional representará ao juiz da execução para que aplique as
sanções disciplinares de sua competência, dentre elas, quando for o caso, a
regressão de regime, ocasião em que o apenado deverá ser previamente ouvido,
por meio de sua defesa técnica. Dessarte, verifica-se que a defesa do
sentenciado no procedimento administrativo disciplinar revela-se muito mais
abrangente em relação à sua oitiva prevista no art. 118, § 2º, da LEP, tendo em
vista que esta tem por finalidade tão somente a questão acerca da regressão de
regime, a ser determinada ou não pelo juiz da execução. Nota-se que os
procedimentos não se confundem. Ora, se de um lado, o PAD visa apurar a
ocorrência da própria falta grave, com observância do contraditório e da ampla
defesa, bem como a aplicação de diversas sanções disciplinares pela autoridade administrativa;
de outro, a oitiva do apenado tem como único objetivo a aplicação da sanção
concernente à regressão de regime, exigindo-se, por óbvio, que já tenha sido reconhecida
a falta grave pelo diretor do presídio. Conquanto a execução penal seja uma atividade
complexa, pois desenvolve-se nos planos jurisdicional e administrativo, da leitura
dos dispositivos da LEP, notadamente do seu art. 66, que dispõe sobre a competência
do juiz da execução, conclui-se que não há nenhum dispositivo autorizando o
magistrado instaurar diretamente procedimento judicial para apuração de falta
grave. Assim, embora o juiz da Vara de Execuções Penais possa exercer, quando provocado,
o controle de legalidade dos atos administrativos realizados pelo diretor do estabelecimento
prisional, bem como possua competência para determinadas questões no âmbito da
execução penal, não lhe é permitido adentrar em matéria de atribuição exclusiva
da autoridade administrativa, no que concerne à instauração do procedimento para
fins de apuração do cometimento de falta disciplinar pelo preso, sob pena de afronta
ao princípio da legalidade. REsp 1.378.557-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 23/10/2013 (Informativo nº 0532).
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